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O pintor da Independência

Pedro Américo, a imagem do Brasil como nação independente

Em abril deste ano, completa-se 180 anos do nascimento de um dos maiores pintores brasileiros

Grandiosa! Essa é a primeira impressão que se tem ao entrar no Salão Nobre do Museu do Ipiranga, em São Paulo, e dar de frente com o quadro “Independência ou Morte!”, de Pedro Américo. A obra que, de tão importante, ficou marcada como um retrato quase oficial do Grito da Independência, voltou a ser muito falada por ocasião do bicentenário da Independência. E como sempre, é alvo dos pretensos intelectuais inimigos do Brasil, que estão acusando o pintor de estar a serviço do Império e o quadro de ser uma falsificação da realidade.

Pedro Américo de Figueiredo e Melo nasceu em 1843 na vila Brejo d’Areia, hoje município de Areia, na Paraíba. Filho de comerciante, logo cedo despertou admiração entre os habitantes da cidade pela facilidade que tinha ao desenhar. Acabou por ser descoberto pelo naturalista francês Louis Jacques Brunet, em 1852, quando passou por ali sua expedição científica. Pedro Américo não tinha completado ainda 10 anos. Foi convidado, então, a seguir numa viagem que durou 20 meses pelo Nordeste brasileiro com a comitiva do naturalista, trabalhando como desenhista da expedição, retratando as paisagens e espécies encontrados pelos cientistas.

Logo após essa experiência e devido ao seu enorme talento, já com 11 anos, em 1854, Pedro Américo foi admitido, graças a várias cartas de recomendação, na Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro. Como era muito jovem, não pôde ingressar de imediato, passando uma temporada no Colégio Pedro II. Em 1956, com 13 anos, começa na Academia, o curso de Desenho Industrial, sendo altamente premiado.

A coleção de prêmios – foram 15 medalhas – fez com que ganhasse, antes mesmo de terminar o curso, uma pensão do imperador D. Pedro II para aperfeiçoar-se na Europa. Após recuperar-se de uma doença provavelmente causada pelo chumbo das tintas que usava, foi para a Europa, chegando em Paris em maio de 1859, com 16 anos.

A bolsa paga por D. Pedro é um episódio marcante não apenas para o desenvolvimento do pintor, mas para todo o romantismo brasileiro, movimento do qual faz parte Pedro Américo e é a Escola Artística que se confunde com a época imperial Brasil.

Em sua juventude, Pedro Américo já revelava seu talento. Um pintor sofisticado, muito talentoso como desenhista, a formação europeia foi importante para o se desenvolvimento como grande artista. Na Europa, foi discípulo do grande pintor francês da época, Jean-Auguste Dominique Ingres.

No Brasil, foi apadrinhado pelo escritor romântico Manuel José de Araújo Porto-Alegre, que foi diretor da Academia Imperial de Belas Artes.

A preocupação de D. Pedro II não era meramente política. De fato, havia no governante o interesse em promover a cultura nacional e a integração do País por meio dela. O próprio D. Pedro II foi homem das letras, tendo se envolvido diretamente nos debates literários e artísticos dos quais participaram os intelectuais do Romantismo.

A política estatal impulsionou o Romantismo no Brasil, o que tornou a escola um tanto quanto oficialista, apenas a última geração escapa em partes dessa característica, com vários de seus representantes sendo militantes do abolicionismo. Esse oficialismo não tira a qualidade das obras. A própria pintura de Pedro Américo tem um caráter oficial, ele foi o pintor oficial do Império brasileiro. De fato, esse impulso foi necessário para o estabelecimento de uma arte nacional.

Esse caráter rendeu críticas a Pedro Américo, mas seria um erro analisar suas obras com base nesse fato. Antes, é preciso entender que acontece dessa maneira devido ao caráter da própria formação histórica brasileira. Da mesma maneira, os grandes escritores românticos tiveram essa mesma relação de patrocínio do imperador.

A necessidade da Pintura Histórica, da qual Pedro Américo será o maior expoente, tem o mesmo objetivo da valorização pelos românticos dos temas nacionais, do índio, do negro, das festas populares, das paisagens nacionais, das lendas, ou seja, a criação e posteriormente a constituição do Brasil como nação política e cultural.

Um pintor do Romantismo brasileiro

Pedro Américo fez parte da escola romântica na pintura. O romantismo brasileiro é inaugurado na literatura em 1836 com o livro “Suspiros poéticos e saudades”, de Gonçalves de Magalhães.

Na pintura, a escola propriamente romântica é tardia. Ela é precedida por algumas manifestações importantes, principalmente com as missões estrangeiras, incentivadas ainda sob D. João VI. A Missão Austríaca, com artistas vindos com a futura imperatriz Leopoldina, que trouxe pintores como Thomas Ender, e a Missão Francesa que trouxe Jean-Baptiste Debret e Nicolas-Antoine Taunay, entre outros. Mais tarde também, a Expedição Langsdorff, que trouxe Johann Moritz Rugendas.

Esse movimento de pintores estrangeiros criaram as condições para o surgimento da Escola Romântica. É nesse momento que a estética neoclássica começa a se firmar diante da tradição barroca que predominava até então nas artes plásticas no Brasil. Esse fato é importante, pois abre espaço para o desenvolvimento da estética romântica.

Essencial também para o desenvolvimento do romantismo e ainda obra dessas missões promovidas por D. João VI estão a constituição de academias de ciência e de arte e o aparecimento da valorização do pitoresco, do ponto de vista europeu, das qualidades do Brasil, na paisagem natural, na cultura e na composição social. Essa valorização é o que será depois uma das características fundamentais do romantismo brasileiro, considerado como o primeiro movimento artístico propriamente brasileiro, que significa dizer que o romantismo trazia consigo elementos da estética romântica europeia, mas com características próprias do Brasil.

Por isso o romantismo acaba sendo o movimento próprio da Independência, num primeiro momento, e do próprio Império.

Na pintura, a escola romântica começa tardiamente em relação à literatura. Se a obra citada acima de Gonçalves de Magalhães data de 1836, ou seja, cerca de 14 anos após a Independência, na pintura, o romantismo vai se consolidar apenas durante o Segundo Império.

Junto com Pedro Américo, o Romantismo tem nomes importantes nas artes plásticas brasileiras como Almeida Júnior, Rodolfo Amoedo, Victor Meirelles e Manuel José de Araújo Porto-Alegre, considerado o precursor do romantismo na pintura, tendo sido diretor da Academia Imperial de Belas Artes, importante incentivador de Pedro Américo.

A imagem do Brasil do Século XIX

Pedro Américo passou boa parte de sua vida em viagens pelos países da Europa. Essa experiência proporcionou ao artista o desenvolvimento e o contato com as novidades da época. Além da viagem para a Europa, D. Pedro II financiou a matrícula de Pedro Américo na Escola Nacional Superior de Belas Artes.

Ali, chegou  ganhar dois prêmios de primeira classe, mesmo assim, o pintor não se interessou pelos grandes salões acadêmicos. Pelo contrário, perto do ano de 1862, com menos de 20 anos, aproximou-se dos artistas que promoviam o Salão dos Recusados, que não faziam parte do círculo oficial dos grandes salões. Essa experiência teria feito o artista entrar em contato com os movimentos com as vanguardas pré-modernistas

Esse episódio é interessante porque mostra que a simples vinculação de Pedro Américo à escola academicista, como “acusavam” os modernistas do Século XX, não é tão precisa. À parte as lutas entre diferentes escolas e movimentos, fato é que Pedro Américo sem dúvida foi um dos maiores pintores brasileiros de todos os tempos e o maior de sua época.

Nossa tarefa como marxistas não é tomar partido nas querelas entre as diferentes escolas, mas medir o artista conforme as réguas de sua época.

Pedro Américo também foi escritor, deixando quatro romances publicados, e cientista, fazendo parte da Academia de Ciências. Pedro Américo mostrou-se não apenas um artista, mas um intelectual completo, atuando em várias áreas da ciência e da cultura.

Na pintura, enveredou-se por vários temas, mas foi com a pintura histórica que ele foi reconhecido na sua época e na história da arte brasileira com um dos maiores.

A euforia nacionalista da Guerra do Paraguai

A Guerra do Paraguai (1864-1870) é apresentada e analisada hoje pelos pretensos historiadores e intelectuais de maneira totalmente anacrônica. Em geral, é mais um episódio da história nacional contado para atacar o povo brasileiro e a formação do Brasil como nação, mostrando apenas o lado negativo – real ou fictício – dos episódios.

Embora tenha sido muito violenta e tenha de fato terminado num massacre dos paraguaios, a Guerra não pode ser apresentada apenas sob esse ponto de vista. Mais absurda ainda é a versão moralista de que os brasileiros seriam perversos contra inocentes paraguaios. Fato é que foi o Paraguai que iniciou a guerra. Além disso, os paraguaios estavam muito mais bem preparados, o que fez com que a guerra fosse muito difícil para o Brasil.

A guerra causou uma comoção popular em defesa do País. A imagem que a guerra passava para o povo era a de que havia sido uma grande realização brasileira. Pedro Américo foi um pintor que se destacou nesse movimento nacional que foi a guerra.

Esse movimento geral foi progressista, prova disso é que escritores esquerdistas, como Castro Alves, falam positivamente da Guerra. O mais importante, no entanto, é que a Guerra criou um clima de agitação política que resultará na Proclamação da República.

Pedro Américo, na esteira desse clima nacionalista com a vitória na Guerra do Paraguai, pinta a tela Batalha do Campo Grande, o que lhe dá grande popularidade e elogios dos jornais da época. Estima-se que cerca de 60 mil pessoas teriam visitado a tela nos primeiro meses de exposição.

Encomendada por D. Pedro II, a Batalha do Avaí, considerada uma de suas obras-primas, começou a ser executada em Florença, na Itália, em 1874 e foi concluída em 1877.Ainda incompleta, a obra foi exposta pela primeira vez em Florença, causando enorme comoção entre os italianos, alastrando sua popularidade também na Europa. Esse reconhecimento nos dá a dimensão do relevo de Pedro Américo para as artes plásticas em seu tempo.

Antes, o pintor produziu outras telas históricas de grande importância e alto nível estético, como a Fala do Trono, Ataque à Ilha do Carvoeiro, Passo da Pátria, Passagem do Chaco.

Foi em 1886 que Pedro Américo assina o contrato com a Província de São Paulo para a criação, em três anos, de um “quadro histórico comemorativo da proclamação da independência pelo príncipe regente D. Pedro nos campos do Ypiranga”, segundo consta no documento. Era o início da produção do que seria sua mais importante e significativa obra: Independência ou Morte!. Também pintada em Florença, o artista demorou dois anos para finalizá-la.

Notem que a obra foi finalizada e exposta um ano antes do fim do Império. Mesmo assim, ela tornou-se a imagem da Independência brasileira. É como uma fotografia do momento da proclamação por D. Pedro I.

Os críticos afirmam que a obra possui muitas imprecisões históricas. Tais afirmações, no entanto, não servem como uma verdadeira crítica à obra de arte que naturalmente será uma representação daquele fato histórico e não o fato em si.

Muitas dessas críticas têm como objetivo desvalorizar a criação do artista e a própria Independência. Algo comum é afirmar que no Grito não havia populares, diferente do que aparece na tela de Pedro Américo. Mas nesse caso, a representação é o que conta: a Independência foi um movimento popular que tomou conta do Brasil, libertando o País do colonialismo e D. Pedro foi o líder desse movimento. 

Mas entre tantos fatos podemos e devemos valorizar uma coisa: o quadro de Pedro Américo, que pode ser visto no Museu do Ipiranga, é uma grandiosa obra de arte produzida por um brasileiro.

Após a Proclamação da República, Pedro Américo continuou produzindo. Entre suas obras principais está Tiradentes esquartejado (1893) e Libertação dos escravos (1889).

Pedro Américo está entre os grandes pintores brasileiros, provavelmente o maior pintor nacional desde Cândido Portinari. A comparação aqui não é estética, mas está relacionada com a importância para o Brasil e a popularidade dos dois artistas. O pintor faleceu em 7 de outubro de 1905, vítima de “cólica de chumbo”, doença que o acompanhou desde sua juventude.

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