A ditadura global segue em estado de choque com a onda de insurreições no continente africano. Para o multicampeão nos golpes de Estado pró-imperialistas no próprio País, o reacionário O Globo, a sequência de golpes é uma “tendência de ‘recessão democrática’” (“Retorno dos golpes à África reforça tendência de ‘recessão democrática’”, 9/9/2023). Está em vias de se tornar senso comum, mas não custa reforçar que quando a imprensa burguesa diz “democracia”, “democrática” e afins, está, na verdade, se referindo ao seu criminoso sistema de exploração e corrupção, levando a frase a ser melhor traduzida como “a libertação da África reforça tendência de crise do imperialismo”.
O fenômeno não é novo. Citado pelo editorial do órgão golpista, a ONG Freedom House publicou em 2018 um relatório apontando que no ano anterior, os regimes políticos “democráticos” (leia-se, controlados pelo imperialismo), “atingiram o seu ponto mais baixo em mais de uma década, prolongando um período caracterizado por autocratas encorajados, democracias sitiadas e a retirada dos Estados Unidos do seu papel de liderança global” (“Freedom in the World 2018”, Michael J. Abramowitz).
Ocorre que deste então, o mundo viu a pandemia do coronavírus, libertação do Afeganistão e a ofensiva russa contra a OTAN na Ucrânia, entre outros eventos que enfraqueceram dramaticamente a dominação mundial pelos grandes monopólios das nações desenvolvidas. Os levantes nacionalistas do Sael são a mais nova expressão da debilidade desse sistema, que tampouco demonstra coesão para esboçar reação.
Uma parte importante desse processo e que sempre deve ser destacado, é justamente a supracitada expulsão dos invasores imperialistas pela rebelião revolucionária afegã. Completando dois anos no último 15 de agosto, a campanha de libertação do Afeganistão, liderada pelo Talibã, expôs a debilidade das nações desenvolvidas, incapazes de sustentar uma ocupação militar contra um dos países mais pobres do mundo. As nações oprimidas sem dúvidas tiraram lições do evento.
O imperialismo ainda tentou uma cartada muito cínica, de recorrer ao identitarismo para desacreditar a vitória dos talibãs, divulgado a tolice de que o fim da bárbara ocupação de 20 anos no país asiático representava um duro revés às mulheres, as mesmas que na sequência, seriam condenadas pelas potências imperialistas a morrerem de fome com o bloqueio econômico e o roubo dos recursos afegãos. Fora a emotiva esquerda pequeno-burguesa, ninguém levou a lorota a sério. Atentos aos sinais, poucos meses depois, os russos dobraram a aposta e empreenderam uma ousada invasão à Ucrânia.
Também nesse caso, toda sorte de malabarismo retórico foi e continua sendo usado para impedir que as derrotas das nações desenvolvidas fossem percebidas como algo negativo. Assim no Leste Europeu, como na Ásia, na África e não tarda, também será na América Latina, quando a tendência mundial a rebelião convulsionar este lado do Atlântico. Isto já é inevitável, dado que alguém precisará pagar a conta da “recessão democrática” e nesse caso, os latinos sempre terão prioridade em relação a norte-americanos e europeus. Finalmente, a recessão econômica é o passo seguinte à “recessão democrática”.
Longe de ser lamentada, a crise do regime deve ser celebrada. Após os asiáticos e eslavos, os africanos estão expondo para as vanguardas operárias, os movimentos camponeses e estudantes em todo o mundo, que seus piores opressores estão em franco declínio. A cartada do identitarismo, como se evidenciou no último período, será o truque para confundir as forças da esquerda, que deve rejeitar esta patacoada ideológica e concentrar forças para enfrentar o inimigo fundamental: o imperialismo, que está em seu momento de maior fraqueza em décadas, mas ainda precisa ser derrotado e de maneira definitiva.