Dia 2 de setembro, o letrista, compositor e cronista Aldir Blanc Mendes teria completado 74 de idade. Ele faleceu em maio deste ano, vítima de covid-19, na cidade do Rio de Janeiro. Uma de suas maiores composições foi “O Bêbado e a Equilibrista”, com parceria com João Bosco e imortalizada por Elis Regina, além de ter autoria sobre várias trilhas que se manifestavam contra a ditadura militar no Brasil. Uma curiosidade é que Blanc ingressou no curso de medicina aos 20 anos e se especializou em psiquiatria, mas abandonou a profissão em 1973 para se tornar compositor e um dos grandes letristas da história da música brasileira.
Teve 50 anos de atividade como compositor e letrista, com mais de 600 canções de sua autoria, entre as principais estão: “Ela”, “Bala com Bala”, “O Mestre-sala dos Mares”, “Dois pra Lá, Dois pra Cá”, “De Frente pro Crime”, “Kid Cavaquinho”, “Incompatibilidade de Gênios”, “O Ronco da Cuíca”, “Transversal do Tempo”, “Corsário”, “”O Bêbado e a Equilibrista“, “Catavento e Girassol”,“Coração do Agreste” e “Resposta ao Tempo”. E entre seus parceiros, teve cerca de cinquenta em sua carreira, destacando-se, além de Bosco, Guinga, Moacyr Luz, Cristóvão Bastos, Maurício Tapajós e Carlos Lyra.
Quando Elis passou a receber as novidades de Blanc e Bosco, depois de “O Mestre-sala dos mares” e “Dois pra lá, dois pra cá”, Bosco e Aldir assinaram sua música mais famosa em 1978, onde a inspiração veio a partir da morte de Charles Chaplin naquele dia. “Caía a tarde feito um viaduto / e um bêbado trajando luto / me lembrou Carlitos” são os versos que abrem a canção, em memória ao personagem mais famoso de Chaplin. O viaduto faz referência ao Elevado Paulo de Frontim, no Rio de Janeiro, que ruiu em 1972, dois anos após sua conclusão, matando 29 pessoas.
Outra curiosidade, sobre ser vascaíno, o compositor escreveu em crônica “quando eu nasci, um anjo luso, desses que empurram burrinho-sem-rabo, me sacaneou: ‘Bai, Vlanc, ser Basco na bida’”, onde o autor comparou ser vascaíno a uma “tragédia grega, já que, segundo ele, “é a mesma história de sempre: somos campeões, sonhamos com novas conquistas, e aí os cartolas vendem Walter Marciano ou Tita ou o Romário ou o Fernando – e a gente fica roendo beira de dignidade (…)”. Ainda na letra, o verso “choram Marias e Clarices”, se refere às viúvas de Manuel Fiel e Vladimir Herzog, que foram mortos dos porões da ditadura, marcando assim, sua posição política na época. O “Brasil que sonha com a volta do irmão do Henfil” pede a anistia do sociólogo Herbert José de Sousa, irmão do cartunista e exilado do país desde 1971. O “Bêbado e a Equilibrista” se tornou o hino informal da Lei da Anistia de 79, responsável por trazer de volta alguns dos brasileiros exilados pelos militares.
Dessa maneira, é perceptível elementos da existência de uma tradição de luta e de movimentos que ficaram registrados por alguém que representava os gritos que vinham dos porões do DOPS e do DOI-CODI. Uma perda que veio pelo vírus, mas todos sabem que vem da negligência desse governo fascista, pois o que está matando realmente na maior parte do mundo, é a falta de atendimento e não da doença em si. Perde-se um grande artista para a negligência e pro fascismo, chega a ser mais do que triste. Mas, “…o show de todo artista tem que continuar”.