No dia 20 de junho de 2023, juiz de primeira instância do Tribunal de Justiça do Distrito Federal proferiu decisão liminar determinando a censura da Revista Piauí.
A censura recaiu sobre a matéria “O cupinzeiro”, através da qual foi exposto como o programa Mais Médicos foi desmantelado pelo governo Bolsonaro, a fim de ser substituído pelo programa Médicos pelo Brasil, cuja condução ficaria a encargo da Adaps (Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde).
Na matéria, denunciou-se como a agência serviu como cabide de empregos (inclusive através de nepotismo), sendo palco de casos de assédio moral, irregularidades administrativas e malversação de verba pública. A fim de ilustrar essas irregularidades, o jornalista que a redigiu mencionou os nomes de um casal que teria assumido bons cargos através de nepotismo. Ação em que se pediu a censura foi movida pelo casal.
Na decisão, que determinou a censura, foi decidido que a revista Piauí deveria remover os nomes da matéria publicada online, e determinar o recolhimento de todos os exemplares físicos, que foram distribuídos em mais de cinco mil pontos de venda pelo país (segundo informações do órgão de imprensa).
A revista recorreu. Contudo, a decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do DF. Na nova decisão, o TJDF entendeu que se a decisão liminar fosse revertida quando do julgamento do mérito da ação, as medidas tomadas (inclusive o recolhimento dos milhares de exemplares físicos) seria “facilmente reversível”. Um absurdo!
Chama atenção o fato de que a Revista Piauí é uma publicação da Folha de São Paulo, através da qual esse jornal golpista tenta passar uma imagem de progressistas.
Nesse sentido, cumpre relembrar que a golpista Folha defende com unhas e dentes a política de censura em vigor no Brasil atualmente, tanto a censura vinculada ao identitarismo, quanto a censura sobre questões políticas mais gerais, tais como a pandemia, as vacinas (sob a máscara de defesa da ciência); as urnas eletrônicas, os anti-democráticos TSE e STF e as eleições (sob a justificativa cínica de defesa da democracia). O jornal frequentemente apoia Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
As críticas eventualmente feitas pela Folha ao ministro do STF, em geral, não são uma defesa consequente da liberdade de expressão. Resumem-se a meros alertas de que Alexandre de Moraes exagera na dose da censura, algo que pode desencadear uma mobilização popular contra a política de censura da burguesia e do STF, desmoralizando o ministro e os inquéritos conduzidos por ele (em especial o da Fake News, número 4.781/2019), de forma semelhante ao que aconteceu com Sérgio Moro e a Lava Jato. Por conseguinte, uma atuação temerária do ministro do STF poderia frustrar a política de censura do imperialismo no Brasil, exercida com a finalidade de melhor controlar o regime político.
No mesmo sentido, o jornal golpista sempre defende a política repressora de Flávio Dino, que desde quando assumiu o Ministério da Justiça, vêm sendo um dos pivôs das violações dos direitos democráticos da população brasileira, em especial o da liberdade de expressão e manifestação do pensamento. Quem não se lembra da sua recente cruzada contra as redes sociais, a fim de que as mesmas tomem a iniciativa de censurar e vigiar seus usuários? Sua defesa do PL nº 2.630/2020 (PL das Fake News)? E sua mais recente tentativa de censurar e tornar ilegal as manifestações em atos públicos (aproveitando-se da fala de Eduardo Bolsonaro)? A Folha apoia tudo isto.
É importante frisar esse fato, por dois motivos principais.
O primeiro: se a política de censura já está atingindo um órgão da imprensa burguesa, um órgão representante dos interesses do imperialismo, fica claro que a censura já existe no Brasil e está fugindo do controle. Não se limita mais à esquerda e a elementos da extrema-direita.
É inegável que proibir uma matéria jornalística é censura. O caso mais clássico. Não há outra palavra para descrever. E o pior, a decisão foi proferida por um juiz de primeira instância, ou seja, o patamar mais baixo da magistratura.
Então, da mesma forma que o caso é um exemplo gritante de censura, é também um exemplo do absurdo poder que se concentra nas mãos dos juízes.
Tudo isto mostra que o caminho para uma ditadura aberta já está sendo pavimentado. Aliás, já vem sendo pavimentado há alguns anos, inclusive com a contribuição entusiasmada da maior parte da esquerda.
E aqui se chega ao segundo ponto: a Folha é defensora ávida da censura. Agora, essa política já se volta contra ela. É claro, sendo um importante órgão de imprensa da burguesia, a censura não afetará tanto as atividades do jornal. Em uma ditadura aberta da burguesia, a folha tende a sobreviver.
Contudo, e a esquerda? Tendo pavimentado o caminho para um regime de censura, quando esse se voltar sistematicamente contra os partidos e demais organizações dos trabalhadores, a tendência é que sejam esmagados, desmantelados.
Quando o Estado burguês passar a aplicar a censura de forma sistemática contra a esquerda, não adiantará reclamar para juízes, pois, como se vê, estes são um dos principais agentes da censura.
A única solução será recorrer à mobilização revolucionária dos trabalhadores.
Assim, a esquerda deve, imediatamente, parar de alimentar o monstro que irá, inevitavelmente, devorá-la. É necessário abandonar por completo a política de censura (em especial a política identitária) e redirecionar toda sua força e recursos à organização e mobilização dos trabalhadores, no sentido da defesa incondicional da liberdade de expressão e demais direitos democráticos.