Matéria de Moisés Mendes, no Brasil 247, intitulada “Cuca e Bolsonaro”, se junta à Santa Inquisição Digital e tenta condenar Cuca por algo que teria ocorrido há 36 anos, quando tinha 24 anos, mas que serve para massacrá-lo ainda hoje. Se no Brasil não existe pena perpétua, na internet a realidade é bem outra.
O texto diz, logo em seu primeiro parágrafo, que “Cuca foi derrubado pela torcida do Corinthians porque grupos sociais, entre os quais os que mobilizam torcidas e paixões, se fortalecem em espaços de organização, pressão, denúncia e deliberação que a extrema-direita pode tentar, mas não consegue ocupar”. Aqui já começa o engano, não houve “denúncia e deliberação”, houve linchamento público. Esse tipo de atitude é o mesmo que promove a extrema-direita. A esquerda está ocupando esse espaço e não deveria.
Não é verdade que “O desfecho do caso do treinador está muitos degraus acima das questões identitárias”, pois é exatamente do que se trata. O autor diz também que “Corintianos e todos os que se mobilizaram contra a escolha de Cuca explicitaram o sentimento de desconforto com a impunidade. Essa é a questão central”. A questão central é que uma pessoa pagará por quaisquer erros que tenha cometido em sua vida.
Segundo Moisés Mendes, “Cuca voltou para o Brasil, depois de ser preso na Suíça sob a acusação de ter abusado de uma menina de 13 anos, foi condenado lá e não cumpriu pena alguma”. Cuca e os outros jogadores cumpriram trinta dias de prisão e a pena para o suposto crime, pois não temos acesso aos autos, foi de 15 meses de prisão.
Quinze meses de prisão, essa foi a pena proferida dada em 1989, há 34 anos, e prescreveu em 2004. Isso, para os inquisidores de plantão não faz diferença, a pena continua vigorando, pois o que se busca não é justiça, mas vingança.
Moisés Mendes afirma que “O caso é exemplar como lição para o Brasil que não sabe até agora se os crimes do fascismo terão alguma reparação”. Eis uma outra deturpação, pois as penas não podem ser “exemplares”. A lei de tem que ser aplicada de maneira “neutra”, não para fazer com este ou aqule caso sirva de exemplo.
Um exemplo típico de pena “exemplar” foi usada contra o Lula em seu julgamento no TRF-4, quando um dos desembargadores aumentou sua pena e justificou dizendo que o fazia por se tratar de um ex-presidente, uma verdadeira aberração. A lei não estipula que quanto mais alto o cargo de uma pessoa, maior será a pena por determinado crime.
A única lição que tiramos desse caso do Cuca é que nas redes sociais reina a irracionalidade. E qual é a relação que existe entre esse caso que envolve Cuca com o ‘ não sabe até agora se os crimes do fascismo terão alguma reparação’ Não se pode forçar a barra comparando tentando igualar esses termos.
Segundo o artigo “O país retomou, com o crime de Berna, o debate de uma impunidade que vem desde 1987”. Por que não se debate o fato de que a condenação prescreveu e que qualquer pessoa tem o direito de seguir a vida? A esquerda não defende que as pessoas se ressocializem, que tenham uma chance de retomar suas vidas? Falta pouco para a esquerda começar a defendera castração química, como propõe Bolsonaro.
Os guardiães da moral, como Walter Casagrande, não querem que Cuca trabalhe. Ora, ele deve morrer de fome, é isso?
Esse comentarista, que se especializou em sabotar a Seleção Brasileira de Futebol, disse em seu artigo no UOL1: “Obviamente, estou sendo completamente contra a contratação de Cuca” e ainda “O meu compromisso é com o UOL, a empresa em que trabalho, e minha consciência”. Vejam que interessante, embora Casagrande, e sua consciência, não perdoem um suposto passado de Cuca, passa por cima do passado do grupo Folha, dono do UOL, que participou da repressão da Ditadura Militar contra a esquerda. Ditadura que sabidamente estuprou, torturou e assassinou.
Patrulha ideológica
De acordo com a matéria “A direita, com o apoio de parte de esquerda, pode repetir o clichê raso de que esporte e política não se misturam. // Misturam-se, sim. Tanto que os grandes clubes estão tomados de reacionários, incluindo técnicos que fazem discursos alinhados com a extrema-direita. Os dirigentes do futebol são bolsonaristas assumidos ou dissimulados”. O autor prega abertamente a perseguição ideológica. Se determinada pessoa pensa de tal maneira não deverá ocupar determinada posição.
Ora, o que tem a ver o fato de determinado técnico ou jogador ter esta ou aquela posição política? Isso fará com que seja mais ou menos competente naquilo que faz? Vamos montar seleções de futebol com base em filiação política? Isso não faz o menor sentido, é uma posição reacionária.
O autor ainda tenta justificar sua posição dizendo que “Mas o caso de Cuca não é sobre futebol nem sobre política. É sobre percepção de justiça e de impunidade de uma figura pública com liderança e poder para transmitir exemplos”. E temos que dizer, novamente, que não é sobre percepção de justiça, mas de vingança. O exemplo que Cuca nos dá, se é que cometeu o crime que alegam, é que as pessoas erram e que nem por isso devem ser estigmatizadas.
O que estão fazendo com Cuca é o mesmo que faziam na Antiguidade, quando marcavam os criminosos a ferro e a pessoa fica estigmatizada para o resto de sua vida. É uma barbaridade.
Para fortalecer sua tese, o autor do texto recorre a “genocídio, golpe, corrupção, lavagem de dinheiro, afronta às instituições, roubo de joias, formação de quadrilhas, disseminação de ódio, violência, morte e mentira”.
Mas, como Moisés Mendes mesmo concorda, “O Brasil que expeliu Cuca do futebol, talvez para sempre”. É disso que se trata, estão aplicando uma pena perpétua no Brasil. Estão massacrando um homem que supostamente cometeu um erro quando tinha 24 anos. Um crime que já prescreveu, mas que as pessoas “infalíveis”, que nunca erram, não podem deixar passar.
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[1] “Incoerente é quem critica o Robinho e apoia a contratação de Cuca” – 21/04/2023 – UOL