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Ric Jones

Parto e identitarismo

Parto, corpo, sexualidade e revolução

É necessário encarar a complexidade das lutas das mulheres contra os poderes estabelecidos que regulam seus corpos e sua autonomia.

Trabalhei como obstetra durante 35 anos e durante todo esse tempo fui ativista e trabalhei em projetos de humanização do nascimento, tanto institucionalmente quanto na minha prática pessoal. O Brasil tem uma importância muito grande no cenário do parto humanizado, e nossas instituições são reconhecidas aqui e no exterior, em especial a ReHuNa – Rede pela Humanização do Parto e Nascimento. Durante os mais de 20 anos em que militei nas organizações de suporte ao Parto Humanizado eu percebi em muitas destas instituições uma vinculação forte com o identitarismo – o que fez com que eu me afastasse de algumas delas por sua conexão com a Fundação Gates, Fundação Ford e a Open Society. Entretanto, minha posição contra o identitarismo e estas instituições nunca me afastou da luta pelos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres e seus filhos, e isso ocorre porque estas lutas não precisam ocorrer em nome de um “corporativismo de gênero”, mas pela via da ética e do humanismo, elementos que estruturam estas lutas que afetam o conjunto da sociedade.

É meu convencimento que o parto humanizado não deve ser defendido em nome da “mulher” tão somente, mas em nome da sociedade como um todo, de cada um nós, e pela proteção da integridade física e emocional de todos que dele participam. O mesmo se pode dizer do racismo, cujo combate não se restringe a beneficiar as comunidades negras, mas a todos que participam dessa sociedade, pela união da classe trabalhadora em torno do que existe de humano em cada um, acima das barreiras raciais.

Um exemplo disso é a minha própria entrada nesta seara da humanização, que ocorreu na condição de pai, há 4 décadas, pelo direito dos companheiros de participarem da gestação e do parto. Já naquela época eu intuía que esta singela atitude poderia melhorar e fortalecer os laços de paternidade, e todos hoje em dia reconhecem a importância de uma sociedade com país responsáveis e presentes.

Diante da minha firma convicção na importância da defesa dos direitos reprodutivos e sexuais e o parto no modelo humanizado, a minha proposta é simples:

É evidente que a violência contra as mulheres é tão mais perigosa e insidiosa quanto mais dissimulada e inaparente. A violência doméstica – com agressões físicas e morais, chegando mesmo à morte – é evidente e escandalosa, e precisa uma especial atenção, e não pode haver dúvidas sobre isso. Entretanto, a violência institucional cometida contra as mulheres na hora de parir é normalmente invisível aos olhos desarmados, e por isso se mantém silenciosa e pervasiva, sem que receba a devida contraposição à sua manutenção e disseminação pela cultura burguesa.

Por esta razão é importante que a violência obstétrica seja nomeada dessa forma, e que seja tratada pelo que é: uma violência de gênero disfarçada de regras, protocolos e rotinas, praticadas nas mulheres muitas vezes sem seu consentimento (como episiotomias, afastamentos, manobras, cesarianas desnecessárias e outras rotinas) e violando sua integridade física e moral.

Assim como outras práticas agressivas estas violências são vendidas como ações “para a proteção da mulher”, quando na verdade servem basicamente para manter o controle sobre seus corpos. Sendo o parto “parte da vida sexual das mulheres” a ação abusiva da medicina sobre o parto é uma agressão contra sua própria sexualidade, e atua como uma forma de expropriar a participação materna sobre este evento.

A maioria dos partidos burgueses e liberais olham para a violência de gênero observando apenas a parte do iceberg que emerge para fora do oceano de abusos. Ficam focados na questão do emprego, da violência contra a mulher, da necessidade de creches e na descriminalização do aborto, o que é justo, mas não contempla a complexidade das lutas das mulheres contra os poderes estabelecidos que regulam seus corpos e sua autonomia.

Eu acredito que o os partidos marxistas deveria tomar a frente e assumir a pauta da Humanização do Nascimento com entusiasmo e destemor, pois que ela atinge de forma muito certeira o sistema de poderes que atinge o corpo das mulheres em sua liberdade, sua sexualidade e seu desejo.

Além disso, não devemos esquecer que gestantes do primeiro mundo são atendidas por um modelo de referência crescente de complexidade que é centrado na figura das parteiras profissionais (atendentes de parto com formação específica na área) e é através destas profissionais – especialistas na fisiologia do nascimento e no cuidado – que poderá haver uma revolução com a necessária radicalidade na questão do parto. Nos lugares onde este modelo é aplicado os resultados maternos e neonatais são melhores do que qualquer lugar – rico ou pobre – onde se estabeleça a atenção ao parto centrada na figura do médico. Para humanizar o nascimento é necessário descolonizar as mentalidades centradas no paradigma médico de atenção ao parto.

O movimento da humanização do nascimento não é uma pauta identitária, mesmo que tenha sido tratado dessa forma por muito tempo e ainda atraia muitas mulheres seduzidas por uma ideia de enfrentamento e separado das outras questões sociais, como o capitalismo e a luta de classes. Não, o parto humanizado diz respeito aos direitos mais básicos das mulheres, mas também da sociedade como um todo.

A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a posição deste Diário.

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