Ao escolher Baleia Rossi como seu candidato à presidência da Câmara dos Deputados, a esquerda parlamentar tomou partido de uma das cabeças de um monstro que tem, no mínimo, 10 delas.
O “centrão”, esse bicho que se estende das entranhas do Executivo às extremidades do Legislativo, tem dois candidatos na disputa. Arthur Lira (PP-AL) é o candidato oficial do governo Bolsonaro. Baleia Rossi, presidente do MDB, é o nome da “oposição”, indicado por Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Não ter programa, nem ideologia, nem nenhuma fidelidade a qualquer credo é uma característica dos partidos burgueses, fisiológicos, recheados de carreiristas da pior espécie. Isso, Lira e Rossi têm em comum. No que seria possível à esquerda enxergar diferenças entre eles? A resposta vem depois.
Antes, destaco o que uma colunista do portal UOL, Carla Araújo, reuniu sobre as opiniões – se assim podemos chamar – dos dois candidatos sobre problemas da economia. Aí se vê que, embora sejam partes de um todo, Lira e Rossi não se distinguem no fundamental do que pensam e querem os políticos burgueses.
Sobre o auxílio emergencial, Lira disse que não é mágico para encontrar uma solução de curto prazo para o auxílio. Ele, “não tem como propor uma solução de curto prazo” e, se essa solução for apresentada, terá que ser encaminhada “sem criar tumulto no país. Sem abalar o que todo mundo preza, que é a confiabilidade para que venham recursos externos”.
Rossi, por sua vez, pensa… o mesmo. Mas disfarça com a boa e velha demagogia das boas intenções (“temos que buscar uma solução” e “ou aumentar o Bolsa Família ou o auxílio emergencial”). Não vai vir dele uma solução de curto prazo, como a que Lira espera que alguém apresente, está claro. Nem solução nenhuma. Não tem proposta. E, deixou claro também, que se uma proposta for apresentada, terá que olhar a pauta “com responsabilidade fiscal”. “Qualquer discussão sobre o auxílio emergencial passa, necessariamente, pelo cuidado com as contas públicas”, disse.
Na reforma tributária, nova convergência. Lira diz que é prioridade e Rossi foi quem apresentou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45. Rossi, obviamente, também diz que é sua prioridade. A diferença entre os dois parece estar em que um “quer ouvir” e o outro quer “dialogar” com os demais parlamentares.
Sobre todos os demais pontos sobre os quais a jornalista cotejou as citações dos dois candidatos, as semelhanças são as mesmas: reforma administrativa, PEC emergencial, manutenção do teto de gastos… Mas o que despertou meu interesse, quando comentei essa notícia no programa Resumo da Semana no domingo (17) na Causa Operária TV, foi o tema das privatizações.
Arthur Lira foi direto: vender as estatais vai desafogar o Orçamento e não será simples pois, diz ele, há resistência no Senado. Baleia Rossi, no entanto, tem como diferença o fato de ter sido apoiado pela esquerda. O PT pediu a Baleia que não incentive as privatizações. Mas ele é a favor e se saiu com essa: “o governo precisa mostrar projetos consistentes nesse sentido”. “Até agora não fez”. Ou seja: se fizer, privatizemos. Acaba aí a diferença.
Terá sido essa a vitória da esquerda ao apoiar Baleia Rossi? Conseguiram colocar uma conjunção subordinativa condicional na boca do presidente do MDB? Foi de “vitórias” como essa que a política de colaboração de classes do PT levou ao desastre do impeachment nas mãos do mesmo MDB. Agora, mesmo apeada do poder, a esquerda parlamentar persiste na ilusão de que é possível avançar agarrando-se a uma das cabeças do monstro de tantas cabeças que domina a política nacional. Só não sabem para onde esse monstro os levará.