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Fábio Picchi

Militante do Partido da Causa Operária (PCO). Membro do Blog Internacionalismo e do Coletivo de Tecnologia do Partido da Causa Operária. Programador.

Fazemos nossa história, mas...

Um gigante por acidente

Ao contrário do que diz a intuição, os fundadores do Brasil tinham muito mais ambição do que os dos EUA

Thomas Jefferson

Quem olha a posição dos EUA na economia mundial atual e a compara com a do Brasil, um país de dimensões similares e possivelmente com mais recursos naturais à sua disposição, pode chegar à conclusão apressada de que o nosso País deu errado. Elementos dotados de poucas luzes intelectuais arriscam uma tese: os protestantes que inicialmente povoaram a costa leste dos EUA, dotados de um bravo espírito trabalhador, desenvolveram aquilo que viria a se tornar a principal potência imperialista mundial, enquanto os latinos preguiçosos deram origem à terra do samba e do futebol.

Longe de mim negar a nossa cultura popular. Também não quero rebater a tese do colonizador latino preguiçoso, afinal de contas, nosso maravilhoso curso de História do Brasil ministrado pelo companheiro Rui Costa Pimenta restaurou minuciosamente a imagem dos portugueses que construíram conscientemente na América do Sul um empreendimento de grande vôo, vítima talvez de seu próprio sucesso.

Às vésperas do início do segundo módulo do curso, que começa em junho, gostaria de dedicar esta coluna a rebater a tese de que os colonos norte-americanos construíram a nação que conhecemos hoje graças a seu bravo espírito empreendedor. Nada poderia ser mais distante da realidade.

Entre escrever matérias para Causa Operária, militar e programar computadores, eu tenho achado tempo para ler um livro muito interessante: How to hide an empire (Como esconder um império), do historiador norte-americano Daniel Immerwahr. Nele, o autor busca apresentar como os EUA conseguiram, ao longo de sua história, esconder suas verdadeiras dimensões territoriais até mesmo de sua própria população.

O evento utilizado como gancho para introduzir a tese é o ataque a Pearl Harbor pelos japoneses, no dia 7 de dezembro de 1941. O autor apresenta o discurso de Franklin D. Roosevelt, cheio de rasuras, como evidência da dificuldade que o então presidente norte-americano teve para explicar para sua população porque aquele ataque – “uma data que viverá na infâmia” – implicava o envolvimento dos EUA na Segunda Guerra Mundial. O envio de tropas à Europa não era uma medida popular e Roosevelt precisou explicar que o ataque no Havaí, que na época não era Estado e dificilmente era entendido pelo cidadão norte-americano como parte do território dos EUA, era um ataque contra “solo norte-americano”, assim como o ataque de 11 de setembro de 2001. Semanas antes os japoneses haviam invadido as Filipinas, que também estavam sob a tutela dos EUA, mas a invasão bárbara de Manila contra uma população que via Roosevelt como seu presidente dificilmente seria aceita como justificativa para a entrada na Guerra.

Os EUA, diferentemente de outros grandes impérios da época como a Inglaterra ou a França, timidamente escondiam sua extensão. Exerciam um outro tipo de dominação sobre esses territórios. Sua população não se sentia parte de um grande império que se estendia pelo Caribe e pelo Pacífico. Isso, por si só, já mostra como a posição dos EUA é, na realidade, não apenas uma exceção no desenvolvimento histórico dos países, como também é um acidente. Uma confluência de fatores como o declínio da indústria açucareira, o desenvolvimento do capitalismo e a Revolução Industrial na Inglaterra e o derramamento de parte desse desenvolvimento nos recém-independentes EUA levaram a um crescimento exponencial, tipicamente capitalista, à revelia de seus fundadores.

Thomas Jefferson, revolucionário norte-americano que assina a Declaração de Independência dos EUA,  disse em seus escritos que imaginava que o território compreendido entre o Atlântico e o rio Mississipi – aproximadamente um terço do território atual dos EUA na América do Norte – seria “espaço suficiente para nossos descendentes até a milésima e milésima geração”. O terceiro presidente dos EUA tinha em vista uma América inteiramente controlada por seu país, falando um só idioma, mas isso estava reservado a um futuro muito distante.

Outro fato interessante que me chamou atenção no início do livro foi o combate dos fundadores dos EUA, como Jefferson e George Washington, aos “homens da fronteira” como Daniel Boone, espécie de bandeirantes norte-americanos que se aventuravam para além das fronteiras definidas em busca de novas terras. Digo “espécie” porque Boone, por exemplo, era apenas um camponês pobre que não tinha mais como desenvolver sua atividade e foi levado pelo desespero aos territórios indígenas. Ele chegou a viver pacificamente com os nativos, mas o exemplo que dava ao resto dos norte-americanos gerava repúdio dos governantes do país que não viam com bons olhos o que poderia ser o estopim de um conflito militar ainda maior do que os existentes com os povos indígenas, algo que seria muito custoso para sua economia ainda em desenvolvimento.

O desenvolvimento capitalista na Europa, porém, inundou os EUA com novos Boones e a relação com o antigo dominador trouxe ao país recém-formado novas tecnologias que dariam lugar a um grande desenvolvimento econômico e populacional. Contra a vontade e as expectativas de seus fundadores, os EUA cresceram de forma selvagem e descontrolada, tal como o capitalismo em sua fase nascente. Thomas Malthus, inspirado pelas observações de Washington sobre o crescimento populacional norte-americano, elaborou sua tese de que em breve não haveria mais terra para suprir o crescente número de seres humanos que habitam o planeta. A tese, naturalmente, era tão furada quanto a tese dos EUA que terminava no Mississipi.

Como vimos em nosso curso de história, as fronteiras brasileiras foram definidas há muitos séculos, fruto da bravura dos brasileiros que se aventuram mata adentro nos séculos  XVI e XVII; e da audácia portuguesa que deu início às grandes navegações e montou no Brasil um empreendimento de características capitalistas numa etapa anterior ao desenvolvimento do novo modo de produção. Nos EUA, porém, quase que à revelia de seus fundadores – e certamente contra tudo que os ingleses jamais imaginaram que poderia acontecer naquele território – desenvolveu-se uma potência por acidente, fruto de condições históricas extremamente favoráveis.

Minha tese naturalmente não pretende excluir da história os grandes feitos de figuras como Abraham Lincoln ou dos próprios revolucionários que travaram a guerra de independência contra a Inglaterra. Gostaria apenas de ressaltar primeiramente o papel fundamental das condições materiais do desenvolvimento histórico e, em segundo lugar, o relativo sucesso do projeto idealizado por aqueles que fundaram o Brasil frente ao “fracasso” das previsões de personagens como Jefferson. Como já disse Marx: “os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem.

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