Drogas Imperialistas

Epidemia de opioides e a crise social nos EUA

Grandes corporações farmacêuticas ganham milhões de dólares mas o problemas são os laboratórios clandestinos na China e no México enquanto mais de um milhão de mortos nos EUA

Outra epidemia tem imperado nas terras do Estado considerado o mais poderoso do mundo: a subida do consumo de opioides, substâncias com grande capacidade analgésica e também de causar dependência física e psicológica, é um dos principais sintomas desta epidemia, contudo não é o único.

Nos últimos dias, um video mostrando a situação lamentável e bastante triste das consequências desta epidemia tem viralizado na internet. Com a duração de um minuto, mostra várias pessoas deitadas, curvadas sobre o próprio corpo, jogadas nos degraus das escadas ou encostadas nas paredes dos prédios em uma rua que seria de Filadélfia, parecidos com as chamadas “Cracolândias” que acontecem em várias cidades no Brasil.

São vitimas de algo que o Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC), órgão norte-americano, aponta como uma epidemia devido ao uso indiscriminado de opioides que se iniciou principalmente por prescrição médica e se aprofundou quando estas substâncias também foram usadas de outras maneiras.

O termo opioides é utilizado para um conjunto de substâncias que incluem opiatos (tipo morfina e codeína), oxicodona (Oxycotin, Percocet), hidrocodona (Vicodin, Norco) e Fenatil. São empregados como analgésicos contra dores agudas e/ou crônicas, além de possibilitarem sensação de felicidade e euforia. Entretanto, o uso continuado e sem supervisão tem como efeito adverso a dependência do usuário, podendo levar a overdose mortal, uma vez que são necessárias cada vez maiores doses para alcançar a mesma sensação.

Segundo relatório do CDC divulgado em junho de 2023, no período entre 1999 e 2020, mais de 263 mil pessoas morreram nos EUA por overdose de opioides receitados, enquanto mais de um milhão de pessoas por overdose no total Somente em 2020, esse número foi de 17 mil pessoas por substâncias receitadas, cinco vezes mais do que no inicio da série histórica. Sem contar as estimativas das mortes relacionadas a opioides/opiáceos entre 2020 e 2021 que estariam em torno de 25 mil pessoas.

O ano de 2021 foi mais alarmante uma vez que foram mais de 106 mil pessoas sendo que mais de 70 mil mortes relacionadas por overdose ou intoxicação com uma substância psicoativa que atua no sistema nervoso, a fentanil.

Esta é uma droga criada pela empresa belga Janssen Pharmaceutica (atualmente faz parte do grupo Johnson & Jonhson, J&J) que deveria ser empregada em casos que necessitariam o controle de dor intensa.

Como este medicamento, entre tantos outros, tem provocado tantas mortes e se tornou esta ameaça mortal? O artigo de Thiago Rodrigues e de Paulo Pereira na Le Monde Diplomatique de 6 de abril intitulado “Voracidade dos lucros e a “epidemia dos opioides” nas Américas” traz o histórico desta epidemia e revela a hipocrisia estadunidense no chamado combate “às drogas”.

A partir da década de 90, grandes corporações farmacêuticas tais como Purdue Pharma, Pfizer, Janssen Pharmaceuticals Inc., Actavis, Abbott Laboratories trabalharam para afrouxar a legislação norte-americana de modo que inundassem o mercado com os seus medicamentos sintetizados. Defendiam que eram medicamentos sem risco de abuso ´e inofensivo.

Hoje se sabe que o relaxamento da legislação sobre o controle deste conjunto de drogas foi atingido através de lobby, propaganda maciça, cooptação de médicos e aliciação de agentes fiscalizadores foram os modos empregados conseguir a autorização de uso destas substâncias e estimular sua prescrição e consumo abusivo, o que permitiu lucros gigantescos.

Como ilustração, o primeiro criado desses medicamentos, o Oxycontin, angariou, pelos anos de 1995 a 2020, um faturamento de quase US$ 35 bilhões de dólares para a Purdue Pharma.

O estímulo para o seu uso nos EUA é tão intenso o seu consumo no país, ou seja, de 80% do mundial e 30 vezes mais do que precisariam de acordo com Organização Mundial de Saúde em 2015. Este consumo estimulou que o surgimento de um mercado ilegal para quem não conseguia comprar de forma legal ou mesmo sem uma receita.

Este mercado ilegal foi estimulado visto porque estas drogas sintéticas passaram a ser misturadas como outras, como heroína, cocaína e demais drogas sintéticas a fim de ter consumidores mais ávidos por maiores quantidades e/ou preservar a droga original, dando origem a inúmeros laboratórios ilegais que as autoridades estadunidenses afirmam se localizar na China ou no México e tem usado este fato para pressionar os seus governos. Como forma de suportar esta ação algumas destas grandes corporações estão sendo pressionadas em termos de indenizações e acordos com quem estava entrando na justiça estadunidense. Tanto que em 2021 a J&J fez um acordo com o Estado de Nova Iorque que pagaria US$ 239 milhões de dólares e deixaria de produzir e de comercializar opioides no país enquanto a Purdue Pharma tem um processo na Suprema Corte Federal sobre a validade do seu pedido de falência como forma de limitar as indenizações. Tudo isto depois de mais de 800 mil mortes devidos ao uso de opioides e de opiádicos prescritos ou ilegais.

Este caso é mais uma comprovação da hipocrisia do imperialismo. Não espanta quando se verifica como foi a questão da heroína no Afeganistão nos vinte anos de ocupação estadunidense.

Em 2001, a área empregada no cultivo da papoula neste país da Ásia Central era estimada em torno de 74 mil hectares. Esta área foi triplicada durante a ocupação estadunidense ainda que estes teriam gastado mais de US$ 8 bilhões em um pretenso combate ao cultivo através de bombardeios e destruição de lavouras.

Após a retirada dos EUA graças à luta popular liderada pelo Talibã, em dois anos a área cultivada foi reduzida em mais de 80% após a sua proibição em abril de 2022. Além do patrulhamento efetivo tendo sido estimulado a troca do cultivo da papoula pelo trigo.

Nos EUA, o foco da questão destas drogas sintéticas tem sido o aumento das penas e das punições de quem a vende de modo ilegal, o que só provoca o aumento dos preços destas substâncias que são produzidas de modo mais rápido do que as drogas naturais sem que exista uma regulamentação da sua comercialização e da sua produção.

Por fim, é preciso ressaltar que o consumo destas drogas foi aumentando a partir de 2016 e acelerou violentamente a partir de 2019, um sintoma da grave crise socioeconômica que se encontra a sociedade estadunidense submetida a ela própria a pressão do imperialismo.

Somente a superação do capitalismo, eliminados os lucros das grandes corporações para os seus donos enquanto milhares de pessoas são submetidas a uma vida massacrante que precisam ter momentos ilusórias de uma euforia vã pode fazer que vídeos como aqueles se tornam parte da pré-história prevista por Friedrich Engels.

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