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América Latina

Argentina, Brasil e o “efeito Orloff”

Vitória esmagadora da direita argentina nas prévias

A esquerda, incansavelmente otimista, se surpreendeu com os resultados das prévias argentinas, realizadas com o intuito de estabelecer uma cláusula de barreira para as eleições de fato e que, em geral, servem de um retrato bem fiel da eleição futura. A situação pode, é claro, mudar, no entanto, o observado foi uma vitória esmagadora da direita: juntando a direita macrista à direita capitaneada por Milei, os direitistas tiveram quase 70% dos votos; ou seja, a ideia de que algum candidato remotamente esquerdista possa ganhar essa eleição é quase zero. O único problema agora é saber como será a disputa entre a direita e a direita.

O peronismo teve somente 20% dos votos. Saiu destas prévias praticamente derrotado. A esquerda dita revolucionária teve pouco mais de 1,5%: conseguiu passar pela cláusula de barreira nacional, mas o mesmo não é verdade nas diversas províncias. A esquerda que seria uma espécie de fusão entre o PSOL e o PT, um PT mais esquerdista, retrocedeu na eleição. O vencedor destas eleições é Milei, que será uma espécie de bomba atômica econômica, caso eleito. Ele é o candidato ultraneoliberal: propõe acabar com todos os direitos sociais dos trabalhadores, dolarizar a economia, etc. A Argentina viraria literalmente uma espécie de apêndice do Banco Central norte-americano, e os trabalhadores perderiam tudo: o que resta de aposentadoria, direitos trabalhistas e assim por diante. Isso mostra o tamanho da confusão política que se instaurou na Argentina. Ele obteve mais de 30% dos votos com esse programa político, muito embora não tenha concentrado esforços em propagandear essa verdadeira limpeza das conquistas sociais e econômicas dos trabalhadores.

A primeira coisa a se entender é que o que está acontecendo na Argentina consiste num produto do desespero da população. A vitória de Milei é a vitória do desespero: o país está sendo economicamente destruído pelo imperialismo. Estamos na mesma fila: o Brasil tem mais gordura para queimar que os argentinos, mas é o mesmo plano de voo. Em algum momento, vamos chegar lá, e estamos no momento a meio do caminho.

O Brasil, com a política neoliberal a partir de FHC, tem mais de 50 milhões de pessoas no Bolsa Família. A miserabilidade se espalhou e cresce a cada dia; as indústrias se encontram em franco retrocesso. Na Argentina, o processo se deu de forma mais rápida. Ela perdeu uma parte extraordinariamente grande, na época do governo Menem, de suas indústrias, a privatização afetou vários setores, os trabalhadores perderam vários direitos. A situação na Argentina encontra-se em estágio mais avançado de desagregação, mas o que é importante destacar é que a mesma tendência está presente na realidade brasileira.

Por que devemos ter isso em mente? No Brasil, chamam a vitória de Lula de vitória contra o fascismo. Não tem fascismo algum de fato. Dizem que, com o arcabouço fiscal, Lula colocou o Brasil na rota da prosperidade. Isso não corresponde à realidade, porém. Essa política não vai tirar o Brasil do caminho do abismo. É isso que é preciso entender. E o governo Lula, nesse sentido, é um retrato do problema que nós temos, porque ele não consegue sair do impasse. Lula fala em reindustrialização e em desenvolvimento, mas os obstáculos para se alcançar isso têm se imposto na situação. Se nada acontecer, e o governo Lula for incapaz de resolver minimamente os problemas colocados, vamos em direção à Argentina.

A primeira coisa que devemos em mente é o seguinte: se não forem tomadas medidas muito profundas, se não se encaminharem, ainda que parcialmente, as resoluções dos problemas mais prementes do povo, o que está acontecendo na Argentina é o nosso futuro. A segunda questão é o fracasso do peronismo. No Brasil, aconteceu um processo político semelhante ao da Argentina. No Brasil foi o PT que chegou ao governo. Na Argentina, o kirchnerismo governou 4 mandatos e sofreu um baque, com uma campanha de características golpistas da direita, perdendo a eleição. Na eleição seguinte escolheram um direitista do peronismo, Alberto Fernández, colocando-o no governo e deixando Cristina Kirchner como vice. O governo Fernandez não conseguiu fazer nada. Adotou uma política de meias-medidas, compactuou com o imperialismo e, ao final, chegamos onde estamos agora. O peronismo, agora, é carta fora do baralho, de tal forma que só estão no páreo os dois grupos de direita.

O PT, se permanecer no caminho do impasse e da paralisia, da política de meias-medidas, seguirá pelo mesmo caminho. A política da burguesia, na melhor das hipóteses, é não deixar o Lula ter um segundo mandato. Enquanto isso, parece que a esquerda está vivendo em um mundo cor-de-rosa. Através de Flávio Dino, Ministro da Justiça do atual governo, desenvolve-se uma repressão intensa e uma ofensiva contra os direitos democráticos da população. O Ministério da Economia, com Haddad à frente, adota medidas antipopulares, como taxações várias. Acaba-se de se anunciar a subida no preço do diesel. Seguindo essa linha, o que se avizinha é um desastre anunciado. O mesmo desastre que se abateu sobre o peronismo. Um governo de meias-medidas, que não enfrenta os problemas fundamentais numa época de crise crescente, ruma para o desastre. O fracasso do governo peronista o confirma.

Em terceiro lugar, há a questão acerca das semelhanças ou diferenças entre Milei e Bolsonaro. É comum a afirmação de que Milei é um Bolsonaro argentino. Mas isso não é verdade. O equivalente de Bolsonaro na Argentina é Macri, e não Milei. Não basta fazer comparações superficiais, é preciso comparar o processo político também. Na Argentina, o peronismo perdeu a eleição para Macri porque houve ali uma verdadeira campanha no sentido de um golpe de Estado, uma campanha que a esquerda argentina, tão aloprada quanto a brasileira, nem registrou o fato. Fruto de uma campanha golpista, similar à que derrubou Dilma Rousseff e colou Lula na cadeia, o governo Macri foi muito mais direitista do que o governo Bolsonaro.

Milei já é resultado do fracasso de todo esse processo. A Argentina está na frente do Brasil, não atrás. Milei pertence a uma etapa do processo posterior à etapa de Bolsonaro no Brasil. Ele é uma espécie “Super Bolsonaro”.

Se aqueles que apoiam o governo Lula no Brasil acham que, com essa lambança que está sendo feita pelo STF, o bolsonarismo vai acabar, estão profundamente enganados. Não se elimina um problema político, fruto da situação política brasileira, com um truque na justiça. Torce-se para que ele seja preso como se essa prisão resolvesse os problemas fundamentais do país. Pelo contrário, essa política vai levar o Brasil para o desastre.

A eleição argentina é um aviso: “se irmos por esse caminho, não vai dar certo”. É preciso abrir a discussão com todos os setores de esquerda, não se pode ficar em compasso esperando que Lula faça alguma coisa para a qual nem base parlamentar ele tem. O problema da luta política, da mobilização popular, é fundamental. A eleição argentina mostra isto de forma cabal: o peronismo, que seria uma espécie de esquerda nacionalista, fracassou por causa da sua política estritamente institucional, e a esquerda dita revolucionária fracassou pela sua política estritamente parlamentar.

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