Após postar no Instagram uma enquete na qual perguntava: “Você daria um tiro em Lula”, o jogador de vôlei Wallace de Souza, campeão olímpico em 2016, foi afastado do seu clube, o Sada Cruzeiro, foi suspenso pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) ― o que significa que não poderá participar de nenhuma atividade esportiva do sistema COB ― e, diante da pressão pública, viu-se forçado a se retratar publicamente.
Mas perder o emprego, ficar afastado da sua atividade esportiva e perder patrocinadores não bastam. A direita “civilizada” e a maior parte da esquerda quer mais punição. Na internet, exigem uma punição mais severa. A tag #Wallacenacadeia foi dos assuntos mais comentados nos últimos dias.
O que nos interessa discutir aqui é a atitude da esquerda. Para a direita, pedir cadeia para alguém que falou isto ou aquilo, por mais idiota ou desagrádavel que seja, é algo normal e já faz parte da tradição dessa corrente política. Mas, para a esquerda, isso é algo novo e recente.
A maioria das organizações de esquerda atualmente aposta na Justiça Penal para vencer as batalhas da luta política. Wallace é um simpatizante do bolsonarismo, e, em nome da luta contra a extrema direita bolsonarista, a esquerda joga todas as suas fichas na punição criminal, na polícia, no sistema carcerário, no Poder Judiciário. Trocando em miúdos: essa esquerda aposta no aparato repressivo do Estado burguês.
O mais incrível disso tudo é que é justamente o aparato repressivo do Estado o espaço no qual o bolsonarismo fincou mais raízes no último período. Não é segredo para ninguém que o aparato policial e repressivo está dominado pelo bolsonarismo. E para a esquerda repressiva, é justamente esse setor do Estado quem deveria combater o bolsonarismo, ou seja, a burocracia dominada pelo bolsonarismo é quem deveria combater o bolsonarismo. Isso faz sentido?
Essas organizações de esquerda abandonaram completamente a defesa dos direitos democráticos e colocaram no fundo da gaveta os métodos tradicionais da mobilização de massas. Agora, a única nota que ressoa da flauta dessas direções políticas é a nota policial e repressiva. O diagnóstico é claro: tais organizações políticas de esquerda já estão em processo avançado de falência e putrefação.
Em que consiste essa falência, uma vez que esse tipo de esquerda é a força majoritária dentro desse campo político? Consiste no fato de que colherá um resultado diametralmente oposto ao pretendido: ao invés de combater e enfraquecer o bolsonarismo, a única coisa que conseguirá é fortalecê-lo. Uma ferramenta que não cumpre as funções para as quais está destinada é uma ferramenta quebrada, inútil. Um partido político que se propõe a enfrentar e vencer o bolsonarismo, mas que, na luta real, só consegue fortalecê-lo, é um partido político falido. Mais cedo ou mais tarde, com maior ou menor velocidade, será varrido do mapa, vítima da sua incompreensão e incapacidade para acompanhar as tendências e desafios colocados pela luta de classes.
A esquerda “chave de cadeia” já está com o seu destino traçado. Mas é preciso superá-la o quanto antes. Sob a sua direção, o bolsonarismo só tende a ganhar. Para vencer o bolsonarismo, é preciso vencer o maior inimigo do povo brasileiro e das massas mundiais, o imperialismo. E a força social capaz de liderar essa luta é a classe operária. Com uma tradição política de mais de um século, a classe operária sabe mais do que ninguém que não pode apostar em nada além de suas próprias forças, em sua mobilização. A sua libertação será obra de suas próprias forças, de sua própria organização, de seus próprios métodos, não das forças, da organização e dos métodos dos inimigos.