Na ocasião das festas de São João, que utilizam, tradicionalmente, fogos de artifício, estalinhos e outros objetos que produzem sons altos, revivemos, aqui, uma polêmica acerca da imposição de leis contrárias à tradição do povo para, supostamente, beneficiar a parcela da população que é autista.
Nesse sentido, este Diário conversou com uma terapeuta ocupacional especialista no assunto que, finalmente, mostra que proibir fogos de artifício e afins não é a solução. Confira:
Pessoas dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA) costumeiramente possuem um perfil sensorial que pode afetar o processamento e a resposta aos estímulos sensoriais vindos do ambiente, gerando uma sobrecarga sensorial. Nesse sentido, estímulos sensoriais externos que para a maioria das pessoas são aceitáveis podem ser incômodos e ou desconfortáveis para pessoas com TEA.
Dentre os possíveis estímulos sensoriais, podemos citar sons e ruídos, que, em conjunto com o perfil sensorial de hipersensibilidade auditiva (frequente em pessoas com TEA), faz com que tenham uma hiper resposta, ocasionando em irritação e prejuízos na participação social.
Diante dessa questão, um assunto frequentemente levantado é o uso de fogos de artifícios em festas comemorativas e o impacto do uso dos mesmos no conforto e qualidade de vida das pessoas com TEA. Com o argumento de solução para o problema, tentaram a proibição do uso de fogos de artifícios em eventos festivos. Em resposta, tivemos uma baixa adesão da população visto se tratar de uma abordagem imposta e restritiva.
Cabe destacar que pessoas com hipersensibilidade auditiva sofrem com a questão não apenas nos eventos de final de ano, mas sim de forma mais ampla e diária, uma vez que o mundo natural e social é repleto de sons, barulhos e ruídos de difícil controle. Podemos citar o próprio ambiente doméstico, as escolas, transportes públicos, eventos coletivos em geral etc.
O que deve ser amplamente discutido e disseminado é a necessidade de atendimentos gratuitos voltados para pessoas com TEA, garantindo o acesso a tratamento continuado e sistemático com equipe multiprofissional, incluindo terapeuta ocupacional capacitado em integração sensorial. Alinhando a isso, existe a necessidade de propiciar o acesso a recursos adaptados, como abafadores de ruídos, instrumento que, junto ao tratamento especializado do terapeuta ocupacional, é capaz de amenizar os impactos da sobrecarga sensorial. Desta forma, agiremos na questão central do problema, que é da ordem da saúde, e não da imposição de leis repressoras.