O jornalista e cronista esportivo Armando Nogueira, em crônica escrita à época que Pelé tinha 20 anos, aponta como o Rei foi o que chegou mais perto à perfeição futebolística. Confira:
“[Pelé] tem tais afinidades com futebol que certamente nasceria bola se não tivesse nascido gente. Estas são tintas ligeiras de Pelé, o melhor e mais completo jogador de futebol da atualidade — um supercraque na bolsa do profissionalismo está cotada acima de cem milhões de cruzeiros; um menino que faz a alegria do mundo brincando com uma bola […] Sua vocação de jogador é incomparável e se exprime no campo com a mesma espontaneidade da bola que rola; é tão perfeito no criar como no fazer o gol, no drible, no passe, no chute, na cabeçada. Seja em que circunstância for, Pelé mantém com a bola uma relação de coexistência absolutamente íntima, terna, cordial; por isso é bom goleiro e ótimo goleador; por isso, é capaz de estar, ao mesmo tempo, na concepção e na realização de uma jogada. Seu talento é do tipo esférico como a bola, o seu brinquedo mágico” (Bola na rede, Armando Nogueira, 1974).
“A técnica individual de Pelé não merece só reparo do mais exigente crítico de futebol: ele domina a bola com naturalidade e perfeição, usando qualquer parte do corpo, notadamente os pés e o peito; tem chute potente e certeiro com as duas pernas; dribla com facilidade e grande arte, valendo-se de incrível poder de articulação nos tornozelos, joelhos, cintura e, sobretudo, graças a uma força instintiva, medular, que lhe permite sair criando movimentos novos, irresistíveis, à base de contrapés, falsas hesitações, meneios e desequilíbrios aparentes. Usa as faces exteriores e interiores dos pés tanto para o drible e o chute como para fazer passes de efeito; tem espantosa velocidade de partida e de corrida e se eleva para as cabeçadas com uma elasticidade impressionante e com uma noção de tempo que só se vê nos grandes especialistas dessa jogada (o húngaro Kocsis, por exemplo); tem agilidade felina para recobrar o equilíbrio perdido” (idem.)
“Por fim, Pelé tem uma capacidade quase irreal de infiltrar-se com a bola defesa adentro. Vai como um raio, dando a impressão ao espectador de que está atravessando os corpos dos adversários. Temos ouvido tanta gente querendo descrever as infiltrações de Pelé mais ou menos assim: ‘Ele ia passando por dentro dos outros’. Realmente, o lance é muito rápido e sugere a imagem. O que ocorre, simplesmente, é que ele realiza a ação em alta velocidade e com notável noção do próprio corpo, que lhe assegura o mínimo de tropeços, o máximo de equilíbrio e grande fluência na corrida” (idem.)