Dois artistas entrevistados pela Folha de São Paulo opinam sobre o resultado das eleições brasileiras do último dia 30, na disputa dos cargos de presidente e governador. Ambos imprimem às suas obras artísticas o tema da política contemporânea e suas obras revelam um interesse pelo corpo humano no sentido de requererem uma interação do público com a obra. Na visão dos artistas, é fundamental a participação do povo na arte para que a arte seja viável e o artista encontre respaldo, consiga se comunicar.
Cildo Meireles, conhecido como o artista das instalações políticas, declarou à Folha que sentiu alívio quando soube que o vitorioso foi Lula, candidato do Partido dos Trabalhadores e que, para ele, o governo Bolsonaro, PL, representou uma volta do autoritarismo dos 20 anos da ditadura militar iniciada com o golpe militar de 1964.
Cildo dispara, “Bolsonaro é um delinquente vulgar, passou o tempo todo correndo da polícia”, diz ele. “Foi uma vitória da sociedade civil brasileira e da democracia, depois de mais um teste que o nosso regime político sofreu.”
E, completa, que o governo Bolsonaro, que manteve a página do golpe de 2016 com a pauta do conservadorismo e do neoliberalismo adotado pelo governo golpista Temer, impôs dificuldades aos artistas, e promoveu poucas exposições e incentivos aos museus.
“Sobrevivi graças ao mercado externo”, afirma. “Para a maioria de nós, foram anos de pindaíba, uma catástrofe de cabo a rabo.”
Ernesto, por usa vez, confessou ter vivido um pesadelo e ter acordado com Lula vitorioso. Fala da importância dos temas indígenas na arte nestes anos de retrocesso representados por Temer e Bolsonaro, devido à repressão do bolsonarismo aos índios e diz,
“É uma oportunidade do Brasil sair desse lugar do acordão, que aparece na história desde a Independência e ter responsabilidade histórica. Nesse país, não temos um dia que lembre o fim da ditadura, assim como ainda não sabemos quem mandou matar Marielle Franco”, diz Neto. “Nós artistas seremos sempre um incômodo para um antidemocrático como Bolsonaro”
Segundo ele, “a própria arte pode mudar o paradigma do país”. <…> “A exploração dos ciclos econômicos do Brasil colonial se faz presente agora, com a exportação de commodities, como a soja. Enquanto isso, as pautas de costumes, que foram prioridade de Bolsonaro, só prejudicaram a imagem do artista na sociedade”.
Nunes mostra dessa forma que, na exposição do pensamento do artista aparecem as saídas para o progresso da sociedade. Ninguém é uma ilha. A experiência de cada um contribui para a tomada de consciência geral do povo sobre o seu posicionamento na luta contra o que o oprime. Nesse sentido a burguesia não se beneficia com a arte.
As obras de Ernesto também revelam um caráter relacional com o público. Esta interação, urgente nas obras dos dois artistas com o público, faltou à campanha de Lula, que enfatizou o apoio das instituições burguesas e da dita “direita civilizada”. Lula esqueceu do pouco que proporcionou à arte, cuja característica é se ligar ao espectador, durante seu governo e acabou por se deixar levar pelo discurso da burguesia que coloca o povo como irrelevante para a política. Não é verdade para a política e não é verdade para a arte, o povo é sempre protagonista. Lula só se aproximou novamente do povo, que é o que na verdade mantém forte a sua base política real, quase que na última semana da campanha do segundo turno. Por coincidência ou não, ao mesmo tempo que o PCO intensificava sua campanha na defesa da candidatura de Lula, incondicionalmente, como destacou o partido, pois constantemente o petista se inclinava para a direita na campanha, meio que, dando uma sobrevida à morte do principal partido da burguesia, o PSDB, que sempre teve como alvo a aniquilação do PT, e ainda têm.
Os artistas também destacam que um elemento como Tarcísio de Freitas (Republicanos) representa a manutenção, em São Paulo, da política neoliberal, que não enxerga na arte uma necessidade para o povo, e o quadro esperado é de não investimento nas artes por seu governo.