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Redes sociais

A arte de censurar eleições

Ex-esquerdista utiliza a vitória de Trump sobre Kamala Harris para defender a censura na internet, enquanto engrandece a imprensa que se cala diante do genocídio na Palestina

O ex-esquerdista e amante da política do Partido Democrata dos EUA, Fernando Gabeira, publicou em seu sítio no dia 18 de novembro uma matéria intitulada “A arte de perder eleições”, na qual comenta a derrota de Kamala Harris nas eleições dos Estados Unidos para o republicano Donald Trump, no dia 5 de novembro deste ano. O mesmo artigo foi publicada em sua coluna no jornal O Globo, sob o título Saber perder eleições é uma arte.

Inicialmente, o artigo é uma espécie de ode a Kamala Harris e ao Partido Democrata, ao mesmo tempo em que lamenta profundamente a vitória de Trump. Entre um tema e outro, destacam-se as lamentações pela suposta deportação em massa que seria promovida por Trump, esquecendo completamente que as deportações no governo Biden foram maiores do que as que ocorreram durante o último governo trumpista; a fome, a guerra, os desastres naturais e a famigerada mudança climática, que Gabeira alega ser culpa da industrialização, além de ataques gratuitos à política chinesa, chamada de “autoritária”.

No entanto, longe de um texto apenas choroso pela derrota da ala mais importante do imperialismo mundial, Gabeira entrega a verdadeira chave para a leitura de sua matéria no seguinte parágrafo:

Tudo isso ainda são impressões iniciais. Teremos ainda um longo caminho, e a imprensa americana será uma espécie de termômetro para medir a experiência renovada de Trump. É uma imprensa que, de modo geral, também apostou em Kamala Harris e vive sob grande pressão da direita. Ela pode ter cometido erros, subestimado a frustração popular, mas ainda é uma indústria que gasta parte do dinheiro apurando e confirmando a veracidade das informações. Por mais que seja atacada, a verdade é que é explorada pelas plataformas eletrônicas, que reproduzem seu trabalho sem remunerá-lo.

O leitor desatento pode deixar passar batido, mas Gabeira declara não só que a imprensa imperialista tomou partido de Harris contra Trump como também elogia seu posicionamento. No trecho seguinte, a ideia se complementa:

As suposições de que é possível informar sem apurar e confirmar, de que há uma liberdade ilimitada e de que realidades paralelas têm o mesmo valor dos fatos verificáveis servem apenas para aumentar a confusão e turvar o debate político.”.

Segundo Gabeira, portanto, a imprensa da burguesia imperialista é praticamente a verdade em si. Segundo seu texto, essa imprensa apura e confirma os fatos, ao contrário de outra imprensa não citada, que não apuraria e confirmaria os fatos com rigor. Isso, enquanto a imprensa burguesa em todo o mundo esconde um genocídio que salta aos olhos de todos, por meio de publicações nas redes sociais.

Essa ideia de que as notícias nas redes sociais não são verificadas e apuradas de verdade é um argumento antigo da direita contra a organização de meios de comunicação que escapem do controle da burguesia, já tendo, inclusive, atingido o rádio e a televisão em décadas passadas e, agora, é utilizado contra as redes sociais, no momento em que o imperialismo perde o controle das informações.

Ao dizer que não há uma “liberdade ilimitada”, Gabeira também faz jus ao que disse em 2010, quando se retratou por ter participado da luta contra a ditadura, dizendo que naquela época ele acreditava que lutava pela democracia, mas que, na realidade, lutava apenas pela “ditadura do proletariado”, o que, a seu ver, seria praticamente um crime.

Sua ideia central sobre a propaganda imperialista encerra-se no parágrafo seguinte:

Assim como na pandemia, abre-se um período em que o papel da imprensa americana será essencial ao lado da ciência, que se defrontará com uma grande onda de negacionismo, das mudanças climáticas à importância das vacinas.”

Seu texto se trata, portanto, de uma defesa da censura de órgãos menores e da supremacia da imprensa imperialista, que, a seu modo de ver, seria a única a defender a “ciência”, a luta contra o “negacionismo”, e a favor de se combater as “mudanças climáticas”.

A ideia de Gabeira é a de que as redes sociais, local em que Trump teve amplo apoio nos EUA, devem ser controladas para evitar novas eleições desagradáveis aos olhos do imperialismo.

O engraçado é notar como em 2016, anos depois de sua debandada para a direita, Gabeira atacava a Venezuela por uma suposta perseguição à imprensa independente. Isso em um texto em que atacava toda a esquerda e, em especial, Dilma, três dias após seu afastamento no Senado, que culminaria em seu impeachment no golpe de 31 de agosto:

O modelo teve êxito na Venezuela, se podemos chamar de êxito um regime que empobreceu o país e cria enormes filas até para comprar papel higiênico. Lá foi possível dominar o Congresso, ganhar as principais disputas na Justiça e ter comandantes militares partidários do governo. A imprensa independente foi mantida sob intenso ataque.

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