Artigo da Esquerda Marxista publicado recentemente (22/11) no seu sítio nos mostra um quadro curioso desse setor do PSOL. Trata-se de uma carta dirigida à direção do partido para que este saia da base governista de Lula e passa para a oposição de esquerda. Vejamos o porquê.
A Esquerda Marxista diz que o governo “Lula-Alckmin” “promete ser uma edição muito piorada do que foram os governos anteriores encabeçados pelo PT”. Ora, se a ‘promessa’ ainda não foi cumprida, para que serve tanto alarde? Até agora, o que temos visto, pelo contrário, é uma grande resistência do chamando ‘mercado’ ao governo que está se formando. E também não está claro que Alckmin governará junto com Lula, o papel de vice, que nem deveria existir, é para substituir o presidente em sua ausência.
Mesmo a presença de Alckmin, se alguém acreditou que isso acalmaria a burguesia, não se comprovou. O dólar tem subido, a Bolsa caiu com a suposta nomeação de Fernando Haddad para a Fazenda. Existe muita gritaria com a aprovação do auxílio emergencial e a manutenção do teto de gastos. Em outras palavras, o ‘mercado’ não tem a percepção de que “o governo Lula-Alckmin será um governo de união nacional, a serviço dos interesses da burguesia e do imperialismo” ─ como acredita a EM.
Bola de cristal
O texto da Esquerda Marxista diz que “prepara no Brasil é um acirramento da luta de classes, com choques brutais que resultarão em desenvolvimentos imprevistos e sem precedentes”. O acirramento já vem acontecendo desde antes do golpe de 2016, e veio se aprofundando. Lula, mesmo na cadeia, liderava as pesquisas de intenção de voto, o que mostra que a classe trabalhadora estava disposta a ir para o tudo ou nada.
Com base na avaliação futurologística de que haverá choques brutais dos trabalhadores com o governo, a EM conclui que “o governo Lula-Alckmin governará para o capital, aprofundando a retirada de direitos e a repressão”. Quer dizer que Lula pretende ser ainda pior do que Temer e Bolsonaro, pois vai aprofundar sua política? O que indicaria que isso vai acontecer? Nada. Até porque Lula não tem condições para fazer isso, precisamente devido à sua base social, que o elegeu em uma mobilização radicalizada contra a direita e a sua política econômica, justamente.
Volta às origens?
O artigo diz que “A responsabilidade do PSOL é manter sua independência e organizar um polo de resistência aos ataques do governo Lula-Alckmin”. Aparentemente, o PSOL teria abandonado esse polo de resistência ao participar do governo Lula. Pelo menos fica explicado porque o Psol se empenhou tanto em sabotar a candidatura Lula, e só se ligou à campanha quando percebeu que toda a classe operária estava se concentrando em torno do petista. Ou seja, se moveu por puro oportunismo, o que provou diversos rachas dentro do Psol.
Durante 2021, o PSol se empenhou em construir uma frente ampla. Procurou elementos da direita, como João Doria e Ciro Gomes, para compor uma chapa. Guilherme Boulos era o principal entusiasta dessa proposta. Representantes do Psol participaram de um evento na Avenida Paulista, em 12 de setembro daquele ano, organizado pelo MBL para promover Doria.
A EM acha estranho o PSol querer participar do governo Lula, mas esse partido esteve tentando colocar a esquerda como linha auxiliar da terceira via durante as presidenciais e está objetivamente à direita de Lula há muito tempo.
A matéria também levanta uma série de reivindicações, como mais verbas para saúde, educação etc. Mas, pelo menos por enquanto, não podemos afirmar que o futuro governo não queira implementar um programa com reformas sociais. Tudo isso dependerá de uma grande queda de braço que já podemos ver esboçada na reação da burguesia.
A promessa de que “no caso de ataques da direita bolsonarista ao governo Lula, o PSOL poderá atuar em frente única na defesa do governo, mas assim como fizemos na luta contra o impeachment de Dilma, com independência de classe, sem baixar nossas bandeiras e sem deixar de fazer as críticas”. A história comprova que não é bem assim. O PSol não se empenhou de fato na defesa da ex-presidenta.
As críticas ─ não construtivas, mas destrutivas ─ ao PT, que nunca deixaram de ser feitas, se somaram aos ataques da burguesia golpista contra Dilma. A mesma atitude que Boulos manteve em suas colunas no jornal Folha de São Paulo. O PSOL fez uma frente única pelo golpe e a própria Esquerda Marxista participou dessa frente quando saiu de forma oportunista do PT durante o golpe, abandonando o barco para sabotar as possibilidades de resistência de Dilma.
A verdadeira luta
É muito revelador que, mesmo antes da posse de Lula, comece a se formar uma oposição “de esquerda”. De fato, isso nem chega a ser novidade. Esse movimento já vem sendo repetido desde o início do ano com figuras como Paulo Galo, que ficou famoso por incinerar a estátua de Borba Gato, que disse que ‘faria as ruas ferver’ contra o governo Lula, em um programa ao vivo no YouTube com outros influenciadores de esquerda.
A luta verdadeira é contra a burguesia, que vai tentar barrar as reformas sociais necessárias para desenvolver o Brasil. Os bancos, o ‘mercado’, estão sugando mais da metade do orçamento, mas boa parte da esquerda prefere atacar o governo Lula, ao invés de atacar a ala direita da frente popular e, logicamente, a burguesia e o imperialismo.
O papel da esquerda, das centrais sindicais, é ganhar as ruas e pressionar para que as reformas entrem em vigor. Mesmo o auxílio emergencial, crucial para que boa parte da população não passe fome, já está encontrando resistência.
Temos que denunciar essa esquerda que já se levanta contra o futuro governo e que, sob a desculpa de criticar à esquerda, servirá como fator de desestabilização, o que só pode favorecer a direita.