Toda Copa do Mundo é a mesma coisa. Sempre aparece o debate sobre se o brasileiro deveria torcer para a Argentina ou não.
No jogo de estreia, vi algumas pessoas criticando quem comemorou a derrota da Argentina diante da Arábia Saudita. Aliás, uma derrota pra secador nenhum botar defeito.
Nessa quarta, algumas pessoas decidiram torcer para a Argentina se classificar, no jogo contra a Polônia.
Vejam bem, não estou citando aqui os brasileiros que torcem para a Argentina em vez de torcerem para o Brasil, esses seres infelizes, pobres de espírito que em algum momento foram dominados pela cruel propaganda imperialista contra o futebol brasileiro. Poderíamos dedicar um artigo só para eles. Estamos falando dos que torceram para os portenhos contra a Arábia Saudita e contra a Polônia por questões políticas, se é que podemos simplificar a coisa assim.
O argumento seria mais ou menos o seguinte: a Arábia Saudita é um enclave imperialista no Oriente-Médio, um governo ditatorial capacho do imperialismo. A Polônia, governada pela extrema-direita, também um país capacho do imperialismo europeu. Já a Argentina, um país irmão, sul-americano, portando, deveríamos torcer para ela.
Em poucas palavras, como acabar com a graça do futebol.
O futebol sul-americano é de fato superior ao europeu, em primeiro lugar por causa dos brasileiros, depois por causa dos Uruguaios e Argentinos. E o futebol do nosso continente é tão superior que abriga o maior clássico futebolístico do planete: Brasil e Argentina.
Nenhuma outra disputa entre seleções é tão disputada, nenhuma guarda tanta rivalidade, nenhuma tem tanta qualidade quanto um Brasil e Argentina. Quer argumento mais bonito do que este para quem defende o futebol sul-americano acima de tudo?
Para que esse clássico tenha toda essa importância, a rivalidade entre as duas seleções é condição sine qua non. Sem rivalidade, não tem clássico, tem só mais um jogo. O que seria do Grenal sem o ódio entre Colorados e Gremistas, o que seria do Choque-Rei sem a rivalidade entre sãopaulinos e palmeirenses, o que dizer do Fla-Flu, do Derbi Paulista, do Majestoso, do Derbi Campineiro, do Come-Fogo, do BaVi, do clássico mineiro e tantos mais? Não seriam nada. (Antes que me acusem, não coloquei esses clássicos em ordem de importância, mesmo porque, se fosse assim, teria colocado em primeiro lugar o Come-Fogo).
Os argentinos têm apenas duas copas. O Brasil tem cinco. Mesmo assim, os argentinos não esquecem nunca a vitória sobre o Brasil nas oitavas da Copa de 90. Maradona talvez seja um jogador comparado a Zico, mas os argentinos não deixam de blasfemar comparando-o com Pelé. A rivalidade é isso. Eles são arrogantes por falarem todos esses absurdos, são. Mas é parte da rivalidade.
Enquanto isso, alguns brasileiros procuram motivos existenciais-filosóficos-éticos-políticos-étnicos-sociais para torcerem para a Argentina.
Meus amigos, quem é amante de futebol deveria saber que o futebol é coisa séria e que ele tem sim as suas regras próprias.
Vejam bem, é claro que futebol e política tem relações, afinal, tudo tem alguma relação com a política. É a política que rege as ações das pessoas. Mas isso não significa que cada aspecto da vida social não seja regido por leis próprias também.
Por exemplo, uma análise de uma obra de arte não pode ser puramente política, no sentido mais superficial do termo. A posição política de um artista não deve ser a única lei para essa análise pois a arte tem também as suas próprias leis.
Com o futebol ocorre a mesma coisa. O futebol tem, sim, as suas próprias leis, elas são influenciadas pela política, mas não são exatamente a mesma coisa. Futebol é futebol e vice versa.
Se a Argentina entrar em guerra com a Inglaterra, podemos até pegar em armas para defender nossos irmãos latino-americanos. Mas não somos obrigados a torcer pelos nossos rivais no futebol.
Por fim, para os que ainda insistem, é preciso falar uma coisa chata, um pouco desagradável, mas a verdade é que o futebol Argentino é o mais europeu da América do Sul, tanto no estilo quanto na cor da pele. Os jogadores argentinos são mais brancos do que a maioria das seleções europeias. Isso deve ser levado em consideração, pois é isso o que torna a torcida argentina a mais arrogante do continente, por isso a mani de nos chamar de macaquitos.
Mas tudo bem, os brasileiros olham de cima, como quem diz: “deixem esses pobres coitados gritar, eles não têm nada perto do que nós temos”.