Diário Causa Operária, por meio de seu correspondente Eduardo Vasco, atualmente em Cuba, realizou uma entrevista com Raúl Capote, um ex-agente duplo que trabalhou na CIA, USAID e outras organizações do Estado norte-americano para recolher informações para o governo cubano e evitar atentados terroristas promovidos pelos EUA. Capote forneceu detalhes sobre como funciona a Fundação Ford e o processo de corrupção de movimentos de esquerda por parte da CIA.
Esta é a segunda e última parte da entrevista. A primeira foi publicada na edição de ontem do DCO.
Eduardo Vasco: esses movimentos de “oposição”, então, não têm nada de independentes.
Capote: Não, claro que não. Independente quer dizer que você supostamente cria uma ONG para problemas ambientais. E essa ONG está ligada a uma suposta luta por essas questões, que vão ser financiadas pelas fundações que nos referimos. É por isso que eu temo um grupo ou um setor da população que se separe completamente, na aparência, de qualquer partido político ou movimento social, de qualquer coisa. Lembro que uma das professoras que tive na época me disse: se um comunicado emitido por uma montadora diz que a mudança climática é uma mentira, ninguém vai acreditar porque ela produz carros e as pessoas vão automaticamente dizer “bom, mas o que eles e as montadoras vão dizer”? Claro, agora se eu criar uma ONG onde existe um grupo de especialistas supostamente especialistas no assunto, eles supostamente não têm nenhum vínculo com as montadoras, mas começam a dizer que está cientificamente comprovado que as mudanças climáticas são falsas, que é uma campanha da esquerda, que é uma invenção dos comunistas… É muito mais fácil acreditar em um especialista, um suposto cientista. Agora de onde vem o dinheiro?
É a mesma história aqui. Foi exatamente o mesmo. Ou seja, fragmentando a sociedade, dividindo a sociedade com o discurso do fim da história. Lembre-se de quando Obama veio a Cuba, quando o presidente Barack Obama veio a Cuba, no primeiro discurso que Obama fez ao povo cubano, a primeira coisa que ele disse: “vamos esquecer o passado”. “Vamos continuar pensando nas coisas que aconteceram”. “O que olhar daqui para frente, o que vamos fazer, onde vamos chegar”. E então para muitas pessoas, areação de muitas pessoas em Cuba foi “bom, como vamos esquecer o passado e todas as coisas que você fez?” “Nós?” Não sabemos a que vieram. E a visita a Cuba foi uma clássica, uma clássica operação de desmontagem. Não houve nada de vantajoso para os cubanos. Mesmo quando ele ficou de costas para a imagem do Che, que muitos disseram “bom, por que vamos tirar uma foto com o Che por trás?” Não, não foi coincidência, não foi ingenuidade. Ele estava tentando dar um novo conteúdo à imagem do Che. Isso, em termos de comunicação, é importante, porque ele queria ser ligado à imagem do Che na Plaza de la Revolución a partir daquele momento. Não à imagem habitual do Che, mas à sua visita. Tudo combinou muito bem com Cuba, muito bem, muito bem preparado e muito bem montado. E as ONGs, claro que são muito críveis, são absolutamente críveis.
Eles têm uma organização supostamente sem fins lucrativos que vive de patrocínio. Como não se sabe de onde vem, ela atua e trabalha nas comunidades para resolver problemas que ninguém conseguiu resolver até então. Algumas pequenas coisas têm um impacto breve e pequeno, mas visível dentro daquela comunidade e, portanto, têm um forte nível de influência, porque essa mesma ONG se dedica de três ou quatro maneiras. O interessante é que acabam fazendo coisas para as quais nada supostamente estava acontecendo. Há uma série de problemas que não foram resolvidos e eles resolvem o problema. É para isso que eles supostamente vieram. Eles vão desenvolver um projeto agrícola para o desenvolvimento sustentável e estão começando a fazê-lo. Mas o que isso tem a ver com o fato de começarem a enviar líderes comunitários para fazer cursos nos Estados Unidos? O que tem a ver a liderança que você mandou para aquela pessoa com o projeto que você está desenvolvendo na área? Vimos, por exemplo, em uma instituição de ensino, seja uma ONG, que se trata de uma instituição de ensino em um município bem distante, supostamente para colaborar com o desenvolvimento agrícola da região. E estabelece um vínculo com a Diretoria de Ensino. Lembro que cheguei naquele lugar e encontrei um prédio moderno no meio daquela área bem atrasada. Um prédio muito moderno, carros, pessoas muito bem vestidas. Um estado que se destacava diante do resto da população. Quando eu comecei a falar com eles disseram-me que não, quem manda no município está no estrangeiro, numa guerra, e começam a mandar pessoas para estudar e até participaram nas decisões da Câmara de Vereadores diretores desse grupo. E a pergunta era por que eles vieram fazer um trabalho de agricultura sustentável? É assim que conseguem penetrar com muita habilidade, usando todo o dinheiro do mundo. Você tem o recurso que não tem em nenhum outro lugar porque vem de fontes desconhecidas. E havia um papel ali, porque os tentáculos da CIA em todos os lugares são reconhecidos por aí. No passado, tivemos que nos infiltrar organizações e fazer uma determinada coisa. Hoje simplesmente colocamos o dinheiro em uma ONG, criamos uma ONG e fazemos ela intervir.
EV: Aí que entra o NED, acho em 1990.
C: Perfeitamente. Não precisamos dar um golpe, não precisamos fazer mais nada. Eles simplesmente plantam no lugar uma ONG. O estrago que eles fazem é tremendo porque você consegue, com a esquerda, formar uma esquerda traiçoeira. Você pode conseguir o que não vai conseguir com a direita. Não vou falar do país, mas lembro-me de um país onde se lutava há anos contra uma reforma que tinha a ver com a questão da reforma dos trabalhadores e do emprego juvenil. A direita passou anos tentando impor essa reforma e não conseguia. Cada vez que tentavam, as manifestações, os protestos, eram gigantescas no país. Os trabalhadores paralisavam e os parlamentares não conseguiam aprovar. O que fizemos? Quando um partido de esquerda chegou ao poder, eles introduziram a reforma sem protesto algum. E no final, essas pessoas conseguem o que nunca conseguiram pela direita, simplesmente alcançam seu objetivo usando essa estratégia que sempre vem sendo preparada com bastante antecedência. Não é algo que tenha surgido do nada. Vemos isso no continente. Quantos líderes não aparecem? Rivera? Não sei de onde vieram e se projetaram internacionalmente com uma facilidade tremenda em questão de pouco tempo. As pessoas que não têm história, não têm histórico, que não têm nada, têm uma publicidade enorme. Todos os canais de televisão estão lá, eles estão lá. Está na imprensa, tem um enorme apoio por trás e você não sabe de onde veio. Você não sabe qual é a sua carreira, mas quando for ao seu currículo verá que sempre estudou nos Estados Unidos. Por acaso, em algum momento ele conseguiu uma bolsa de intercâmbio, fez um curso de liderança, conseguiu uma bolsa em uma universidade americana. Mas que coincidência que todos sempre foram treinados em projetos desse tipo. Não pode ser coincidência. De maneira nenhuma.
EV: Quais são os planos atuais dos Estados Unidos contra Cuba? Acabar com a Revolução Cubana pelo bloqueio ou aproveitando a questão do bloqueio?
C: Sim. Porque não se pode separar um do outro. O cerco a Cuba se aperfeiçoou ao longo dos anos com base na experiência, da derrota que sofreram contra a Revolução Cubana e que hoje tem suas características diferentes de como foi em determinado momento. Hoje o Plano contra Cuba ainda é essencialmente o plano do presidente Bush, ainda é o plano de Bush.