Aos nostálgicos, boas notícias! O primeiro longa-metragem feito pela Walt Disney Animation Studios voltará às salas de cinema. Uma versão live action de “Branca de Neve e os sete anões” deverá ser apresentado em breve ao público. Aos nostálgicos, más notícias! O nome do reboot será apenas “Branca de neve” – os anões, coitados foram cortados. Não só do título, mas de toda a produção.
Não se tratam de más notícias apenas para os nostálgicos, contudo. O corte dos anões, longe de ser uma medida inocente ou puramente artística, é parte de uma ofensiva sobre a liberdade de expressão e sobre a arte em seu conjunto. Os anões foram expulsos do filme não por uma escolha do roteirista, mas sim por uma decisão política do estúdio que detêm os direitos sobre a produção.
Tudo começou com a declaração do ator anão Peter Dinklage, que fez sucesso na série Game of Thrones. Disse ele: “não faz sentido para mim ser progressista em um aspecto, mas ainda contar essa história bizarra para c*** dos sete anões vivendo numa caverna”.
Antes de entrar no mérito do que disse o anão, apenas uma correção factual. Os anões da branca de neve vivem em uma casa de anões – são mineiros, que aparecem inclusive trabalhando nas minas. Não há nada de anormal nem pejorativo.
O que faria mais sentido seria dizer que os anões teriam sido apresentados de uma maneira infantil, como se fossem criaturas, e não seres humanos. Ainda não seria correto e seria absurdo, pois trata-se de um desenho animado com criaturas mágicas, como bruxas, mas ao menos seria uma interpretação dos fatos por Peter Dinklage, e não uma inverdade. Essa é, afinal, uma queixa frequente dos anões, que são, entre outras coisas, alvo de peças de entretenimento de baixo custo, como competições de arremesso de anões.
Ainda que fosse fato que houvesse um tratamento preconceito por parte dos roteiristas aos anões, fica a questão: que direito teriam os produtores de vetar a obra?
Esse é, afinal, o principal problema em tela. A opinião de Peter Dinklage é truculenta e reacionária – um conto de fadas não deveria existir simplesmente porque ele discorda da visão de mundo dos seus autores. No entanto, a atuação do estúdio é ainda mais criminosa, pois não apenas expressa uma opinião, como efetivamente proibiu uma obra de ser lançada por questões puramente ideológicas.
É impossível haver artes sob esses parâmetros. Afinal, o que pretendem fazer com “Branca de neve” não é arte, é propaganda: os produtores, que detém o capital – o que, na prática, equivale ao poder de vetar ou não uma obra – intervêm abertamente no filme, não com vistas a qualquer interesse artístico, mas sim com interesses puramente propagandísticos.
Sem tirar nem por, o caso da “Branca de neve” revela exatamente o que acontece hoje em dia nos grandes estúdios do cinema. Chega um produtor, apresenta o seu roteiro e esse roteiro, contudo, é submetido aos interesses de uma empresa. O caso é tão absurdo ao ponto de que os produtores escolheram uma atriz latina para fazer o papel de Branca de neve. Pode-se interpretar mil coisas do filme, mas uma coisa é certa: quando o escritor diz que o nome da Branca de neve é tal porque ela é branca como a neve, é porque ela é branca, e não latina. O roteiro original, depois de passar pelas mãos dos produtores-censores se torna, portanto, o roteiro de um outro filme: “Morena de neve e 0 anões”. A bizarrice é tal que homanageia os maiores esforços da burocracia stalinista em sufocar a arte na União Soviética.
Bastasse tudo isso, é preciso ainda considerar a que vem tamanha propaganda. Não é, afinal, nenhum interesse da Walt Disney defender os anões ou a mulher latina. É apenas o interesse em fazer propaganda da política identitária, a cortina de fumaça do século XXI para os maiores crimes do imperialismo norte-americano. Enquanto premia uma mulher latina com o papel principal no filme da Disney, o grande capitalestá, neste momento, tramando golpes e mais golpes na Bolívia, no Peru, em Cuba, na Venezuela e em todos os países do mundo.