Estibaliz Carranza cresceu em Barcelona com sua mãe, pai e o irmão mais novo. Seu pai era xamã, escritor de livros esotéricos e adorava misticismo. Ele era bem religioso e dogmático, o que dificultou a relação com a filha. Antes de se mudarem para a Espanha, a família vivia no México, onde passavam por muitas dificuldades, pois o pai era marcado como um ativista pelo governo e sofreu duras perseguições. Em uma delas, teve sua casa invadida pelas forças armadas e vários objetos foram quebrados. Estibaliz relata ter visto uma cena traumática nesse dia: os policiais quebrando seus brinquedos e bonecas com a garota assustada assistindo enquanto se derramava em lágrimas.
Depois do ocorrido, a família foge para Barcelona e passa a morar em um apartamento bem menor e com muito menos conforto. O pai da menina era muito estressado e trabalhava em home office. Em uma casa pequena demais para 4 pessoas, sendo duas delas crianças, era difícil ter algum momento de pleno silêncio, o que gerava conflitos frequentes entre os moradores. Na escola nova, Estibaliz sofreu com dificuldades de socialização. Ela sofria muito bullying por ser mexicana e era muito tímida, então o processo de adaptação (se é que houve um) foi muito doloroso.
A menina sempre sonhou em ser mãe, se casar com um bom homem e formar uma família, sua relação com o sexo oposto era completamente normal. Mas tudo mudou na adolescência, quando ela foi chamada para uma festa, onde um homem a levou para um quarto, a algemou e abusou sexualmente da garota. Esse episódio, somado aos traumas com os policiais e aos conflitos com o próprio pai, fez com que ela tivesse pensamentos violentos em que ela agredia e machucava aqueles homens que um dia já a fizeram mal.
Anos depois, ela começa a cursar economia coagida pelo pai. Durante a faculdade, ela esteve em um relacionamento que durou 5 anos, que teve fim quando ela contou ao namorado do seu sonho de se casar e ser mãe, e ele disse que não almejava aquilo, pois não queria “nada sério”. De coração partido, Estibaliz começa a fantasiar diversas formas de matá-lo, mas acaba não colocando nada em prática e seguindo sua vida. Ela se formou e posteriormente se mudou para a Alemanha.
Nos seus primeiros meses no novo país, ela trabalhava como au pair, mas depois passou a trabalhar em uma sorveteria, onde conheceu um homem chamado Holger Holz. Em poucas semanas, eles desenvolveram um relacionamento e se casaram, apesar da família de ambos não comparecer ao casamento por julgar ter sido muito precipitado, principalmente por conta da diferença de idade.
Quando eles passaram a morar junto, o namorado romântico se revela um marido violento, que abusava dela fisicamente e verbalmente. Ele pegou os documentos e todo o dinheiro dela para que ela não fugisse. Anos depois, eles se mudaram para a Áustria, com a promessa de que, lá, Holger finalmente começaria uma família com ela. Eles abriram uma sorveteria juntos, mas todo o trabalho ficava para Estibaliz, enquanto o marido passava os dias em casa jogando vídeo game. Além disso, ele se recusava ter relações sexuais com ela por ela não ser “atraente o suficiente”, o que deixava ela muito chateada já que anulava suas chances de ter um filho. A partir daí, ela começa a fantasiar o assassinato do próprio marido.
Com tantos desentendimentos, ela pede divórcio, mas apesar de acabar com o casamento, Holger se recusa a se mudar da casa deles e eles continuam morando juntos. Estibaliz começa a sair com um fornecedor de sorvetes, Manfred Hinterberger. Eles entram em um relacionamento aberto não muito saudável, com vários términos e retratações.
Em um dia, ela discute com Holger enquanto se arrumava para sair, pedindo para que ele se mudasse. Ele recusa e diz que Estibaliz é muito burra e incapaz de morar sozinha e que ela nunca daria conta. Ela fica furiosa, pega uma das armas da coleção do ex-marido e dispara 2 tiros certeiros contra ele. O homem cai morto no chão e Estibaliz sai de casa e curte a noite como se nada tivesse acontecido.
No dia seguinte, ela tenta queimar o corpo, mas os vizinhos percebem e chamam os bombeiros, que acreditam na desculpa de que ela só tinha queimado um peixe que estava cozinhando, e que não precisavam averiguar a casa. Ela dorme na casa de um “ficante” e, um dia depois, esquarteja o corpo com uma motosserra e guarda no congelador.
Tempo depois, ela precisa se mudar, então guarda o corpo em containers de sorvete, mas a cabeça, que era grande demais, foi concretada em um congelador. Todos esses pedaços de cadáver foram armazenados no porão da sorveteria.
Sem o ex-marido para interferir, ela reata mais uma vez o relacionamento com Manfred, que a obrigava a fazer cirurgias e procedimentos estéticos, além de negar ter um filho, se casar ou fechar o relacionamento. Isso frustrava muito a mulher, que fez um curso de tiro, aulas sobre trabalhos com concreto, comprou uma nova motosserra e começou o planejamento de seu segundo assassinato.
Na volta de uma viagem que fizeram juntos, Manfred e Estibaliz discutem mais uma vez. Ela espera o namorado dormir e o mata com tiros. Depois da morte, ela fez o mesmo processo para se livrar do corpo: esquartejou, congelou e concretou.
Depois de alguns anos da morte de Manfred, ela começa a namorar um amigo do falecido, Roland. Dessa vez, ela engravidou e estava convencida de que tudo daria certo e que tinha encontrado o amor de sua vida, mas a felicidade durou pouco. Houve um grande vazamento na sorveteria e alguns trabalhadores do governo precisaram invadir o local para conter o vazamento. E assim eles descobriram o porão e acionaram a polícia.
Ao ver os policiais, ela soube dos ricos de ser presa, então pediu para que uma amiga buscasse seu passaporte em casa e comprasse pra ela um chip pré-pago. Ela ligou para Roland e confessou tudo. Tentou fugir de avião, mas tinham policiais esperando por ela no terminal, então recorreu aos trens. Para seu azar, nenhum trem internacional sairia tão cedo, então ela decide pegar um táxi e fazer uma viagem de 5 horas até uma cidade italiana.
Durante a viagem, é anunciado no rádio que ela estava sendo procurada, e ela confessa. O taxista deixa ela numa cidade perto do destino final e faz uma reserva em um hotel em nome dele. No dia seguinte, Estibaliz convence um hóspede a levá-la de carro até a cidade italiana em que ela pretendia ficar, onde ela pinta o cabelo e conhece um homem que a hospeda no apartamento dele pensando que ela fugia de um relacionamento abusivo. O dono do apartamento começou a suspeitar da obsessão dela pelo caso da suposta “mulher da Áustria” e chama a polícia.
Estibaliz é presa e tem seu filho na prisão. Casa-se com Roland, que tenta conseguir a guarda do filho, mas fracassa. A criança passa a ser criada pelos avós. A mulher cumpre pena de prisão perpétua em uma clínica psiquiátrica.
Esse caso criminal mostra como o atraso social, que no caso de Estibaliz se manifesta na forma do conservadorismo, é uma grande ameaça à saúde mental das pessoas. Suas idealizações de um marido perfeito alinhadas a um bom tempo de abuso sexual e experiências amorosas frustradas fez com que ela fantasiasse e, posteriormente, cometesse várias insanidades. Uma demonstração crassa da decadência moral imposta pelo imperialismo sobre as pessoas.