Segundo a colunista Maria Tadeo, a crise ucraniana acabou por expor a forte dependência alemã da Rússia, o que demonstrou ao bloco as falhas de seu modelo econômico.
“A dependência alemã da Rússia expôs as falhas de seu modelo econômico – uma indústria de alta intensidade operando com gás barato, junto com a cegueira de sua classe política em relação à sua dependência do Kremlin. Enquanto Berlim ainda está tentando superar o choque, o Sul da Europa está se tornando cada vez mais assertivo. Não se trata de vingança pelos anos da política de austeridade, liderada pela Alemanha, mas uma recalibragem de forças, processo que pode, em última análise, resultar em uma UE mais saudável”, salienta a publicação.
Caso espanhol
Teresa Ribera, ministra espanhola para a Transição Energética, reagiu duramente às declarações da Comissão Europeia exigindo que todos os 27 países-membros do bloco limitassem o seu consumo de energia em 15% nos próximos meses.
Conforme a Bloomberg, ao criticar a Alemanha, a ministra sublinhou que a Espanha investiu muito nas energias renováveis, mantendo laços mínimos com a Rússia e “vivendo de acordo com as suas possibilidades”. Esta menção referia-se à repreensão por parte da Alemanha, expressa durante a crise da dívida pública europeia em relação aos países do Sul da Europa, de que eles “viviam acima das possibilidades”.
“Esta foi uma demonstração incomum de bravata para um país como a Espanha, que tradicionalmente tem sido beneficiário líquido do financiamento europeu. […] As declarações de Ribera refletem a falta de desejo por parte da Alemanha de admitir o fracasso monumental das suas políticas em relação à Rússia”, diz o artigo.
“As reações às declarações da ministra espanhola dividiram-se entre aqueles que acham que é hora de apontar as inconsistências de Berlim e aqueles com medo de que tal linguagem arrisque inflamar velhas tensões”, escreve a autora.
A Bloomberg lembra que a Espanha foi um dos primeiros países a tocar o sinal de alarme quanto à crise energética, assim que a Rússia começou a cortar o fornecimento. Salienta-se que, ainda no final do ano passado, o mercado começou a demonstrar sinais de estresse.
Madrid afirmou na época, diz a edição, que precisava melhorar a interconexão energética com o resto da Europa. As autoridades europeias não deram ouvidos a estas críticas, vendo-as como mais um exemplo do “sul à procura de uma esmola”. Ainda assim, a energia só se tornou um problema europeu quando os riscos para a Alemanha passaram a ser muitíssimo graves.
“Isso reflete o problema de formação da agenda na Europa. [… ] É mais do que tempo de as propostas do Sul serem levadas mais a sério. A mudança de equilíbrio, caso possa melhorar o processo de tomada de decisões, deve ser saudada por Bruxelas”.
Para concluir, Tadeo salienta que, tendo em conta a interdependência dos países do bloco, as crises europeias, na sua essência, têm um caráter circular: uma recessão na Alemanha, que é a maior economia da Zona Euro, vai prejudicar todos os países.
“Considerando a envergadura do fiasco alemão e os desafios que ele coloca para toda a Europa, Berlim não deve se surpreender ao ver o Sul pedindo para ser mais ouvido”, escreve a edição.
Um eventual confronto entre o Norte e o Sul pode levar a um retrocesso na tomada de decisões na Europa, após uma década de solução conjunta de problemas.