Ideologia criada pelos EUA

Fanatismo identitário volta-se contra Rafael Correa

Por isso é preciso combater o identitarismo infiltrado na esquerda

Em visita ao Brasil, o ex-presidente do Equador, Rafael Correa, concedeu entrevista para a Folha de S. Paulo. Uma declaração específica na entrevista repercutiu bastante, sobre o que o ex-presidente pensa sobre o identitarismo:

“É um erro colocar isso como central em nossa agenda. Sim, são problemas, têm que ser tratados com muito respeito. Mas nem sequer resolvemos os problemas do século XVIII, as grandes contradições, a pobreza generalizada, a desigualdade, a exploração. E nos metemos a tentar resolver e ser vanguarda do mundo de problemas de última geração. Alguns estão na fronteira da questão moral, são polêmicos. Se ser progressista é assinar esse checklist, não sou progressista. Ficamos discutindo isso, e o que, sim, gera consenso na esquerda, a pobreza, a desigualdade, deixamos de tratar. Creio, inclusive, que é uma estratégia do norte, da direita, colocar para nós estes temas conflituosos para nos distrair do essencial: que estamos no continente mais desigual do planeta. E hoje ficamos brigando sobre casamento gay, aborto em qualquer momento”.

A frase acima ganhou destaque em toda a imprensa. E como se ele tivesse adivinhado, apareceram os pseudo esquerdistas identitários para atacá-lo, mostrando que eles realmente prezam mais pela divisão do que pela unidade.

Um colunista da revista Fórum, chamado Marcelo Hailer, publicou artigo calunioso contra Correa intitulado “A homofobia de Rafael Correa e a ignorância de parte da esquerda sobre gênero e sexualidades”. Calunioso porque o acusa de algo que simplesmente ele não é e distorce totalmente a declaração do ex-presidente.

Segundo o colunista, as declarações de Correa “poderiam estar – e estão – tranquilamente na boca de qualquer liderança da extrema-direita. Completamente ignorante sobre questões de gênero e sexualidade, quando Correa fala sobre jovens trans, ele reproduz o mesmíssimo discurso que Nikolas Ferreira (PL-MG) proferiu na tribuna da Câmara no Dia Internacional das Mulheres, quando o parlamentar vestiu uma peruca, declarou se sentir e mulher e que o seu nome era ‘Nikole'”.

Vejam o nível política da discussão, o nível de autoritarismo e fanatismo. Simplesmente pelo fato de Correa ter uma opinião sobre um determinado problema, ele se torna quase o mesmo que a extrema-direita. É acusado de homofóbico, o que na cabeça do identitário corresponde a ser um criminoso.

Para quem acha que estamos exagerando, vejamos o que diz o artigo:

“Infelizmente, o discurso de Rafael Correa – que pode ser facilmente classificado na esfera dos discursos de ódio, pois ele desumaniza outras configurações sexuais e sociais, encontra forte ressonância em parte da esquerda latino-americana, mas nas Américas como um todo.”

O identitarismo introduziu um nível de histeria na política que hoje não se pode discutir nada sob risco de ser acusado de fazer “discurso de ódio”. E aí, segundo esses mesmos identitários e o imperialismo, o discurso de ódio deve ser transformado em crime.

O artigo continua, afirmando que “dessa maneira, Rafael Correa e outros líderes da esquerda reproduzem o que há de mais retrógrado sobe sexualidades não heteras. Ao fim ao cabo, parecem concordar que o lugar das LGBT é no limbo social alijados de qualquer direito civil.”

Mais uma calúnia. Rafael Correa não diz nada disso. Pelo contrário, ele defende alguns direitos das chamadas minorias e das mulheres.

O colunista sequer entra no argumento do que diz Correa. Por exemplo, o ex-presidente afirma que estão deixando de lado questões importantes, como a desigualdade e a miséria, para pensar em questões secundárias. Que as pautas identitárias servem para dividir a esquerda e não unificar e que foram criadas “no Norte”, ou seja, pelo imperialismo.

O colunista está tão preocupado em manter sua posição que distorce o que diz Correa e nem se preocupa em discutir os seus argumentos. Tanto é assim que ele chega ao extremo de acusar Correa de neoliberal:

“O ex-presidente do Equador se diz um firme combatente do neoliberalismo, mas, quando ele diz que a família deve seguir as tradições e a cultura da sociedade, ele está justamente reproduzindo a base do pensamento neoliberal”.

É interessante que Correa critica justamente o identitarismo por ser uma ideologia que foi difundida no imperialismo, ou seja, pelo neoliberalismo. O colunista da Fórum ignora esses argumentos e acusa o contrário.

Mas o colunista da Fórum simplesmente ignora a realidade. Qualquer um sabe que a propaganda identitária é feita nos principais jornais porta-vozes do imperialismo e do neoliberalismo. Qualquer um deveria enxergar que essa ideologia é amplamente difundida pelos grandes capitalistas.

Não apenas esse problema de que o identitarismo foi gerado nos países imperialistas, a maioria das coisas ditas por Correa estão corretas. A única ressalva que fazemos é a de que o ex-presidente foi tomado pela confusão entre o identitarismo e a luta pelos direitos das mulheres e das chamadas minorias. Ele confunde a luta real das mulheres, por exemplo, que é algo progressista, com o identitarismo que é uma ideologia reacionária. Nesse sentido, a luta pelo direito ao aborto é uma luta legítima e progressista. Pode até ser que ela não seja a principal luta da esquerda, mas é um luta essencial. Mas isso não tem nada a ver com o identitarismo.

E por ser reacionária e uma ideologia imperialista, como muito bem falou Correa, não devemos apenas deixar de lado, parar de discutir a questão. Ela precisa ser combatida ideológica e politicamente, é preciso delimitar muito bem dentro da esquerda que a ideologia identitária é uma inimiga.

Diferentemente do que afirma o colunista da Fórum, nada do que Correa diz tem a ver com a extrema-direita. 

Sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o colunista da Fórum acusa Correa de ser homofóbico:

“Em diálogo com a extrema-direita contemporânea, Correa afirma que a família é a união entre um homem e uma mulher. ‘Eu disse aos gays: existe a união de fato, com todos os benefícios de um matrimônio. Mas um matrimônio em princípio, por tradição em nossa sociedade, como parte da cultura, é uma união do homem e da mulher, e eu também sigo considerando isso como correto'”.

A afirmação de Correa, que deixa o colunista escandalizado, não tem absolutamente nada de mais. Correa apenas constata que as pessoas, em geral, entendem que o comum é o casamento entre homem e mulher, e que a esquerda não deve impor nada diferente do ponto de vista dos costumes. É um problema simplesmente de reconhecer às pessoas do mesmo sexo o direito de união legal. E Correa, talvez o colunista da Fórum não saiba, foi quem garantiu isso no Equador. Se pesarmos na balança, mais vale o “homofóbico” Correa do que um colunista identitário que só fala.

Para o identitarismo, que é uma ideologia de tipo religiosa, não basta a pessoa defender os direitos dos LGBTs. Se ela não concordar com tudo o que os LGBTs pensam e fazem, ou talvez se ela não se tornar um LGBT, ela será acusada de LGBTfóbica.

Por fim, o colunista da Fórum acusa Correa de ser machista por conta da seguinte declaração:

“É preciso haver justiça de gênero, por exemplo. Não se pode permitir que no mesmo trabalho a mulher ganhe menos ou que tenha que ficar em casa para o homem trabalhar, cuidar dos filhos, e o home não. Isso é justiça. Mas vêm as feministas e dizem que justiça é poder abortar quando a mulher quiser. Aí vem a polêmica”.

Com exceção da confusão sobre o aborto, sobre a qual já falamos acima, a declaração de Correa não tem nada de errado. Ele está defendendo uma reivindicação tradicional do movimento de mulheres que é a igualdade de salários e oportunidades.

Esse tipo de acusação demostra mesmo que o identitarismo é pura histeria e não defende de fato os interesses das mulheres. É parecido com o caso Nikolas Ferreira. O deputado direitista falou dos transsexuais e falou, em pleno dia da mulher, que as mulheres deveriam ser donas de casa. Os identitários nem se preocuparam com essa última colocação, muito mais significativa para os direitos das mulheres, e fizeram um escarcéu sobre a “transfobia”. Correa defendeu o direito das mulheres, mas tudo o que o colunista da Fórum conseguiu ver foi a palavra confusa sobre o aborto, o que já transformou Correa em machista.

De fato, é o identitarismo é uma ideologia que está na esquerda para dividir as forças ao invés de unir. Por isso precisa ser combatido.

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