Por Rui Costa Pimenta
Nas últimas semanas ouvimos de modo insistente que, para enfrentar a crise da pandemia, seria necessário deixar de lado as diferenças políticas e partidárias e unir todos os brasileiros para enfrentar a crise. A ideia, muito pouco original, foi expressa pelo atual governador da Bahia, pelo PT, Rui Costa.
Ela é o desenvolvimento lógico da ideia de constituição de uma frente ampla, ou seja, uma frente da esquerda com a direita que alguns mais afoitos tiveram a coragem de chamar de “civilizada”, em oposição ao bolsonarismo.
Nesta semana, pudemos ver o resultado desta política. O Congresso Nacional, em acordo com Bolsonaro, com a bênção do STF desfechou o mais brutal golpe contra a classe trabalhadora nacional ao aprovar a Medida Provisória 905 e a Medida Provisória 936.
Com estas duas medidas, a burguesia não civilizada e a burguesia civilizada unem-se em um bárbaro ataque contra a maioria do País.
Apenas com a MP 936, que permite a suspensão do contrato dos trabalhadores com uma redução salarial de até 70%, os capitalistas deverão retirar da classe trabalhadora cerca de 100 bilhões. Uma parte disso será reposta pelo governo com os fundos para pagamento do salário desemprego que, de qualquer modo, seriam gastos no caso de demissão e agora são transferidos para os patrões.
Muitos porta-vozes da esquerda nacional saudaram o generoso auxílio emergencial aprovado no Congresso de R$ 43 bilhões, ou seja, R$ 600,00 para cada trabalhador autônomo por três meses. Teria sido, dizem, uma grande conquista. No entanto, com apenas a MP 936, os patrões já conseguiram retirar dos trabalhadores o dobro deste valor. A burguesia retira em dobro literalmente com a mão direita o que deu com a mão esquerda. Os próprios trabalhadores é que estão pagando a concessão do auxílio emergencial.
O conjunto das medidas, no entanto, vai muito mais longe. O 13º salário fica virtualmente extinto pois poderá ser incorporado no salário mensal. Imagine-se o tamanho da transferência de renda. O que for negociado com os sindicatos se sobrepõe a partir de agora ao estatuto legal, o que significa que os patrões podem retirar todas as conquistas dos trabalhadores na mesa de negociação da campanha salarial. Com os sindicatos enfraquecidos pelo desemprego e com a maioria dos sindicatos nas mãos de verdadeiros prepostos patronais, as perdas dos trabalhadores serão astronômicas. Como se não bastasse, os contratos coletivos são desautorizados em prol de contratos individuais, os quais impedem os trabalhadores de atuar coletivamente. As demissões são facilitadas. Nem vamos entrar aqui na falácia bolsonarista de que a redução salarial impede as demissões. Sabemos que o que vai ocorrer é um grande número de demissões e com elas a redução salarial.
Esta é a verdadeira união nacional e a única possível. Ao contrário de somar esforços para combater o vírus, o que vemos é que a classe exploradora se aproveita da situação de crise para roubar sem pudor e nem piedade a maioria nacional, ou seja, a classe trabalhadora que terá que arcar com a pandemia, sem qualquer ajuda real dos governos, com o peso da crise capitalista e salvar os capitalistas em meio à crise.
Isso é tudo o que resta das ilusões da frente ampla e da união de todos os brasileiros. Esta política significa apenas e tão somente entregar os trabalhadores de mãos e pés amarrados ao Moloch do livre mercado, onde os trabalhadores são deixados para morrer de fome e os capitalistas são salvos pelo Estado e pela socialização das perdas.
É preciso romper imediatamente com toda ilusão sobre a união nacional e a frente ampla. O que está em pauta nestas propostas não é a luta contra o bolsonarismo. O bolsonarismo é usado como espantalho para que os trabalhadores sejam atrelados ao carro da burguesia. É uma política de traição da classe trabalhadora.
A esquerda e as organizações operárias estão paralisadas sob a idéia de que é preciso cumprir o que mandam os governos e “ficar em casa”, um luxo permitido a poucos. Os sindicatos estão com as portas fechadas. Em alguns casos foram entregues a governos de direita para supostamente criar unidades médicas que a direita nem mesmo está criando. Na melhor das hipóteses, as organizações de massa estão distribuindo comida para os mais necessitados, mas deixando de lado qualquer medida de luta.
Acabar com a união nacional significa neste momento por um fim à paralisia. É preciso convocar uma reunião nacional de todas as organizações que dizem defender o trabalhador, elaborar um programa e um plano de lutas e entrar em ação.
A luta de classes não conhece interrupções. Nos momentos de grande crise ela se acentua, cabe às direções dos trabalhadores assumir o seu posto de combate.