Conforme já noticiado por este diário, houve um golpe de Estado entre os dias 26 e 28 de julho no Níger, país da região oeste do continente africano.
Logo após a consumação do golpe, viu-se toda a movimentação do imperialismo (através de seus porta-vozes oficiais, de sua imprensa e de seus capachos na África) para condenar a tomada de poder pelos militares.
Isto, por si só, expôs que se estava diante de um golpe de natureza nacionalista, o que ficou confirmado pelo apoio da população nas ruas do país.
Desde as primeiras manifestações, o povo Nigerense expressou repulsa pelo imperialismo, em especial o francês. Em cartazes empunhados pelos manifestantes, lia-se a palavra de ordem “abaixo a França!”, que também era entoada pelo povo.
Mostrando a radicalização popular, a sua consciência de que seu algoz é o imperialismo, a população chegou a atacar a embaixada da França, já no dia 30 de julho. Na ocasião, substituíram as bandeiras francesas por bandeiras da Rússia e do Níger, ação que foi acompanhada por gritos de “vida longa a Putin”, “vida longa à Rússia” e “abaixo a França.
No dia 06, cerca de 30 mil nigerenses reuniram-se em um estádio da capital, Niamei, para protestar contra a ameaça de invasão feita pela CEDEAO. A manifestação se deu algumas antes do prazo final dado pela comunidade ao novo governo, para que saísse do poder.
Já na última sexta-feira (11), nova manifestação ocorreu. Novamente contra o imperialismo francês, mas desta vez em frente à base militar francesa da capital Niamei. Foram entoadas as palavras de ordem “Abaixo a França, abaixo a CEDEAO”. A manifestação deu-se logo no dia seguinte à decisão da CEDEAO em invadir no Níger.
Em razão do apoio popular, do apoio de outros países africanos, a CEDEAO for forçada a adiar reunião marcada para o dia 12 (sábado), em que se discutiria os detalhes para a invasão.
Vê-se, então, que houve um golpe de tipo nacionalista no Níger. O anti-imperialismo da população e da junta militar é direcionado especialmente França. A razão disto é que o Níger, (assim como vários países africanos) é subjugado principalmente pelo imperialismo francês.
Sua independência da França foi formalmente declarada em 03 de agosto de 1960. Contudo, ela fez parte de uma manobra do imperialismo francês, para realizar uma “transição pacífica”, a fim de evitar que a independência fosse realizada atrás de uma insurreição revolucionária por parte da população, como estava acontecendo na Argélia.
Com essa manobra, a França conseguiu manter um profundo controle colonial sobre o Níger. Nesse sentido, há mais de meio século o país africano vem tendo suas riquezas naturais sistematicamente saqueadas, em especial o urânio, cuja exportação represente a maior parte do PIB nigerense.
Sendo a França uma das principais potências nucleares do mundo, com um dos maiores números de centrais nucleares, e uma produção de energia nuclear ainda maior, o metal é de suma importância ao imperialismo francês.
Assim, o país depende do saque das minas de urânio existentes em abundância no Níger, sendo o quarto maior produtor de urânio do mundo.
O saque é realizado, principalmente, através da estatal francesa Orano (antiga Areva), que controla a maioria das minas. Estima-se que através dessa empresa, cerca de 20% do urânio importado pela França advém do Níger. Ocorre que a Orano não paga taxa de exportação sobre a remessa de urânio para a metrópole. Igualmente, não pagam tributos sobre os materiais equipamentos utilizados nas operações de extração do metal. O único pagamento feito ao governo do Níger corresponde a apenas 5,5% de royalties do urânio minerado. Um percentual muito abaixo dos royalties cobrados pelo Cazaquistão (18,5%), país este que é maior produtor do referido metal.
Como isto é possível de acontecer? Uma empresa francesa controlar os recursos naturais de um país atrasado, e não pagar nenhum imposto sobre sua produção e exportação? Através do tradicional modus operandi do imperialismo de corromper políticos locais.
Chama-se atenção ao caso específico de Mahamadou Issoufou, que foi primeiro ministro em 1993 e 1994, presidente do parlamento em 1995 e 1996 e presidente do Níger entre 2011 e 2021.
Previamente a ocupar esses cargos políticos, fora capataz nas minas da Areva/Orano, de forma que era uma escolha perfeita ao imperialismo francês para ocupar as mais altas funções políticas do Estado nigerense.
No mesmo sentido, Hassoumi Massaoudou, o ministro das finanças de Mahamadou Issoufou entre os anos de 2016 e 2019 foi funcionário da Areva/Orano. Ou seja, um funcionário da França. Até o recente golpe, fora ministro das relações exteriores. Por óbvio, opôs-se à sublevação dos militares nacionalistas, mantendo sua lealdade aos seus patrões franceses.
Vê-se, então, que mesmo com independência formal do Níger em 1960, o país continuou praticamente sendo uma colônia da França. Praticamente um terreno de caça para a estatal francesa Areva/Orano, o povo nigerense vê seu país sendo saqueado dia a dia. Enquanto os saqueadores (sejam o imperialismo ou seus agentes locais) ampliam seu capital, a população continua a viver na miséria (estima-se que mais de 60% viva com menos de um dólar por dia).
É um clássico caso da espoliação imperialista. Aliás, é uma espoliação tão profunda que se assemelha mesmo às épocas do colonialismo europeu na África. Diante disto, todo apoio deve ser dado à luta anti-imperialista da população nigerense, e ao novo governo nacionalista que surgiu do golpe. Qualquer tentativa de intervenção militar no país africano deve ser rechaçada e firmemente combatida.