O solar Visconde de São Lourenço, palacete com fachadas do século XVIII e exemplo da arquitetura neoclássica no Brasil, tombado pelo IPHAN em 1938, já foi fonte de inspiração para o grande romancista brasileiro Machado de Assis. Um de seus mais famosos personagens, Bentinho, o Dom Casmurro, vivia naquela rua. Hoje a construção inspira cuidados para que partes de sua fachada permaneçam em pé. O restante da construção foi demolido por uma empresa para a construção de um estacionamento, em funcionamento no local desde 2001, cujo alvará de funcionamento foi renovado em 2020. A atividade no local já foi considerada irregular pela Defesa Civil em 2012, tendo seu alvará negado em dezembro daquele ano. Embora haja risco de desabamento e acidentes, inclusive de trânsito, o estacionamento reabre em 2014, aumentando mais ainda a deterioração das fachadas restantes. Os donos da empresa também tentaram realizar obras na fachada do solar, desobedecendo as orientações do IPHAN na ocasião, pois o prédio era tombado.
Após o golpe de 2016, o órgão público responsável pela preservação e tombamento de patrimônios culturais brasileiros – IPHAN – tem se tornado um instrumento de destruição da cultura nacional, assim como outros órgãos públicos ligados à cultura e à educação. O destombamento do que ainda restava prédio foi sugerido duas vezes pelo historiador do IPHAN Adler Homero Fonseca de Castro, entre 2021 e 2022. Como justificativas alegou a falta de qualquer valor das fachadas e num segundo documento declara falta de materialidade para o tombamento.
Duas semanas após o destombamento ser assinado pela presidente do IPHAN, Larissa Peixoto, a empresa iniciou a demolição das fachadas, destruindo telhas, cantarias e soleiras. Porém a Juíza Mariana T. da Cunha, da 28a Vara Federal do Rio de Janeiro, suspendeu a ação do Iphan, por considerá-la irregular, uma vez que o destombamento só pode ser feito pelo Presidente da República em prol do interesse público. Este não é, de forma alguma, o caso das ruínas do Solar Visconde de São Lourenço. Trata-se da destruição do patrimônio público em função dos lucros e interesses privados.
Este é um exemplo de como o interesse capitalista apaga marcos da história e da cultura nacionais e coloca o espaço vazio de um estacionamento, cheio de mato e insetos em seu lugar, ambicionando destruir de vez aquelas velhas paredes que resistiram ao tempo e conservaram parte da história arquitetônica e cultural da cidade maravilhosa.