O território peruano continua um campo de guerra. Trabalhadores ampliaram os bloqueios em estradas para uma segunda rodovia fundamental no país na sexta-feira (4), paralisando o transporte de carga e de passageiros no país. Em Ica mais de 2 mil caminhões de cargas e dezenas de ônibus de passageiros estão parados na estrada. Essa mobilização é contra o governo de direita de Francisco Sagasti, que assumiu após Manuel Merino ser retirado do governo.
A eleição de Sagasti foi confirmada 26 horas depois da renúncia de Manuel Merino, que durou apenas 6 dias na presidência, após a destituição de Martín Vizcarra, no dia 9 de novembro. O presidente interino Manuel Merino, que estava no poder há poucos dias, renunciou ao cargo após vir a público que duas pessoas foram mortas durante a dispersão dos protestos contra seu governo.
Essa instabilidade no governo peruano só está servindo para deixar as manifestações cada vez mais combativas, durante todo esse período de protestos já morreram quatro pessoas e desapareceram 40; O povo peruano, no entanto, não retrocedeu. Aos gritos de “Fora Merino”, primeiramente, de “Abaixo o golpe” e, agora, exigindo uma Assembleia Constituinte, há um indício de que a situação pode degringolar para uma crise de características revolucionárias, como vimos no Chile.
Uma parte da esquerda peruana, como a Frente Ampla, quer manobrar com a criação de uma Constituinte à chilena, ou seja, uma constituinte que estrangule a mobilização das massas e canalizar o descontentamento popular para a via institucional, enterrando completamente as aspirações de verdadeiras mudanças dos peruanos. Um dos mais tradicionais partidos do nacionalismo latino-americano, o APRA, está integrado até a medula ao regime político apodrecido que o povo tenta derrubar.
Nesta semana, após cinco dias de filas nas estradas e mais a morte de dois homens a direita tenta mais uma manobra e chamou a Igreja Católica para mediar os protestos e encontrar uma solução “pacífica” entre os manifestantes e o governo golpista.
A Igreja, por sua vez, começou nesta sexta-feira (4) uma mediação para encontrar “uma solução pacífica e harmoniosa” para o conflito e instou o Congresso a aprovar uma reforma legal que conceda aos trabalhadores agrícolas “condições e salários decentes”.
Os trabalhadores rurais de Ica exigem a revogação de uma lei que os priva de direitos e reduz o seus salários, a Lei de Promoção Agrária, uma das últimas elaborada pelo presidente Alberto Fujimori. Essa lei concede benefícios fiscais a grandes empresas capitalistas e sua vigência foi prorrogada há um ano até 2031. Pela lei, o salário dos trabalhadores rurais é de 11 dólares por dia. Os trabalhadores protestam por um aumento de salário e de mais benefícios. O governo de direita do Peru mantém os trabalhadores com um salário de fome, e ao mesmo tempo, concedem beneficios para grandes empresas.
O Sindicato Unitário dos Trabalhadores da Educação do Peru (Sutep), também continua a realizar protestos em Lima e em demais cidades do país. Nas cidades de Puno e Tacna também se uniram aos professores companheiros do Sindicato de Trabalhadores Administrativos do Setor da Educação, assim como companheiros do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil. Os protestantes reivindicam, principalmente, o direcionamento de 6% do PIB do país para a educação pública. Todavia, demonstrando um caráter combativo, também se fala em uma nova Constituinte como aspecto essencial para a solução da crise no País.
Os bloqueios na Rodovia Central foram organizados por trabalhadores de uma fundição de minerais em La Oroya. O complexo metalúrgico Doe Run Peru está em processo de liquidação, o que deixaria mais de 2.500 desempregados. Os trabalhadores mineiros reivindicam do governo que entregue a empresa a eles para retomar a produção e salvar seus empregos.
Sagasti, que tomou posse há 17 dias, já planeja um duro ataque contra os manifestantes. O presidente golpista do Peru afirmou em seu Twitter: “Bloquear estradas não é apenas inconstitucional e ilegítimo porque afeta vários direitos dos cidadãos, é também um crime que o Estado não pode aceitar”. Para o direitista, manifestar é um crime, porém, manter os trabalhadores na miséria, com um salário de fome, demissões em massa, e entrega o país para grandes capitalistas e para o regime neoliberal, isso não é um ataque aos direitos dos cidadãos.
O cenário político-econômico peruano está longe de se estabilizar. Afinal de contas, o neoliberalismo assola os trabalhadores e suas organizações há muito tempo e, nesse sentido, sucateou completamente todo e qualquer tipo de direito fundamental do povo peruano.
A situação peruana deixa claro que a única alternativa para os trabalhadores é a própria mobilização. Afinal, conseguiram derrubar a extrema-direita e, agora, se aproximam de uma convulsão de caráter verdadeiramente revolucionário, capaz de alterar profundamente as relações de forças que hoje atuam dentro da sociedade peruana.
Finalmente, é preciso intensificar a mobilização popular e, acima disso, radicalizar cada vez mais o movimento que hoje atua dentro do Peru. A população peruana está mostrando que simplesmente não irá mais sustentar os regimes golpistas em suas costas.