Neste dia 12 de julho completam-se 18 anos do início da Guerra do Líbano de 2006, conflito militar ocorrido no sul libanês entre a resistência armada do Hesbolá, partido político islâmico xiita, e as forças armadas do Estado de “Israel”. Tendo sido parte do conflito mais amplo entre a população dos países árabes contra a presença sionista no Oriente Médio, a guerra de 2006 foi um marco da consolidação do Hesbolá enquanto força política dominante no sul do Líbano, bem como da sua inserção no conjunto maior do chamado Eixo da Resistência.
As disputas políticas e territoriais entre Líbano e “Israel” remetem ao próprio início da ocupação sionista da Palestina no início do século XX, na medida em que muitos dos palestinos expulsos de seu território se dirigiram para a fronteira com o sul do Líbano em busca de refúgio. Estima-se que apenas após a Nakba, processo de limpeza étnica promovido pelo imperialismo em 1948, mais de 100 mil palestinos se refugiaram no Líbano. Após a Guerra dos Seis Dias, em 1967, um número ainda maior de palestinos se viu forçado a emigrar em direção ao Líbano, criando uma população de refugiados no sul do país de aproximadamente 300 mil pessoas.
Assim, formou-se no sul do Líbano um verdadeiro pólo descentralizado de resistência palestina contra a colonização sionista, no que é considerada por muitos a formação de um estado autônomo dentro do próprio estado libanês, cujo governo em grande medida servia como instrumento da dominação imperialista na região. A resistência libanesa ganhou ainda mais força em 1982, quando uma operação de invasão levada adiante por “Israel” no sul do Líbano levou grupos muçulmanos xiitas, inspirados pela Revolução Iraniana de 1979, a se organizarem em um partido político de luta armada para resistir à invasão, dando assim origem ao Hesbolá.
Dessa forma, o Hesbolá passou a travar uma luta para expulsar as tropas israelenses do sul do Líbano, que objetivavam sufocar o polo de resistência que havia se instaurado ali. Embora lutando com bravura, foi somente na virada para o século XXI que os combatentes conseguiram ser vitoriosos, forçando um recuo das forças de ocupação israelenses e fortalecendo o combate contra milícias pró-“Israel” dentro do Líbano, cujo surgimento fora fomentado pelos sionistas. Não obstante a vitória do Hesbolá, as tropas israelenses seguiram exercendo uma forte patrulha nas regiões fronteiriças para garantir o seu controle territorial, levando à continuação de conflitos menores ao longo das regiões de fronteira, como as Colinas de Golã.
Foi então que o Hesbolá passou a se engajar em estratégias de enfrentamento militar que consistiam em realizar ataques tendo como alvo instalações militares israelenses, para assim capturar soldados e utilizá-los como moeda de troca pelos prisioneiros libaneses que “Israel” havia tomado como cativos ao longo de todos os anos de conflito. Então, no dia 12 de julho de 2006, foi lançada uma operação batizada de “Promessa Leal”, quando o braço armado do Hesbolá realizou uma incursão militar sobre a fronteira com Israel. Inicialmente, eles procederam lançando foguetes na direção de territórios do norte israelense para desviar a atenção das tropas. Logo após, militantes cruzaram a fronteira e realizaram ataques com mísseis contra tanques de guerra, matando 3 soldados e capturando outros 2.
A operação, considerada um sucesso, foi utilizada pelo Hesbolá como ferramenta de barganha para realizar uma troca de prisioneiros e também para que fosse feita uma retirada completa das tropas israelenses de dentro do território libanês, já que, como parte do seu modus operandi, os sionistas nunca respeitaram os acordos de extensão territorial firmados. O governo de “Israel” se mostrou inflexível, mantendo-se determinado a não ceder em seus propósitos de dominação, e logo após procedeu rapidamente a uma invasão militar, por terra e ar, dos territórios do sul do Líbano, realizando ataques contra alvos militares do Hesbolá e, sobretudo, bombardeios criminosos contra instalações civis e contra a infraestrutura libanesa, como o Aeroporto Internacional de Beirute, Rafic Hariri. Além disso, foi imposto um bloqueio da região por água e ar, impedindo a entra e saída de alimentos, suprimentos e armas, bem como impedindo a comunicação e o transporte de pessoas.
O conflito militar se estendeu por mais de 1 mês, com as tropas israelenses assassinando aproximadamente 1.500 pessoas, em sua maioria civis libaneses, além de danificar grande parte da infraestrutura industrial do sul do Líbano e também de outras regiões, incluindo a capital Beirute. O bloqueio militar foi mantido até o dia 8 de setembro de 2006 e as tropas israelenses mantiveram sua presença no Líbano até o início de outubro. Não sendo capazes de derrotar os militantes do Hesbolá, as tropas israelenses se viram enfim forçadas a retroceder.
A data de rememoração da Guerra do Líbano de 2006 permite identificar algumas similaridades com o conflito em andamento atualmente na Palestina. Os próprios fatos que desencadearam os conflitos, incursões militares realizadas pelos grupos de resistência, foram ambos utilizados pelo governo de Israel como pretexto para proceder ao ataque genocida contra os territórios do Líbano e da Palestina, assassinando milhares de pessoas. O que as alegações sionistas escondem, na verdade, é o histórico de longa duração do conflito, que teve nas duas operações, “Promessa Leal” em 2006, e “Dilúvio de al-Aqsa” em 2023, respostas das organizações populares da região como resistência contra a dominação sionista e imperialista do Oriente Médio, que já data de mais de um século.
Já em 2006, diversas investigações constataram que a Segunda Guerra do Líbano já vinha sendo arquitetada premeditadamente por “Israel”, tendo a operação de 12 de julho apenas precipitado o conflito. Em um artigo de agosto de 2006 para o jornal The New Yorker, o jornalista investigativo norte-americano Seymour Hersh afirmou que, 2 meses antes da operação de captura dos soldados israelenses, já haviam sido realizadas conversas entre os governos de “Israel” e dos EUA, em que este deu sinal verde para a operação israelense no sul do Líbano com o objetivo de desmantelar a forte presença política do Hesbolá na região. Mesmo o jornal imperialista The Guardian noticiou que, de acordo com alegações do também jornalista Conal Urquhart, o primeiro-ministro israelense à época, Ehud Olmert, já vinha preparando uma operação de guerra por pelo menos 4 meses antes do início do conflito.
O próprio Hesbolá, através do seu secretário-geral Hassan Nasseralá, declarou em 27 de agosto de 2006 que a captura dos 2 soldados não foi a causa da guerra, e sim apenas antecipou um conflito que já vinha sendo incitado pelo governo israelense há muito tempo: “Se existisse até mesmo 1% só de chance de que a operação de 12 de julho levasse a uma guerra como a que aconteceu, eu teria feito? Eu diria que não, com certeza, por razões humanitárias, morais, sociais, militares e políticas. […] O que aconteceu não se trata de uma reação a uma operação de captura… o que aconteceu já havia sido planejado. O fato de que foi em julho evitou uma situação que teria sido muito pior, caso a guerra tivesse sido lançada com maior planejamento, digamos em outubro“.
No momento atual, em que as lutas de resistência popular contra o imperialismo se intensificam por todo o mundo, a recordação dos acontecimentos históricos nos deixam lições importantes. Uma delas é verificar que a resposta imperialista contra a resistência é invariavelmente a guerra e o genocídio indiscriminado, como aconteceu com os libaneses em 2006 e acontece agora com os palestinos. A outra é compreender que a dominação imperialista do Oriente Médio, levada adiante sob o disfarce do sionismo, embora deixe por onde passa um enorme rastro de morte e destruição, cria também a ocasião para o surgimento de movimentos populares de libertação e resistência, como a revolução no Irã em 1979, e a formação de grupos combatentes como o Hesbolá e o Hamas, que juntos compõem o Eixo da Resistência. E é exatamente esta organização, que vem sendo a catalisadora da luta contra a opressão em escala global, que constituirá um grande movimento capaz de, em breve, levar ao colapso e à destruição de “Israel” e também da dominação imperialista responsável por toda a destruição.