O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, concedeu sua entrevista coletiva de fim de ano na última terça-feira (19), declarando não acreditar na derrota do país na guerra com a Rússia, e manifestou a esperança de que os EUA não vão interromper sua ajuda financeira e militar a Kiev.
Enquanto candidato nas últimas eleições na Ucrânia, Zelensky, utilizou o discurso “antissistema” e derrotou o tradicional Petro Poroshenko, vencendo o segundo turno com 73% dos votos, em 25 das 26 regiões da Ucrânia. O povo via a economia do país decair 15%, um ano antes do pleito.
Antes de sua presidência, Poroshenko atuou como deputado no Parlamento da Ucrânia, ministro das Relações Exteriores, depois ministro do Comércio e Economia e secretário do Conselho de Segurança e Defesa Nacional. Ele se tornou bilionário após ter adquirido uma fábrica de chocolate da era soviética.
Zelensky, ator de televisão, comediante, ostentava sua falta de qualificação política. “Não sou um político”, disse Zelensky em um debate ao ar livre com Poroshenko no estádio Olímpico de Kiev, dois dias antes da votação do segundo turno. “Eu sou apenas um ser humano comum que veio para quebrar esse sistema.”
O cacoete de ator continua ativo. Na semana passada, Zelensky embarcou em uma turnê por países imperialistas para defender mais apoio militar e político à Ucrânia. Sem qualquer pudor, também por conta do desespero com as dívidas acumuladas, solicitou 60 bilhões de dólares ao Congresso dos Estados Unidos, quantia negada pela maioria dos congressistas.
Durante semanas, o governo Biden e os republicanos da Câmara estão em impasse sobre o pacote de 60 bilhões para a Ucrânia, dinheiro que Kiev diz ser vital para conter as forças russas. Os republicanos, no entanto, exigiram que os fundos fossem vinculados a medidas rígidas de segurança na fronteira e imigração.
Mesmo os republicanos que apoiam a Ucrânia estão dispostos a atrasar o dinheiro enquanto aproveitam a chance para pressionar por políticas de fronteira mais duras. E alguns membros da linha dura do partido alinhados com Trump – um cético de longa data da Ucrânia – dizem que são contra qualquer ajuda adicional a Kiev.
Há também a questão de Israel, que conduziu o Congresso dos Estados Unidos para um objetivo comum, a de tentar destruir a Faixa de Gaza. Enquanto isso, em Bruxelas, o líder húngaro, Viktor Orbán, bloqueou cerca de 50 bilhões de euros em ajuda destinada a Kiev.
Com a demonstração de força russa, com o grande número de desertores, o crescente descontentamento da população e a pressão política da oposição, que aumenta seu volume, Zelensky partiu para o fechamento de partidos e cassação dos críticos na Rada.
Pesquisas recentes mostram que o número de ucranianos que confiam em Zelensky caiu para 62%, em comparação com 84% há um ano, enquanto as forças de Kiev comemoravam a estabilização das perdas territoriais.
A Ucrânia depende da ajuda externa para cerca de metade do seu orçamento federal e para a maior parte das munições e armamentos que sustentam o seu exército, e, para a população ucraniana, a vitória contra a Rússia é uma questão de honra, que pode significar a permanência ou não de Zelensky que, na dúvida sobre a popularidade, preferiu suspender o processo eleitoral no país.
Durante a entrevista coletiva de ano, Zelensky teve que desmentir rumores de que tem uma relação tensa e ruim com o chefe das Forças Armadas, Valery Zaluzhnyi, dizendo que eles têm uma “relação de trabalho” focada em que os militares alcancem resultados no campo de batalha.
Zelensky disse que os militares ucranianos propuseram mobilizar de 450 a 500 mil pessoas para reforçar as defesas do país, precisando, para esse objetivo, de 13,4 bilhões de dólares. Isso tudo em um quadro onde cerca de 6 mil pessoas por dia, em situação de alistamento militar, fogem da Ucrânia pelas fronteiras do país.
O desespero com que Zelensky respondeu às questões, bem como o quadro de necessidades, expõe uma crise que não tem mais volta. E os controladores do presidente ucraniano, as potências imperialistas, não estão mais dispostos a manter a ajuda militar. A população desses países também está bastante contrariada com essa ajuda, em meio a uma crise inflacionária e de energia. Já nos Estados Unidos, Biden terá pela frente Donald Trump, que segue firme em primeiro lugar nas pesquisas.
Mesmo diante dessa conjuntura, Zelensky afirmou na entrevista de final de ano que tem “certeza” de que os EUA não “trairão” seu país e liberarão um novo pacote de financiamento. “Estamos trabalhando muito nisso e tenho certeza de que os EUA não nos trairão e que aquilo que concordamos nos EUA será completamente cumprido […] Eles deveriam saber, nossos parceiros norte-americanos, que estamos aguardando essa ajuda. Eles sabem os detalhes sobre para que ela é necessária e seus impactos”, completou.
A insistência de Zelensky, diante da guerra perdida, deixa os EUA num dilema. Zelensky foi um instrumento valioso da política norte-americana, fazendo exaustivamente campanha para se manter junto ao imperialismo como um apoiador unificado da guerra por procuração contra a Rússia. Mas, diante do desastre econômico e político da derrota, Zelensky se tornou um passivo, que não é mais um instrumento de seus objetivos, mas um obstáculo.
Exemplos da desmoralização de Zelensky vão se acumulando. A Polônia, juntamente com Hungria e Eslováquia, proibiu a importação de grãos ucranianos, apesar da suspensão da União Europeia ao embargo do grão. Kiev representou os três países na Organização Mundial do Comércio. Sobre isso, o presidente de Belarus, Alexandre Lukashenko, comentou “Você acha que a Polônia está pressionando a pobre Ucrânia hoje sem motivo? Não, eles receberam luz verde do exterior: precisamos descartar esse Zelensky, estamos cansados dele”, disse Lukashenko.
Para manter o apoio dos ucranianos e do imperialismo, Zelensky prometeu não apenas que a Ucrânia recuperaria seu território até suas fronteiras anteriores à guerra, mas que reivindicaria todo o seu território até suas fronteiras de 2014, incluindo o Donbas e a Crimeia. Ele também decretou que a Ucrânia não negociaria com Putin. Promessas não realizadas fazem com que o imperialismo esqueçam a Ucrânia diante da incapacidade de negociar o fim da guerra. Todavia, a extrema-direita que convenceu Zelensky a sair de sua plataforma de paz de campanha estão lá para convencê-lo a voltar a ela. Será uma guerra de desgaste, mas que poderá reservar à Ucrânia mais cisões em Odessa (Rússia), Lviv (Polônia), Ivano-Frankvisk (Polônia) e Transcarpátia (Hungria).
A derrota e a desmoralização da Ucrânia se aproxima de uma situação irreversível. Provavelmente já se discute a forma de descarte do ex-comediante: se uma renúncia com asilo na Flórida, ou com um evento mais trágico. Fato é que Zelensky foi esquecido neste natal e ninguém quer passar este dia com um inepto que arrasou seu próprio país em dois anos.





