Nessa sexta-feira (31), o programa Marxismo foi ao ar no canal oficial do PCO. Apresentado pelos companheiros Rui Costa Pimenta, Henrique Áreas e João Jorge, discutiu-se a questão da “Revolução Cultural” – que é a tese de que a revolução social não bastaria para libertar os oprimidos, mas que seria necessária uma nova revolução, de tipo cultural, para cumprir tal tarefa.
Sobre a Revolução Cultural, que foi o principal tema do programa, é preciso ter claro o que é esse conceito, visto que ele é um tanto difuso. É diferente da revolução social burguesa, por exemplo, em que a burguesia toma o poder, expropria a classe feudal e estabelece o Estado democrático e cria as condições para o desenvolvimento do capitalismo; já a revolução socialista também é bastante definida, como a tomada do poder do proletariado para o desenvolvimento das forças produtivas no sentido social. Mas esse conceito de revolução cultural não traz, consigo, nenhuma definição concreta.
O companheiro Rui, analisando a questão, fez a ponderação de que é normal uma confusão com a chamada “Revolução Cultural” chinesa. No entanto, apesar do nome, ela não teve nada de cultural – como explicou o companheiro, ela foi uma revolta da juventude, principalmente universitária, contra o aparato burocrático dirigente; ou seja, foi uma revolução política.
O conceito poderia significar uma espécie de revolução educativa. No entanto, no sentido normal da palavra, todas as revoluções cumpririam esse papel, pois tem de se tornar consciente para as massas os seus objetivos e ações. Apesar disso, isso seria banal, pois traria a definição dentro de um outro conceito. O que se quer dizer, na realidade, é que a revolução social por si só não acabaria com o racismo ou com o machismo; e que seria necessário um processo artificial para mudar a consciência das pessoas, vindo de fora, extra da revolução social.
No entanto, isso é profundamente reacionário. Afinal, isso pressupõe que, depois da revolução social, de modo arbitrário, a cúpula dirigente iria se empenhar em um trabalho propagandístico que mudaria a consciência das pessoas. E tal divisão, entre os que educariam a sociedade e os que teriam de mudar de hábitos, se dá fora do modo de produção, de maneira idealista, sem levar em consideração as mudanças na situação econômica e na situação de produção.
Finalmente, a análise marxista é que as opressões provêm de uma base material, ou seja, de uma inferioridade social real. Não adianta tentar apresentar uma “revolução cultural”, que seria uma mudança artificial da consciência, de fora da realidade concreta e dos meios de produção da vida material, como um meio de libertar os oprimidos. Ao contrário, onde ocorreram guerras culturais – como a kulturkampf –, elas sempre tiveram um caráter reacionário, de perseguição de uma minoria religiosa ou de um setor de oposição ao regime. Trata-se de uma maneira de forçar as outras pessoas a pensar como o poder dirigente pensa: portanto, possui um caráter reacionário.
Comentando sobre o porquê de a pequeno-burguesia universitária defender tanto a revolução cultural, Rui comentou que é uma forma de se opor ao marxismo e a ideia de que a revolução social é a locomotiva da história. Afinal, ao pôr as mudanças culturais acima da transformação das condições sociais, bem como ao colocar a tese de que a revolução social não bastaria para libertar os oprimidos – ou seja, não mudaria nada –, mas que seria necessário uma outra revolução (de tipo cultural), colocam a questão do desenvolvimento das forças produtivas e da tomada do poder do Estado como algo secundário.
Além do mais, se a revolução socialista é incapaz de libertar os oprimidos e demanda uma outra, de tipo cultural, feita posteriormente, por que ela não poderia ser feita antes? E é esse raciocínio que se observa quando os identitários defendem o aumento do poder repressivo do Estado para controlar a opinião pública. Trata-se de uma “revolução cultural” – e que, como toda “guerra cultural”, tem um caráter profundamente reacionário e está subordinado aos interesses da classe dominante.
Finalmente, tal é um meio de negar o poder transformador da revolução socialista sobre a mentalidade humana, exigindo uma outra revolução por cima.
O companheiro Rui C. Pimenta, além dessas exposições, citou o que defendia Marx em suas Teses Sobre Feuerbach, em que critica duramente o “socialismo educacional” – que é o que os pequeno-burgueses requentam ao defender a revolução cultural. Marx, destruindo o idealismo, deixou claro que a tese de que a sociedade seria educada por um grupo de homens mais educados – além de reacionária – é impossível, pois cria duas classes, a dos homens educados e dos não-educados, e não estabelece quem educará os de primeiro tipo.
Na realidade, o que muda a consciência da humanidade não é a pregação moral, idealista, nem religiosa, mas a evolução material do ser humano. As ideias de um período são frutos do estágio de desenvolvimento alcançado pela sociedade, bem como da forma de organização das forças produtivas; ou alguém pode atribuir causas “culturais” às mudanças na mentalidade entre os homens das primeiras sociedades agrícolas e os homens da sociedade capitalista?