Segundo especialista

EUA deveriam estar em tribunal de guerra por invasão do Iraque

Para ele, isso acabou "com toda a perspectiva de futuro, de desenvolvimento econômico-social que o país tinha"

  • Sputnik News Brasil

Em março, a invasão do Iraque pelos Estados Unidos completa 20 anos. Após duas décadas da incursão estadunidense, baseada na ‘mentira do século’, especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil afirmam que o país segue marcado por instabilidades e os responsáveis pela destruição iraquiana não foram punidos por crimes de guerra que teriam sido cometidos.
O argumento principal usado pelos EUA para invadir o Iraque foi o de que Bagdá possuía armas de destruição em massa, um argumento que se provou falso, em razão da inexistência de qualquer artefato com esse potencial em solo iraquiano.
O episódio do podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, desta terça-feira (22) aproveitou a efeméride para questionar o legado deixado pelos EUA no Iraque. Especialistas ouvidos pelas jornalistas Melina Saad e Thaiana de Oliveira apontaram a falta de criminalização dos responsáveis pela guerra.
Para Eden Pereira Lopes da Silva, professor de história da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), é possível classificar a justificativa estadunidense para a guerra de a mentira do século. Silva lembra que o ex-fuzileiro norte-americano Scott Ritter, ex-chefe dos inspetores da Organização das Nações Unidas (ONU) no Iraque, comprovou que não havia nem essas armas nem capacidade de produção destas antes de a invasão se concretizar.

“Todo o grosso das armas e todo o know-how que existia a possibilitar a construção dessas armas havia sido destruído ao longo dos anos 1990. Então não fazia sentido algum dizer que essas armas existiam naquele momento. O discurso do Colin Powell [secretário de Estado dos EUA entre 2001 e 2005] na ONU é realmente a mentira do século”, afirmou o professor da UERJ.

“Essa denúncia foi defendida dentro do Conselho de Segurança da ONU. Houve uma oficial que, caso fosse [apresentada por] um país com menos poder geopolítico, com certeza estaria hoje em um tribunal de guerra envolvendo vários dos seus líderes, como aconteceu em outras guerras”, completou.
O especialista afirmou que a discussão de que o Iraque possuía essas armas “era extremamente mentirosa e visava apenas atender aos interesses geopolíticos, econômicos e militares dos Estados Unidos naquele momento”. Havia, inclusive, interesses particulares da gestão de George W. Bush na invasão, em especial do então vice-presidente, Dick Cheney, por conta do petróleo iraquiano e dos contratos de reconstrução.
O pesquisador aponta ainda que os EUA deixaram um legado de destruição no Iraque.
“Se a gente pega todos os índices educacionais, de saúde, de avanço social que existiam no Iraque antes de 2003 e depois de 2003, as pessoas praticamente caem para trás. Em 2003, ele tinha o mesmo consumo de energia elétrica per capita que a China, tinha um dos melhores sistemas de educação do Oriente Médio e tinha o melhor sistema de saúde do Oriente Médio […]. E isso foi uma construção de décadas, porque o Iraque sempre foi um país que passou por uma série de conflitos no século XX. Sempre foi ocupado por forças estrangeiras. Os 30 anos do período baathista foram muito importantes para a história iraquiana do ponto de vista do desenvolvimento social, algo que retrocedeu muito desde 2003, sobretudo em virtude da ascensão de movimentos fundamentalistas que transformaram o Iraque praticamente em uma praça de guerra.”
Para ele, isso acabou “com toda a perspectiva de futuro, de desenvolvimento econômico-social que o país tinha”. “O discurso dos Estados Unidos de reconstruir o Iraque, de trazer a prosperidade, de transformá-lo na maior democracia do Oriente Médio, isso está muito longe de ser verdade. Se a gente olha para o Iraque hoje, 20 anos depois, enfim, vê essa situação […] hoje de […] quase que guerra de gangues no meio das ruas.”
Victor Missiato, professor do Colégio Presbiteriano Mackenzie Tamboré, também classifica a invasão do Iraque de “uma das maiores vergonhas da política internacional do século XXI”.
“Trata-se, talvez, de uma das maiores mentiras do século XXI a notícia de que o Iraque possuía armas de destruição em massa. [Essas armas] não estavam em lugar nenhum. Embora o Iraque tenha utilizado armas químicas contra alguns povos ali dentro, as armas de destruição em massa previstas pelos Estados Unidos não se configuraram como uma realidade.”

* A matéria não expressa necessariamente a opinião desse jornal

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