Na última quinta-feira (26), o Congresso norte-americano aprovou por unanimidade uma resolução condenando “grupos estudantis pró-Hamas e anti-Israel”. Foi realizada uma votação por voz, na qual os senadores são convocados pelo presidente da Casa a se posicionarem a favor ou contra a resolução. A medida é reservada a questões de unanimidade, para rápida aprovação, expectativa que se confirmou com a ausência de protestos contra a proposta.
A resolução “denuncia a retórica de grupos de estudantes anti-Israel e pró-Hamas como antissemitas, repugnantes e moralmente desprezíveis por simpatizarem com a violência genocida contra o Estado de Israel e por colocarem em risco a segurança física de americanos judeus nos Estados Unidos”. Além disso, reforça o direito de Israel de existir; apoia os judeus norte-americanos, como se protestos contra o genocídio em Gaza e em favor da resistência palestina os ameaçasse; e “encoraja os Estados Unidos a apoiar total e completamente Israel e seu direito de existir e se defender”.
Que o Senado norte-americano aprovasse uma medida reacionária como essa não é surpreendente. A surpresa deve-se à unanimidade, contando com o voto do único senador eleito pelo bloco de parlamentares progressistas do Partido Democrata, conhecido como Congressional Progressive Caucus, ou Bancada Progressista do Congresso, numa tradução livre.
O senador em questão é Bernie Sanders, que se orgulha de sua “independência” em relação à ditadura bipartidária norte-americana. Finalmente, Sanders foi eleito em seu estado, Vermont, sem estar ligado a nenhum dos grandes partidos norte-americanos. Essa independência nunca existiu de fato, mas criou-se em 2016 uma grande ilusão em torno da pré-candidatura de Sanders à presidência dentro do Partido Democrata. Esse processo certamente abriu uma crise dentro desse importante pilar do regime político norte-americano, assim como Donald Trump o fez pela direita no Partido Republicano, mas após sua derrota, passo a passo, Sanders revelou-se como um bom e leal soldado do imperialismo.
Na questão palestina, nessa última semana, suas capitulações atingiram seu ponto mais alto. Ficou evidente que sua colaboração com o governo reacionário de Joe Biden vai muito além de uma aliança contra o “fascismo” de Trump.
Desde o dia 7, quando se iniciou a Operação Dilúvio de Al Aqsa, Sanders já desmoralizava seus apoiadores com seu apoio firme a Israel, muito mais firme que a sua defesa de um sistema de saúde público norte-americano, uma de suas principais bandeiras. Antes mesmo de assinar embaixo da supressão de protestos populares de estudantes universitários de esquerda (setor no qual se concentra seu eleitorado!), Sanders já dizia:
“Ouvi atentamente o que o senador [Rick] Scott e outros disseram sobre o ato bárbaro cometido pelo Hamas contra homens, mulheres e crianças inocentes, o abate com metralhadoras de jovens que estavam apenas participando de um baile, o assassinato de bebês. Esse é um ato horrível, horrível, que precipita uma crise mundial, e os Estados Unidos da América, todos nós, condenamos esse ato. E, na minha opinião, o Estado de Israel tem o direito absoluto de se defender contra o Hamas e o terrorismo em geral. Não há debate sobre isso” (Bernie Sanders Speaks on the Israel-Hamas Conflict Transcript, Rev, 19/10/2023).
Após essa enfática introdução, que repete as mentiras da imprensa capitalista que tanto sabotaram Sanders, o senador pede para que o estado sionista, em seu “direito absoluto” e indiscutível de autodefesa, não atacassem as “centenas e centenas de milhares de homens, mulheres e crianças inocentes em Gaza”. Gostaríamos de saber como seria possível permitir o ataque a Gaza, uma das regiões mais densamente povoadas do planeta, sem ferir inocentes ou destruir suas moradias. O cinismo da proposta de Sanders nos agride mais do que a sanha assassina dos senadores reacionários que abertamente defendem o genocídio. Pelo menos são honestos em sua intenção!
No dia 25, um dia antes de acompanhar o Senado na resolução absurda contra a luta palestina e seus apoiadores nos Estados Unidos, Sanders voltou ao palanque. Novamente sofremos com uma longa introdução, idêntica em conteúdo à imprensa imperialista, e fomos agraciados com o quê? Mais mentiras.
“Israel tem o direito de se defender e ir atrás do Hamas. Mas os palestinos inocentes também têm direito à vida, à segurança e à paz. Lembre-se de que a última eleição realizada em Gaza foi em 2006, quando a maioria das pessoas em Gaza ainda não havia nascido ou não podia votar. Mesmo assim, uma minoria votou no Hamas. O Hamas é uma organização autoritária que não representa necessariamente uma ampla parcela do povo palestino, e não devemos confundir todos os palestinos com essa organização terrorista” (NEWS: Sanders Calls for Humanitarian Pause in Israel and Gaza, portal oficial de Bernie Sanders, 25/10/2023).
O Hamas venceu as eleições de 2006 não só em Gaza mas também na Cisjordânia. Se novas eleições não aconteceram após aquele ano, foi justamente porque os fantoches imperialistas da Autoridade Nacional Palestina não só não entregaram o poder ao Hamas na Cisjordânia como impediram novas eleições, obviamente a mando de “Israel”.
Sanders, que tem cidadania israelense e nos anos 1960 já foi ao país por sua ideologia “socialista”, trabalhar nos kibutz, já teve posições pró-sionistas como essas, por exemplo, em 2014, na ocasião de brutais ataques de Israel. O senador de Vermont também apoiou incondicionalmente o auxílio norte-americano ao governo títere nazista ucraniano no embate contra a Rússia. Nunca recebeu, por outro lado, um aceno a suas propostas reformistas. Faz isso não para barganhar, mas por alinhamento ideológico com a política imperialista dos Estados Unidos.