“É um menino tão sabido, doutor, ele quer modificar o mundo
Esse tal de Roque Enrow, Roque Enrow”
Morreu nessa terça-feira, dia 9/5, a cantora e compositora, Rita Lee, aos 75 anos, em decorrência de uma luta de dois anos contra um câncer de pulmão. Considerada uma das precursoras do rock brasileiro, Rita Lee foi vocalista de uma das bandas brasileiras mais influentes, não apenas no Brasil, mas no mundo, Os Mutantes.
Foi com eles que Rita Lee teve papel central na fundação da Tropicália, um movimento que procurava mesclar a influência da música norte-americana e inglesa, em particular o rock, com as manifestações da música popular brasileira. Não nos cabe entrar numa análise detalhada sobre a Tropicália, com ideias muito contraditórias e controversas e acusada por alguns de um movimento despolitizado e pró-imperialista e apontada por outros como grande inovação no campo da música popular internacional.
Fato é que, com Os Mutantes, o rock brasileiro ganhou uma cara mais séria, uma evolução em relação ao rock feito pela geração anterior, da Jovem Guarda, cuja musicalidade era essencialmente uma transposição para o português do que era feito principalmente nos Estados Unidos e na Inglaterra.
Dizer que Os Mutantes eram “sérios” soa estranho para quem está acostumado com as extravagâncias e exageros estéticos dos tropicalistas e com o bom humor que Rita Lee levou até o final de sua carreira. Mas do ponto de vista da musicalidade, da preocupação em desenvolver uma nova forma de manifestação musical, das experimentações, em suma, da busca por uma arte musical inovadora, Os Mutantes estavam mais próximos da seriedade do rock britânico da época do que da sensitividade do rock americano.
Foi isso o que transformou a banda brasileira numa espécie de marco para os que fizeram rock depois deles no Brasil e uma banda cultuada por figurões da música internacional.
A capacidade vocal de Rita Lee, muito subestimada para quem ouve apenas as músicas mais conhecidas de sua carreira solo, atinge toda a plenitude com Os Mutantes. Na forma de cantar, Rita Lee, se não foi a primeira, com certeza foi a responsável por introduzir na música brasileiro o estilo vocal do rock sessentista e setentista, da qual Janis Joplin foi talvez uma das mais importantes representantes. Para quem não conhece, indico a interpretação de Rita na música “Meu refrigerador não funciona” no disco A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado, de 1970.
Além de cantora, Rita Lee era compositora, em parceria com seus parceiros de banda, os irmãos Sergio Dias Baptista e Arnaldo Dias Baptista, compôs as principais canções do grupo. Também nesse aspecto, Rita foi uma inovadora, já que a maior parte das mulheres na Música Popular não eram compositoras de suas obras. Rita Lee continuou compondo durante toda a sua carreira, com várias parcerias, incluindo, durante a última fase, com seu marido Roberto de Carvalho, com o qual gravou grandes sucessos.
Após Os Mutantes, Rita Lee integrou o grupo Tutti Frutti, lançando cinco álbuns, e depois seguiu carreira solo, com músicas com um estilo mais pop, mas sem abandonar o rock, que fizeram muito sucesso principalmente nos anos 70 e 80 e se estenderam pelos anos 90 até hoje.
Personalidade de esquerda, Rita Lee era apoiadora do PT e sempre fazia questão de declarar voto abertamente na esquerda nas eleições. Em seu show de despedida, em Aracaju, em 2012, a cantora foi detida após denunciar a repressão policial que acontecia contra o público do festival. Ela foi levada à delegacia, acusada de desacato à autoridade. Esse episódio mostrou que a roqueira nunca deixou aquilo que se costumou chamar de espírito rebelde do rock, desse tal de rock’n’roll.
Deixamos aqui nossa homenagem à Rita Lee!