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Acusado por Deus e o mundo

Dani Alves prova sua inocência

Suposto contrabando de cigarros era a peça que faltava para esclarecer a questão

Daniel Alves da Silva, filho de dona Lúcia e seu Domingos, é hoje uma das mais de 50 mil almas aprisionadas pela Justiça espanhola. O rapaz, que nasceu no sertão da Bahia e acordava às quatro da manhã para ajudar o pai a arar a terra, é conhecido no mundo inteiro apenas por sua forma abreviada: Daniel Alves, um dos mais espetaculares laterais vistos nas últimas décadas, dono da maior quantidade de troféus que qualquer outro jogador na história.

Nosso craque está sendo acusado de ter relações sexuais não consensuais com uma mulher no banheiro de uma boate. Ele de fato estuprou a moça? Não sei e, francamente, não me interessa, assim como não deveria interessar ao resto da humanidade. Não sou juiz, nem pretendo jamais sê-lo, nem guardo qualquer simpatia pelos nazistas de toga que passam o dia condenando vidas inteiras ao inferno.

Para quem não é juiz, por outro lado, está provada a completa inocência do lateral. Inocência, leia-se, não perante os carniceiros togados, para quem ninguém é inocente, mas sim no seu sentido mais comumente usado. Isto é, nosso craque é um bobo, uma pessoa ingênua, que ainda não entendeu que não faz parte do mundo do qual acha que faz parte — mundo esse que não merece alguém como Daniel Alves.

Em minha infância, li em algum lugar, durante a era de ouro de Ronaldinho Gaúcho, que o “inho” de seu apelido era perfeito porque destacava a meninice e a irreverência de seu futebol, em contraste com a brutalidade e a maldade dos seus adversários. Não por acaso, o próprio Ronaldinho, como todo brasileiro humilde que se torna milionário graças ao futebol, provaria ser também um ingênuo, tendo sido provavelmente o único brasileiro na história a ser preso com um passaporte falso no… Paraguai!

O mesmo pode ser dito de Daniel Alves, com seu jeito leve de jogar futebol e, ao mesmo tempo, sua incapacidade de detectar a malícia alheia. Em determinado tempo da carreira, passou a se chamar Dani Alves — até nisso foi infeliz, ao não ter um nome que permita o diminutivo. Se “Danielzinho” é muito infantil, que seja, então, Dani Alves a referência à sua ingenuidade.

Para demonstrar a inocência do jogador, imaginemos o pior dos casos — isto é, que tudo aquilo que a imprensa capitalista e a defesa da moça dizem são verdade. Segundo eles, o estupro teria acontecido porque Dani seria um homem mau, sem escrúpulos, machista, incapaz de controlar seus impulsos e que teria, portanto, se aproveitado de uma situação para forçar o coito com a moça. Mas quem é ela? Como ela chegou até Dani Alves? Como de fato tudo aconteceu?

A identidade da moça não foi divulgada até hoje. No entanto, é fácil determinar de que extrato social faz parte: ela nem seria uma pessoa pobre, por estar em uma boate de luxo como aquela, nem também seria uma pessoa rica, visto que não estava na parte VIP da casa, que custa aproximadamente 60 euros por pessoa (R$339). Segundo a própria imprensa, ela e suas amigas foram convidadas para a área VIP por alguns mexicanos que lá estavam.

As “presas” de Daniel Alves eram, portanto, pobres coitadas à procura de alguma vantagem — que poderia ir desde o ingresso na área VIP ao consumo de bebidas ou, quem sabe, um programa sexual que lhes permitisse benesses futuras. Não foram parar lá por acaso, mas sim porque já estavam à procura de quem pudesse lhes bancar. São notórios os casos das mulheres que se aproveitam de ocasiões como essas para “fisgar” jogadores de futebol e que, logo depois, aparecem extorquindo-os ou mesmo forçando uma gravidez.

E é aí que entra a primeira demonstração de inocência de Daniel Alves. Por tornar-se rico, acabou acreditando que era tão “VIP” quanto o executivo espanhol sentado à mesa à frente. Que, como o dinheiro compra tudo, compraria também a satisfação da jovenzinha em abrir as pernas para ele.

Sabe-se lá por quê, a relação não aconteceu “naturalmente”. Daniel Alves não queria pagar o preço exigido, as moças perderam o interesse, enfim, qualquer coisa pode ter acontecido. Eis então que Daniel Alves resolveu forçar seu membro à moça.

Mais uma vez, agiu com ingenuidade. Pensou ele: “os ricos de Barcelona todos têm o que desejam, seja pelo amor ou pela dor”. Mas não se deu conta de que os verdadeiros ricos de Barcelona já fazem do estupro um ofício e já desenvolveram uma indústria com empregados e divisão racional do trabalho. O inocente Daniel Alves inventou de estuprar a garota sozinha, sem ninguém que a amarrasse. O inocente Daniel Alves inventou de deixar a mulher ir embora, sem que nenhum de seus criados a espancasse. E mais importante: o inocente Daniel Alves não mandou ninguém ir atrás da moça, presenteá-la com uma pensão vitalícia extragovernamental e ameaçá-la assombrosamente.

Estourou o escândalo. E nosso craque, confiante de que ninguém iria levar a sério acusações contra ele, tão poderoso, acreditou piamente nos seus advogados, que, de forma muito suspeita, permitiram que voltasse para a Espanha, onde seria preso em uma emboscada da polícia.

Mas Dani Alves continuou a confiar nos advogados, pois ele não era “doutor” como eles. O que um roceiro do interior da Bahia saberia sobre as leis? E foi orientado a fazer todo tipo de lambança. A toda hora, surgia, na imprensa, uma prova que supostamente “contradizia” Dani Alves. Mas o que Dani Alves dizia já não era mais o que ele de fato queria dizer, mas sim o que os advogados lhe orientaram a dizer, em um caso de incompetência que mais cheira a sabotagem. Tanto que a família logo manifestou o interesse em demitir a defesa.

Dani Alves, que até ontem achava que era rei, agora via que era só mais um pretinho sujo, por quem ninguém irá defender do “racismo estrutural”. Dos 43 pódios, despencou para o inferno, onde perdeu a liberdade, sua carreira e sua glória. Mas ainda tinha a esposa. “Mulher de homem rico suporta traição”, pensou ele, lembrando de Hillary Clinton. Mas ele esqueceu que seu sobrenome não era Clinton, e sim, cada vez mais, Silva, e acabou se vendo, para a sua surpresa, escrevendo uma cartinha em letra de forma em que lamenta pelo divórcio.

Chegamos enfim à última prova de sua inocência, que surgiu na semana passada. Dani Alves foi pego em um esquema de contrabando de cigarros para dentro da cadeia. Segundo a imprensa, o jogador conseguiria os narcóticos entregando camisas autografadas a um preso em regime semiaberto. O jornal Metrópoles, um dos milhares de inimigos dos inocentes, logo disse: “Esse episódio envolvendo cigarros, no entanto, pode complicar ainda mais a situação do jogador brasileiro, que está preso desde o dia 20 de janeiro. Se ficar comprovado que ele se beneficia de alguma forma desse esquema, poderá sofrer novas acusações da Justiça espanhola”.

Se é fato que Dani Alves montou esse esquema, só merece nosso aplauso pela criatividade do brasileiro sempre conseguir driblar as dificuldades. No entanto, ser pego com meia dúzia de cigarros, em um mundo onde presos importam armas, telefones celulares e até explosivos sem serem pegos, ainda mais em um momento em que está tentando reverter uma prisão provisória, é mais uma demonstração de sua ingenuidade.

No final do Auto da Compadecida, Ariano Suassuna decide absolver João Grilo, um brasileiro tão ingênuo como Dani Alves. As inúmeras acusações contra o personagem, que pesava mais que a ficha corrida de adúlteros e bandidos, foram perdoadas porque Maria se compadeceu de sua vida miserável. Não só João Grilo, mas todos os leitores que acompanhavam a história torciam desesperadamente por seu perdão. Nada haveria de ser mais injusto que aquela criatura, maltratada por todos os lados, ardesse para sempre no inferno.

Nosso craque é o João Grilo da vida real. Todo mundo que tem coração deveria absolver Daniel Alves.

* A opinião dos colunistas não expressa, necessariamente, a opinião deste Diário

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