Artigo “STF e PF melam planos políticos bolsonaristas”, publicado no Brasil 247, revela uma tendência que vem se tornando padrão em setores da esquerda: a troca do embate político pelos escândalos policiais. Estes, no entanto, não são os métodos de luta da esquerda, é como opera a burguesia contra seus adversários políticos.
Ontem, a grande imprensa tratava do famoso tríplex no Guarujá, do Sítio de Atibaia. Com o agravante dessas duas instituições do Estado burguês cumprirem o papel de protagonistas, de agirem em nome da ordem e da Justiça.
Quando se tratava de Lula, ou do PT, a percepção que se tinha da Polícia Federal (PF) era a pior possível. O órgão investigando a própria presidência da República, fazendo prisões espetaculosas recheadas de fuzis, algemas, dezenas de homens e, principalmente, combinadas com a grande imprensa que cobria tudo em “primeira mão”.
Quanto ao Supremo Tribunal Federal (STF), é conhecida sua parcialidade, seu desprezo com a Constituição, e sua importância para o Golpe de 2016 e para a prisão de Lula.
Quando lemos que “STF e PF melam planos políticos bolsonaristas”, simplesmente se apaga o passado recente e se passa a impressão de que essas instituições estão fazendo cumprir a lei, que estariam do lado da Justiça. Se oculta que a PF está recheada de bolsonaristas, como é também o caso de todo o aparato repressivo do Estado.
Podemos confiar?
Os colunistas da esquerda e da imprensa alternativa deveriam ler os comentários dos leitores em suas matérias. Deveriam reparar que quando aparece alguma divergência, ou alguma acusação contra esses órgãos, os comentaristas saem em uma defesa quase unânime dessas instituições e atacando quem ouse discordar, chamando-os de fascistas, bolsonaristas ou coisa pior.
Alexandre de Moraes, quase um monarca absolutista, virou herói, defensor da democracia. Até a imprensa burguesa, que ficou quieta enquanto foi conveniente, está reclamando de seu autoritarismo. Não que esta discorde no fundamental de seus métodos, mas que essas atitudes ‘exageradas’ podem colocar a coisa a perder.
A indicação de Moraes para o STF pelo golpista Michel Temer causou comoção na esquerda. Se tratava de algo que só poderia acontecer no ‘fim dos tempos’. Hoje, graças a um trabalho continuado, comezinho, o jogo virou.
A esquerda e a imprensa alternativa são o principal suporte dessas instituições do Estado sem nunca ter parado para pensar se devem confiar.
O fato de Bolsonaro estar sendo alvo do Supremo e da PF, apenas indica que existem interesses maiores que querem colocá-lo de lado. O ex-presidente serviu para dar continuidade ao golpe, para entregar a Eletrobrás para os investidores parasitas, mas sua relação com a burguesia nunca foi tranquila.
Democracia em risco?
A matéria diz que se “a Justiça não punir o ex-presidente Jair Bolsonaro, a democracia continuará em risco no Brasil, afirmam os autores do recém-lançado “O Caminho da Autocracia – Estratégias Atuais de Erosão Democrática”. A obra afirma que se Bolsonaro não for punido, tentará outro golpe de Estado”. Por que ‘outro golpe’? Não foi ele quem deu o primeiro, embora concordasse. Afirmar que “a democracia continuará em risco” é admissão que existe democracia por estas terras. E estamos bem longe disso. O STF, com seu “ativismo”, legislando, interferindo em decisões do Executivo, é um obstáculo para que exista democracia.
Os crimes que Bolsonaro eventualmente cometeu, que pague por eles. Porém, enquanto toda a imprensa fale das joias dos sauditas, desta ou daquela mansão, o roubo da Eletrobrás, que é talvez um dos maiores crimes contra o Brasil, contra o povo brasileiro, este a grande imprensa não quer que se fale no assunto, que fique como está.
Ficar discutindo crimes não é papel da esquerda, nossa luta tem que ser política. Temos de falar da Petrobrás, da reestatização de todas as empresas que nos foram roubadas. Temos de tratar do fortalecimento dos sindicatos, temos que denunciar as arbitrariedades do STF e da PF em vez de bater palmas.
Existem coisas importantes a serem debatidas na esquerda, como a denúncia de ONGs financiadas pela CIA que querem impedir o desenvolvimento do País. Estão colocando obstáculos para que exploremos aquela que promete ser a maior reserva mundial de petróleo. Trata-se de nossa soberania, de lutar contra o imperialismo.
Essa história de “familícia” não leva a nada. Ou melhor, ajuda a piorar o cenário político, que fica mais repressivo e prejudica a esquerda. Prender Bolsonaro não acaba com o bolsonarismo, isso se dará com o fortalecimento da esquerda. A burguesia, usando o STF e a PF, tentou destruir o PT, não conseguiu. Prenderam Lula e este disparou nas intenções de voto mesmo estando encarcerado, tendo a possibilidade de vencer no primeiro turno. Com Bolsonaro não será diferente. Nos Estados Unidos aconteceu o mesmo com Donald Trump. Os sinais estão aí, basta a esquerda olhar e ver o que está acontecendo no mundo real.
Quem liga?
Os bolsonaristas estão vendo esse barulho todo com joias, bisteca e “o novo escândalo se [da] compra de calabresa e sardinha para os ianomâmi” como perseguição política, não vão abandonar Bolsonaro por conta disso.
O trabalhador, de modo geral, concorda que são crimes, mas não vai sair às ruas por causa disso, mas sairá para defender seus interesses de classe.
Essa campanha judicial da esquerda, despolitizada, ainda tem o inconveniente de convencer os trabalhadores de que ‘político é tudo igual’. Muitos dos políticos eleitos recentemente usaram desse artifício: se diziam ‘não políticos’, como o próprio Bolsonaro, Sérgio Moro, integrantes do MBL etc. Essa judicialização da política é uma coisa que a burguesia faz de maneira consciente e não podemos cair na mesma armadilha.
Hoje o Supremo e Policia Federal estão atrás de Bolsonaro. Amanhã será contra nós, pois essas instituições não estão a serviço da justiça ou da democracia, atendem aos interesses da burguesia, do imperialismo, nossos inimigos de classe.
.