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Fidel ou Batista?

Medo do Brasil virar uma Cuba?

"O Brasil vai virar uma Cuba!": frase recorrente no discurso bolsonarista tem colaborado na construção de uma imagem que associa o socialismo a tudo que se refere ao mal

Uma das frases mais ouvidas no discurso da direita bolsonarista, durante a última campanha eleitoral para a presidência da República, era de que se votaria contra o PT por medo de que o Brasil se tornasse uma Cuba.

Esse pensamento combina com a recente fala do atual presidente, na abertura da Assembleia Geral da ONU, em que mencionou que assumiu o governo de um país que estava à beira do socialismo. Foi parte de um discurso mentiroso e delirante, feito para as pessoas que vivem nesse universo paralelo em que se acredita em absurdos anticientíficos como Terra plana e tratamento precoce contra a Covid. Só mesmo no mundo do cercadinho do Alvorada para se acreditar em tamanha bobagem.

Como todos com um mínimo de informação sobre política sabem, o Brasil jamais esteve à beira do socialismo, em tempo algum. Ainda assim, esse era o temor que serviu para aterrorizar desavisados na campanha eleitoral de 2018, por mensagens de whatsapp de forte apelo emocional.

O mesmo tom dramático reapareceu no dia 29 de setembro, em vídeo exibido pelos senadores na sessão da CPI da Covid, no qual se vê o depoente do dia, o empresário bolsonarista conhecido como “véio da Havan”, intimidando os coitados dos seus funcionários para que votassem no seu candidato e não anulassem o voto nem votassem no opositor, Fernando Haddad, do PT. Conforme se vê no vídeo, o empresário afirmava que, caso Bolsonaro fosse derrotado, os funcionários (que ele chama de “colaboradores”) correriam o risco de perderem seus empregos na loja de departamentos, visto que várias delas seriam fechadas. Essa é a ameaça clara feito pelo “véio da Havan” para pressionar seus empregados pelo medo do desemprego. A justificativa dada pelo empresário era de que esquerda é “aliada do mal” e só poderia trazer desgraças ao país, coisas tão terríveis como transformar o Brasil em uma nova Cuba.

Nesse discurso tosco, carente de sentido no mundo real, e com forte apelo emocional, recorre-se ao medo para que as pessoas se sintam ameaçadas pelo perigo iminente de se verem sem emprego, o que seria, segundo o “véio”, o caminho natural no quadro de desolação que se instalaria em um país cujo governo seguisse as mesmas diretrizes da Cuba socialista, na visão deturpada dele, uma espécie antessala do inferno na Terra (plana). O tom amedrontador nesse tipo de discurso é fundamental para que se veja Cuba como o símbolo do maligno, a portadora do mal na sua essência.

Mas nós não estamos na Terra plana e a realidade concreta se impõe no nosso cotidiano de lutas contra a destruição imposta pelo atual desgoverno fascista e seu modelo econômico neoliberal, diametralmente oposto ao socialismo, como podemos constatar diariamente. O que talvez o tal empresário não tenha percebido é que o risco de nos tornarmos uma Cuba aumentou e está cada vez mais próximo da realidade brasileira, inclusive muito mais do que durante os governos Lula e Dilma.

O cenário é esse: um país que sofreu um golpe de Estado, com a colaboração dos EUA, como de hábito, atuando em favor dos seus próprios interesses econômicos, com sua postura intervencionista na América Latina, que colabora ativamente para a destruição de qualquer possibilidade de desenvolvimento da indústria nacional do país. O domínio dos EUA transparece no governo local, submisso aos interesses imperialistas, reforçando uma clara relação de dependência. Vimos também uma casta militar que se firmava como parasita dos cofres públicos, com privilégios mantidos e outros novos trazidos após o golpe, em detrimento do povo, mergulhado na miséria e cada vez mais sacrificado. O golpe se traveste de democracia, pois, para todos os efeitos, as eleições seguiam como se tudo estivesse na mais perfeita normalidade institucional, mas sabemos que na realidade manipulações aconteciam para que o resultado das eleições atendesse ao interesse das classes dominantes e do Imperialismo do Norte. Encontramos grande parcela da população desempregada, subempregada ou em trabalhos sem nenhum direito, o que fez com que a classe trabalhadora se sujeitasse às situações de maior exploração impostas pelo patronato. Classes dirigentes associadas ao capital especulativo centrado em Wall Street e afinadas com seus interesses. Uma elite econômica de mentalidade escravocrata e totalmente intolerante a qualquer medida, mínima que seja, que objetivasse uma melhor distribuição de renda e a diminuição das graves desigualdades sociais, pois não abriria mão de nenhum privilégio. Uso recorrente do discurso anticomunista que beira à histeria como ferramenta auxiliar na tarefa de colocar no poder um governo afinado com a ideologia estadunidense, com o pensamento imperialista, favorecendo o controle econômico dos países da América Latina.

Esse era o cenário na Cuba da década de 1950, antes da Revolução liderada por Fidel Castro, a Cuba ocupada pelos EUA, submissa e dependente do poder imperialista do Norte. Parece familiar?

Infelizmente, não é à realidade do socialismo cubano que o Brasil atual se aproxima, mas à dessa Cuba pré-Revolução, controlada por uma máfia que usava os cassinos para a lavagem de dinheiro e fazia da ilha caribenha um local para todo tipo de falcatruas financeiras promovidas por verdadeiros gângsteres e faziam daquele pequeno país um local degradado pelo domínio estadunidense.

O paralelo com o Brasil é bastante claro. Tudo o que descrevi como característico da Cuba dos anos 1950 serve para o Brasil atual. Aqui, a corrupção e as práticas mafiosas das milícias já se instalaram no governo com força total, como fica cada dia mais evidente. O próximo passo nos planos do atual governo brasileiro de dilapidação das riquezas nacionais em benefício do capital estrangeiro é a liberação do funcionamento de cassinos em resorts, projeto em andamento desde a gestão Temer. A CPI da Covid trouxe esse assunto à pauta novamente, quando se levantou a informação de que um dos depoentes havia viajado, com Flávio Bolsonaro, à Las Vegas para tratar da legalização do jogo no Brasil junto a um magnata estadunidense do ramo de cassinos. Há uma brecha na nossa legislação que permite jogos por internet promovidos por empresas estrangeiras, sem nenhuma incidência de imposto sobre tal atividade. A quem interessa esse tipo de negócio? Com certeza, não ao povo brasileiro. Parece que o filho 04 pode se beneficiar bastante. É sabido que ele abriu uma empresa de jogos eletrônicos com um dos depoentes da CPI da Covid, envolvido na negociata de vacinas superfaturadas.

Medo de virar uma Cuba? Estamos caminhando bem nessa direção, mas falo da Cuba de Fulgêncio Batista e não a de Fidel Castro. Rumamos à Cuba sem autonomia, explorada à vontade pelo Imperialismo, com um povo miserável e sem direito a nada, e não à Cuba socialista, que mantém suas conquistas sociais, apesar do bloqueio estadunidense de seis décadas.

Com o golpe, o desgoverno atual e o acirramento das políticas neoliberais, estamos cada vez mais distantes da Cuba socialista, que acabou com o analfabetismo, que garante educação gratuita, popular, igualitária. Sem falar da postura oposta à brasileira em relação à pandemia. Cuba, com um sistema de saúde público que é referência mundial de atendimento humanizado e de qualidade, vem apresentando um enfrentamento exemplar da atual pandemia, elogiado até mesmo pela OMS, com um baixo índice de mortalidade, vacinas próprias para a toda a população a partir de dois anos de idade, suspensão das aulas presenciais até que a vacinação esteja completa, e informação clara sobre a situação à toda a população, diariamente, pelos meios de comunicação locais. A Cuba socialista é o avesso da política genocida vigente no Brasil, que tem jogado a população à morte com o falacioso “kit covid”, o tal “pacto da cloroquina” e uma medicina privada que trata vidas humanas como algo subordinado ao lucro. Essa medicina mercantilista transpareceu na frase dita pela advogada Bruna Morato na CPI da Covid e tão repetida nos últimos dias: “óbito também é alta”. Alta significava a interrupção dos gastos com a pessoa internada. Uma canalhice dessas é o avesso da medicina humanizada, praticada pelos profissionais da saúde enviados por Cuba a diversos países, desde o ano passado, para auxiliarem no atendimento às vítimas de covid-19, que inclusive foram indicados ao Nobel da Paz desse ano por sua atitude exemplar em termos de humanidade e solidariedade entre os povos.

Que as semelhanças como a Cuba da década de 1950 nos traga a mesma gana daquele povo que lutou e conquistou sua soberania e sua independência de fato, libertando-se do Imperialismo. No momento presente, que o medo de virarmos de vez aquela Cuba do governo Fulgêncio Batista, dos cassinos, das desigualdades imensas e da miséria do povo, nos inspire ao menos a termos força e espírito de coletividade para sairmos às ruas no próximo dia 2 de outubro, na luta por nossos direitos e pela dignidade da classe trabalhadora, por Fora Bolsonaro e por Lula presidente.

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