Neste sábado houve mobilizações em repúdio ao brutal assassinato de Moïse Mugenyi Kabagambe, jovem congolês de 24 anos que foi morto violentamente após exigir de seu patrão cerca de R$32 mil em honorários atrasados. Diversas organizações de esquerda, principalmente o movimento negro nacional, foram às ruas pedir justiça por esse ato repugnante.
À frente dos manifestantes que caminharam pelas ruas do Rio de Janeiro vi a faixa com a seguinte palavra de ordem: “fogo nos fascistas”. A vontade de reparar essa injustiça com violência é mais do que natural. Ainda que essa opressão criminoso seja cotidiana no Brasil, seja pelas mãos de capangas do Estado da Polícia Militar ou de capangas dos patrões como no caso de Moïse, um vídeo do jovem congolês sendo espancado emergiu nas redes sociais. Uma coisa é entender que a opressão existe, outra é ver o acontecimento ao vivo e sem cortes. O “fogo” é uma reação óbvia.
Ainda assim, a palavra de ordem me fez pensar. Em meio aos ataques da esquerda pequeno burguesa ao Partido da Causa Operária houve quem nos chamasse de seita, quem relativizasse o financiamento de organizações imperialistas e quem nos acusasse de “iludir jovens idealistas com sonhos aloprados de revolução”. Me peguei imaginando se a pessoa que acredita que “nunca haverá” uma revolução armada (como a que houve recentemente no Afeganistão), também acha que o dia de redenção do povo negro, o dia do fogo, do acerto de contas com seus algozes nunca virá.
Me aventurei no Google, podem me chamar de stalker. Encontrei dois tweets da nossa querida companheira da esquerda “pragmática” citando a palavra de ordem. As citações evocavam uma música e uma comparação com o uso da palavra fogo em inglês, que se refere a demitir as pessoas.
Aha, acho que entendi! A solução para o que aconteceu com Moïse não é defender o direito à autodefesa da população, o direito ao armamento, o direito ao fogo material. A solução é o fogo literário, metafórico. O fogo da poesia e o fogo em inglês, isto é, a demissão dos responsáveis por qualquer ato bárbaro.
Não sei se é uma postura muito pragmática defender a demissão de todos os elementos racistas da PM. No caso de Moise então, que foi morto por capangas pagos por seu patrão, como fazemos? Demitimos o patrão? Expropriamos seu quiosque? Demitimos os capangas também? Como motoristas de Uber da violência acredito que eles não tenham um emprego propriamente dito… são “empreendedores” do mercado da violência. Nesse caso, então, acho que devemos recorrer ao fogo literário e recitar uma poesia sobre incendiá-los.
Acho que eu sou muito literal, assim como meu partido. Nós não entendemos como um setor que domina a sociedade, que detém o monopólio da violência, irá pacificamente nos entregar seu poder. Talvez se pedirmos com muita insistência? Bom, acredito que a experiência histórica desde os primórdios mostra que, por mais que a luta política possa assumir diversas formas, em seu momento mais agudo ela assumirá a forma mais violenta.
Não tenho fetiche por revolução armada, apenas a entendo como uma consequência natural da luta dos explorados contra os exploradores. Nós lutamos pelo socialismo real, pela sociedade de abundância, pelo fim da exploração do homem pelo homem, pela propriedade coletiva dos meios de produção. Lutamos pela causa operária literalmente.
Apesar de nossa campanha de propaganda permanente por “Revolução, governo operário e comunismo”, o PCO não busca doutrinar a população, diferentemente dos partidários do fogo literário, que quererem fazer o povo reaprender a falar seu próprio idioma segundo regras arbitrárias que se alteram de acordo com a última moda nas universidades. O PCO propõe palavras de ordem para o atual momento político como “Lula presidente” e “fim da Polícia Militar”, assim como Partido Bolchevique de Lênin e Trótski que pedia apenas por “Pão, paz e terra” às vésperas da Revolução de 1917.
No caso bolchevique – talvez surpreendentemente para a esquerda afeita alegorias – veio a guerra civil. E a revolução triunfou na Rússia, como triunfará no Brasil. E garanto que esse episódio não terminará bem para os racistas, como bem queriam os manifestantes que foram às ruas hoje.