A proibição de Maus, de Art Spiegelman, em algumas escolas no estado do Tennessee, nos EUA, mostra uma grande direitização que vem crescendo naquele país. A alegação para o veto ao Maus seria a ocorrência de nudez e palavrões na obra.
O livro mais famoso de Spiegelman é uma história em quadrinhos na qual retrata a passagem e sobrevivência de seus pais em campos de concentração nazista. Ali é retratada a relação complicada entre o autor e seu pai, que vive com a sombra da ausência da esposa que se suicidou quando Art tinha apenas vinte anos de idade. Em 1992, o livro ganhou um prêmio Pulitzer.
Em Maus os judeus são retratados como ratos e os nazistas são os gatos. O traço é bastante econômico. A diagramação é muito dinâmica, alternando o tamanho dos quadros em algumas páginas o que ajuda muito na composição da narrativa.
Causa estranheza o banimento de um livro que retrata o Holocausto, uma vez que há um grande interesse da indústria por esse tema. Retratar os horrores que os judeus sofreram nas mãos dos nazistas já rendeu milhares de filmes e livros. Há inclusive aqueles que se utilizam do sofrimento dos judeus para encobrir ou justificar os crimes que os sionistas israelenses vêm cometendo contra o povo palestino desde a criação do Estado de Israel.
Recrudescimento
Art Spiegelman disse que ficou muito surpreso com esse acontecimento e até demorou para entender o que estava se passando. Para ele, os EUA estão ‘vivendo um período semelhante ao pré-Guerra Civil, com dois países separados pela linguagem. E o banimento de livros foi crescendo como um resultado disso’.
Spiegelman afirmou que há um interesse em fazer parecer aos pais que as escolas públicas são perigosas para seus filhos, como se ali fossem forçados a se tornarem gays, ou que mudem de sexo ou se sintam culpadas por terem nascidas brancas. Isso tudo, segundo ele, pode tirar verbas das escolas públicas que fortalecerão o ensino religioso.
Aqui é preciso fazer uma consideração: boa parte dos americanos que se declaram conservadores, acreditam que os democratas ‘são valentões querendo impor à força suas ideias’. Se fizermos um paralelo com o que vem acontecendo no Brasil, não fica difícil de entender essa reação.
Longe de querer justificar a censura, é preciso considerar que existe uma parte do aumento desse conservadorismo é reativo. As políticas identitárias são bastante agressivas e deixa pouco espaço para o debate, uma vez que aquele que ‘detém o lugar de fala’ vence qualquer debate contra aqueles que não estejam dentro de certos grupos ou possam ser considerados privilegiados.
Ineficácia do identitarismo
Relembremos os ataques a estátuas que representam figuras do nosso passado, como os bandeirantes ou Pedro Álvares Cabral. Querem convencer os brasileiros de que o Brasil é um erro, um país ilegítimo no qual toda a herança cultural deve ser jogada no lixo, pois supostamente nossas antepassadas teriam sido estupradas. Sendo assim, o brasileiro seria um misto de pecador e privilegiado que se beneficia do sofrimento de negros e indígenas escravizados.
Isso tem afastado muitos que divergem e acabam sendo atraídas pela direita. É preciso respeitar, por exemplo, aqueles que não concordam que pessoas trans possam utilizar banheiros femininos. Essa discussão tem que ser feita com cuidado, não se pode forçar, pois isso só vai favorecer posições ainda mais conservadoras.
A esquerda, quase que em sua totalidade, se tornou altamente punitivista, quer resolver tudo colocando as pessoas na cadeia. Piadas com negros, gordos, carecas, mulheres, gays etc., são suficientes para que se peça o encarceramento de seus autores.
O que é a cultura do ‘cancelamento’ senão um movimento extremamente autoritário? E é a esquerda quem mais leva adiante esse tipo de atitude. Um outro indivíduo que vote na direita é prontamente classificado como ‘gado’ e o debate fica automaticamente bloqueado. Uma palavra dita fora de hora, uma piada de mau gosto, são suficientes para condenar qualquer um ao ostracismo.
Olhando de perto, o identitarismo se tornou uma espécie de religião em constante processo de inquisição, e está sempre pronta a marcar com ferro os hereges. Os ‘pecadores’, coitados, não podem sonhar com o perdão, estão condenados ao fogo do inferno.
A luta por direitos e liberdade
É claro que todas as minorias e os direitos democráticos devem ser protegidos de maneira intransigente. Quanto mais direitos, melhor. Mas a defesa dos direitos deve ser feita também de maneira democrática. Há setores da classe trabalhadora que são mais conservadores e isso tem de ser respeitado.
Por outro lado, é preciso condenar a censura e o banimento de livros, essa é uma prática de bárbaros. O aumento da censura sempre vai desembocar e punir com maior severidade a esquerda. Vide o que vem acontecendo contra o PCO, que teve canais em suas redes sociais bloqueados de maneira totalmente arbitrária e ao arrepio da lei por um membro do STF.
A classe trabalhadora é a maior beneficiada quando vigora a liberdade, por isso a esquerda, historicamente, tem defendido esse direito fundamental.