O jornal Labour Monthly (Trabalhismo Mensal) publicou, no ano de 1930, uma análise da recém-criada sociedade palestina após 10 anos de domínio britânico. O texto, intitulado O caráter de classe do levante palestino, descreve muito bem o processo de dominação do imperialismo sobre a sociedade. Até 1917, a Palestina era uma província do império Otomano, uma entidade quase medieval. Depois, se tornou uma das mais importantes colônias do mais poderoso império do mundo. Isso alterou radicalmente e rapidamente a sociedade.
O artigo descreve: “a guerra mundial e a subsequente ocupação imperialista da Palestina, bem como a implementação da política sionista pelo governo britânico, deram origem a uma transformação fundamental na estrutura social da população nativa. Tanto a política britânica quanto a sionista visavam permitir que as divisões sociais da população árabe permanecessem intocadas, na verdade, visavam fortalecer ainda mais a posição das classes dominantes em relação às massas escravizadas do que nos tempos turcos”. Aqui, os britânicos utilizaram sua política tradicional, tornar as classes dominantes locais os seus lacaios para ajudar na dominação de toda a população.
Ele continua: “essa orientação é compreensível tanto do ponto de vista dos interesses do imperialismo britânico quanto do sionismo, que está ligado a ele, sendo o sionismo, acima de tudo, interessado na expropriação dos pequenos camponeses árabes e beduínos e na transferência de suas propriedades para os colonos sionistas. A expropriação dos pequenos camponeses, no entanto, só pode ser realizada com a ajuda dos grandes latifundiários feudais árabes; a venda de terras por pequenos camponeses individuais é muito difícil; além do fato de que os pequenos camponeses, por mais sobrecarregados que estejam pela carga tributária e pela miséria econômica, só venderão suas terras a imigrantes estrangeiros em casos excepcionais”.
Os sionistas começaram a imigrar em massa para a Palestina nesse momento. Os ingleses tinham o controle de todo o processo. Queriam transferir as terras dos latifundiários árabes para os sionistas e, assim, criar uma nova classe dominante árabe enquanto se estabeleciam as colônias de europeus que seriam cruciais para o plano futuro da criação de um Estado sionista.
O texto destaca: “o governo britânico foi responsável pelo crescimento do poder político da classe feudal e da burguesia comercial. Isso soa paradoxal, uma vez que o imperialismo britânico certamente não criou instituições políticas nas quais as classes dominantes árabes pudessem participar como legisladores ou administradores, mas colocou o poder legislativo e executivo nas mãos de funcionários britânicos (um tipo de administração de colônia da Coroa Britânica). No entanto, é verdade que o imperialismo britânico aumentou o poder político da aristocracia árabe, apenas o fez de formas peculiares.
Ele colocou a aristocracia árabe em posse de dois instrumentos que bastavam para a dominação política sobre as massas atrasadas, analfabetas e terrivelmente oprimidas. Em primeiro lugar, fortaleceu o domínio da aristocracia na aldeia, aumentando o poder do aparato feudal-clerical do ‘Supremo Conselho Muçulmano’. Este Conselho, que tinha a responsabilidade exclusiva da administração das extensas propriedades do ‘Uakf’, as terras pertencentes à Igreja Muçulmana, tornou-se, por assim dizer, parte do aparato governamental, pois o governo assumiu as taxas pagas ao Conselho e ele próprio pagava os funcionários do Conselho com o tesouro governamental. A direção deste aparato feudal-clerical estava nas mãos da nobre família Hussein”.
Portanto, antes do sionismo ganhar força, os britânicos criaram uma colônia ao estilo do que haviam feito no Iraque e na Jordânia. Não havia um reino, mas o domínio britânico se baseava nas famílias nobres, principalmente na citada família de Hussein. O interessante é que o sionismo, na década de 1930, já entraria em choque até com um setor da classe dominante árabe. O sionismo foi responsável pela revolução prematura na Palestina. Em 1936, já havia um movimento revolucionário no território, o nacionalismo árabe só se transformaria em um fenômeno generalizado na década de 1950.
Mas ainda sobre a década de 1920, o texto diz: “o outro instrumento consistia em assegurar o domínio dos proprietários de imóveis e ricos comerciantes nas cidades. Para esse fim, em 1927, eleições para concelhos municipais foram introduzidas em toda a Palestina, mas 95% da população foi excluída do sufrágio. Apenas proprietários de imóveis e contribuintes com uma base mínima alta podiam ser eleitores e, com a ajuda dos sionistas, os representantes mais importantes da aristocracia urbana e da burguesia comercial foram levados aos concelhos municipais que trabalhavam sob o controle imediato do governo. Nenhum dos privilégios feudais-aristocráticos das classes ricas foi tocado; o governo britânico sempre prestou a maior atenção em salvaguardar as antigas formas feudais-clericais”.
Novamente se repete o padrão. As estruturas de poder, controladas pelo imperialismo, tinham a participação das classes dominantes palestinas como sócios minoritários. Os sionistas também participariam dessas estruturas.
Logo depois ele começa a abordar como a colonização britânica afetou as classes oprimidas da Palestina. Como a industrialização afetou a população nômade de beduínos, como a maioria de camponeses foi afetada pelas mudanças nas propriedades de terra. Isso rapidamente levou a revoltas. Esse será o tópico da parte 2 deste artigo.