Por quê estou vendo anúncios no DCO?

Presidente da COP 28

Al Jaber: “não há ciência” que comprove mudanças climáticas

Em transmissão ao vivo, árabe se opôs à erradicação imediata da produção de petróleo e gás

“Mostre-me um caminho para a eliminação do combustível fóssil que permita o desenvolvimento socioeconômico, sem, com isso, levar o mundo de volta às cavernas”. Assim o sultão Al Jaber, atual presidente da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 28), desafiou a ex-presidente irlandesa Mary Robinson. A declaração de Al Jaber aconteceu durante uma longa transmissão ao vivo, de mais de sete horas de duração, promovida pelo think tank SHE Changes Climate, que, por sua vez, é financiado por fundações britânicas, como a Esmée Fairbairn Foundation e a The Kreitman Foundation.

Al Jaber apenas participou dos minutos finais da transmissão, que foram reservados justamente para uma entrevista por telefone com ele. A transmissão, afinal, aconteceu no dia 21 de novembro, poucos dias antes do início da Conferência, de tal forma que o evento da SHE Changes Climate, que havia sido assistido por menos de 4 mil pessoas até o fechamento desta edição, teve a participação de Al Jaber como o maior destaque.

“Bem-vindo e muito obrigado, Excelência, por se juntar a neste momento. Não conseguimos sequer imaginar o quanto a sua agenda deve estar ocupada”.

Nos momentos seguintes, o clima permaneceu amistoso, com o sultão respondendo a perguntas sobre a relação entre as supostas “mudanças climáticas” e a causa das mulheres. Tudo mudou, contudo, quando Mary Robinson exigiu “urgência” de Al Jaber na erradicação da produção de combustíveis fósseis. “Estou muito feliz que você aceitou nosso convite que fiz a você em Pequim”, começou a ex-presidente da Irlanda. “Eu acho que a mensagem mais urgente à que chegamos durante esta transmissão inteira, que eu ouvi a cada sessão, é que estamos em uma crise total que está machucando mais mulheres que qualquer um. Mulheres, crianças, idosos, pessoas com deficiência e os mais vulneráveis. Isso acontece porque ainda não nos comprometemos a eliminar gradualmente os combustíveis fósseis, mas essa é uma decisão que pode ser tomada na COP 28 sob a sua presidência”.

A ex-presidente da Irlanda foi além e falou: “você é o presidente da Companhia de Petróleo Nacional de Abu Dabi. Você poderia fazer isso com maior credibilidade, ao dizer: ‘eu reconheço que nós precisamos abandonar gradualmente os combustíveis fósseis, com uma transição justa para os trabalhadores e suas comunidades, e fazer uma transição justa para uma energia renovável, acessível e limpa’. Isso não acontecerá da noite para o dia, como você mencionou; será gradual, mas é urgente. Não ouvi a palavra ‘urgente’ com ênfase suficiente em sua voz”.

O sultão, de início, respondeu com bom humor, afirmando que “não era um político”, e sim um “homem de negócios”; portanto, não seria “bom com as palavras”. Mary Robinson, então, insistiu para que o presidente da COP 28 assumisse um compromisso imediato com o abandono dos combustíveis fósseis, acusando sua empresa de estar “investindo muito em combustíveis fósseis, o que vai prejudicar as mulheres”. Al Jaber, então, reagiu, afirmando que Mary Robinson estaria lendo a imprensa de seu próprio país, que seria “parcial” e “errada” e disparou:

“Aceitei vir a esta reunião para ter uma conversa sóbria e madura. Eu refuto qualquer discussão que seja alarmista. Estou aqui de forma factual e respeito a ciência. Não há ciência ou cenário que afirme que a eliminação gradual dos combustíveis fósseis é o que atingirá a meta de diminuição 1,5º C”.

A declaração de que não haveria evidência científica vinculando a produção de combustíveis fósseis às chamadas “mudanças climáticas” não teve grande repercussão de imediato, dado o tamanho do evento no qual participaram Mary Robinson e Al Jaber. Contudo, após um artigo publicado pelo jornal britânico The Guardian contendo as declarações de Al Jaber, os principais veículos da imprensa mundial passaram a reportar o acontecimento, apresentando a posição do sultão como contrária à de “especialistas” na questão do clima. Entre os entrevistados pelo jornal britânico, está Sir David King, presidente do Climate Crisis Advisory Group e ex-conselheiro do Reino Unido, que disse:

“É incrivelmente preocupante e surpreendente ouvir o presidente da COP 28 defender o uso de combustíveis fósseis. É inegável que, para limitar o aquecimento global a 1,5ª C, todos devemos reduzir rapidamente as emissões de carbono e eliminar gradualmente o uso de combustíveis fósseis até 2035, no mais tardar. A alternativa é um futuro incontrolável para a humanidade”.

A reportagem do The Guardian foi suficiente para que Al Jaber fosse tachado de “negacionista” por setores da imprensa e de grupos ambientalistas. Foi o caso do jornal Folha de S. Paulo, que publicou o artigo “Países discutem declínio do petróleo sob revelação de negacionismo científico da presidência da COP28”, e do portal Mídia Ninja, que assinou o texto “Negacionismo climático: Presidente da COP 28 afirma que a ciência não respalda a eficácia da eliminação de combustíveis fósseis”.

No dia seguinte à publicação da matéria do The Guardian, Al Jaber respondeu a seus críticos publicamente. “A ciência tem sido fundamental para o progresso da minha carreira e, sim, eu respeito a ciência em tudo o que faço” disse o sultão, que também é engenheiro.

Mundo polarizado

A repercussão em torno da declaração de Al Jaber nada tem a ver com uma “crença” na ciência. O “respeito” à ciência já havia, inclusive, sido declarado pelo sultão muito antes da publicação do artigo do The Guardian. Em coletiva de imprensa realizada no dia 30 de novembro, Al Jaber havia dito que seu país, os Emirados Árabes Unidos, “respeita a natureza e reconhece e incorpora a ciência em cada passo dado em qualquer setor em que esteja envolvido”. O sultão ainda diz “reconhecer e valorizar os grandes esforços do IPCC”, que é o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU).

A acusação de “negacionismo” é uma calúnia em todos os sentidos. Nem Al Jaber nega o uso da ciência como parâmetro para a tomada de decisões, nem mesmo nega aquilo que a imprensa costuma apresentar como “ciência”, que são os resultados apresentados pelo IPCC. As acusações contra Al Jaber são, portanto, parte de uma luta política. Na mesma coletiva de imprensa, o sultão afirmou: “não é segredo para vocês. Vocês provavelmente sabem melhor que eu que vivemos em um mundo polarizado. E nós todos sabemos que o nosso tema é afetado por essa polarização. É isso que herdamos nos preparativos da COP 28”.

Segundo Al Jaber, não é possível discutir a questão ambiental, sem levar em conta que o mundo está polarizado. De um lado, estão os países desenvolvidos, como os Estados Unidos, a Alemanha, o Reino Unido e a França. De outro, a esmagadora maioria dos países do mundo. A polarização se expressa claramente em termos políticos e militares: neste momento, por exemplo, Estados Unidos, França e Reino Unido estão todos unidos em uma guerra contra a Rússia, a China, a Bielorrússia e o Cazaquistão. Como essa polarização se expressa, por sua vez, na questão ambiental?

Para os países desenvolvidos, o problema central neste momento é, em nome de uma suposta preocupação com o meio ambiente, constranger os países atrasados a diminuir a sua produção de recursos naturais. Hoje em dia, dos quinze maiores produtores de petróleo do mundo, apenas os Estados Unidos e a Noruega são países desenvolvidos. E entre os países dessa lista, vários têm uma posição francamente hostil aos Estados Unidos, como é o caso da Venezuela, da China, da Rússia e do Irã. O fato de que a produção de recursos naturais está cada dia mais passando para as mãos dos países atrasados fará com que, em um futuro próximo, a indústria dos países desenvolvidos seja refém dos países atrasados, o que levaria a economia dos primeiros a um colapso.

A denúncia dos interesses do imperialismo ainda aparece de maneira tímida no debate sobre a questão ambiental. No entanto, há alguns meses, o presidente Lula, que governa um dos países mais ricos em recursos naturais do planeta, afirmou que haveria um “neocolonialismo verde” – isto é, uma tentativa dos países desenvolvidos de estabelecer uma tutela sobre as riquezas dos países atrasados, valendo-se de uma suposta proteção do meio ambiente.

Durante seu entrevero com Mary Robinson, o presidente da COP 28 também explicitou a contradição entre o que dizem e o que fazem os países desenvolvidos:

“O mundo vai continuar precisando de fontes de energia, e nós somos os únicos no mundo que têm descarbonizado seu próprio petróleo e seu próprio gás. (…) Eu não ouço vocês falarem com os noruegueses da mesma forma como falam conosco”.

Em outro momento, Al Jaber insinuou que os países desenvolvidos estavam constrangendo países como os Emirados Árabes a “liderar” o abandono de recursos fósseis porque eles próprios não queriam abandonar:

“Eu me certificarei de colocar esse item em nossa agenda e irei adotá-lo. No entanto, sobre alguém ‘assumir a liderança’, você é de um país desenvolvido, você vem de um país desenvolvido. Eu tenho certeza que os países desenvolvidos podem liderar esse processo, como sempre fizeram. E poderiam liderar pelo exemplo”.

A posição do governo brasileiro, diante da discussão sobre o meio ambiente, tem sido a de culpar os próprios países desenvolvidos pelas tragédias ambientais que tanto alardeiam para justificar o seu “neocolonialismo verde”. Com isso, o governo Lula procura não apenas amenizar a ofensiva do imperialismo contra a produção nacional, mas também forçar os países ricos a financiarem os projetos supostamente favoráveis ao meio ambiente.

Ainda que de maneira muito mais moderada, essa também foi a posição assumida por Al Jaber, conforme expresso em sua coletiva de imprensa de 30 de novembro:

“Precisamos construir uma ponte sobre o abismo entre o Norte e o Sul Global, e a forma de tornar isso possível é fazer com que quem prometeu entregue aquilo que prometeu, e que quem pediu, aja. E aqueles que prometeram fazer melhor uso de seus recursos devem fornecer a infraestrutura necessária, as políticas exigidas, a regulamentação, a capacitação e a oportunidade”.

A posição de Al Jaber, portanto, vai no mesmo sentido da posição dos líderes dos países atrasados. Demonstrando não ter uma posição ideologicamente contrária à “ciência” ou ao “meio ambiente”, mas sim um posição politicamente contrária à erradicação imediata de combustíveis fósseis, o sultão ainda explicou, citando a história do próprio país, que o desenvolvimento proporcionado pelo gás e pelo petróleo, permitiria que os países diversificassem a sua economia futuramente.

“Se você olhar ao redor”, disse o sultão, durante a coletiva de imprensa, “talvez se pergunte: o que permitiu um país com apenas 52 anos ser o que é hoje, com uma infraestrutura avançada, um polo tecnológico, um farol e um catalisador de esperança em muitas áreas e setores, atraindo jovens de todo o mundo para fazer deste lugar o seu lar? O fato de termos embarcado em uma estratégia de diversificação econômica há 20 anos possibilitou que os Emirados Árabes Unidos se tornassem o que são hoje, saindo de uma dependência de uma única fonte de receita para múltiplas fontes de renda, onde hoje o petróleo e o gás representam apenas 29% de nossa receita”.

Outras acusações

A declaração de que não haveria “ciência” que comprovasse o efeito dos combustíveis fósseis nas supostas “mudanças climáticas” terminou sendo apenas um pretexto para uma campanha de pressão sobre Al Jaber. Antes da discussão com a ex-presidente da Irlanda, o sultão havia sido acusado de aproveitar a presença de pessoas de todo o planeta na COP 28 para ampliar seus negócios junto à Companhia de Petróleo de Abu Dabi. Sobre as acusações, o sultão respondeu, durante a coletiva de imprensa de 30 de novembro:

“Serei muito claro, cristalino, para você, para todos na sala e para aqueles que estão online: essas alegações são falsas, não são verdadeiras, são incorretas e não são precisas. É uma tentativa de minar o trabalho da presidência da COP 28. Deixe-me fazer uma pergunta a você: você acha que os Emirados Árabes Unidos ou eu mesmo precisaríamos da COP ou da presidência da COP para estabelecer negócios ou relacionamentos comerciais?”.

A mesma reportagem do The Guardian responsável por divulgar ao mundo a fala de Al Jaber também afirmou que “numerosos comentaristas disseram que revelações negativas ou embaraçosas sobre Al Jaber e a Adnoc visavam aumentar a pressão sobre ele para entregar um forte acordo na COP 28. The Guardian informou recentemente que os campos estatais de petróleo e gás dos Emirados Árabes Unidos funcionaram quase que diariamente apesar de o país ter se comprometido há 20 anos com uma política de zero queima de rotina”.

Se os combustíveis fósseis ou qualquer tipo de ação humana interferem diretamente em eventuais “mudanças climáticas”, é um tema bastante controverso. Há cientistas que afirmam que a interferência humana é decisiva, e há cientistas que afirmam o contrário. No entanto, o que não é controverso, e sim um fato, é que as teses que alegam supostas “mudanças climáticas” estão sendo manipuladas pelos países desenvolvidos para levar adiante uma política nefasta para todos os povos.

Gostou do artigo? Faça uma doação!

Rolar para cima

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Quero saber mais antes de contribuir

 

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.