Em Belarus, continuam os coxinhatos com as bandeiras branca-e-vermelha incentivados pelas potências imperialistas (como pode-se ver na foto acima, que capturou uma bandeira norte-americana, com a ucraniana junto, no meio dos protestos “populares”). Continua, sobretudo, a campanha política e propagandística internacional para pressionar a uma renúncia do presidente reeleito, Alexander Lukashenko.
O principal argumento para isso segue sendo a suposta fraudulência das eleições, em que “Luka” saiu vencedor com mais de 80% dos votos. Para embasar essa acusações, a propaganda imperialista diz que não houve observadores internacionais que comprovassem a lisura do pleito. Entretanto, sempre há deputados, representantes dos candidatos, membros de partidos e organizações, enviados especiais de organismos internacionais que observam as eleições no país.
Nas eleições deste ano, por exemplo, dentre as entidades observadoras estavam a Federação dos Sindicatos de Belarus e a Associação Pública de Veteranos, bem como a Comunidade de Estados Independentes, órgão multiestatal composto pelos países que pertenciam à União Soviética. Logicamente, o imperialismo acusa todas essas organizações de serem parciais, ao contrário das instituições imperialistas, sempre “neutras”…
Mas o governo belarusso convidou, como sempre, essas instituições “neutras” do imperialismo, como a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, que participa como observador das eleições em Belarus desde 2001. Contudo, estranhamente, a OSCE se recusou a acompanhar as eleições. Isso é um forte indício de que o golpe atual já vinha sendo tramado, e de fora do país.
É preciso destacar, no entanto, que países como EUA e Brasil não recebem observadores internacionais em suas eleições. No máximo, recebem acompanhantes, que têm uma liberdade menor de atuação.
Mas para que servem os observadores internacionais? Ora, justamente para fraudarem as eleições dos países vítimas do acosso imperialista! Foi exatamente isso o que ocorreu no ano passado na Bolívia, quando a “neutra” e “democrática” OEA, o ministério das colônias dos EUA, enviou seus agentes para forjarem um relatório que acusou o governo de Evo Morales de fraudar sua vitória, o que serviu como pretexto para os militares derrubarem o presidente eleito. Tempos depois, descobriu-se, através de um estudo da Universidade da Pensilvânia, que o que era fraudado era o próprio relatório da OEA! Mas o golpe já havia sido dado.
Pressão imperialista
A União Europeia se reuniu na semana passada para discutir a situação em Belarus e anunciou publicamente que não reconhece o resultado eleitoral. E daí? Belarus sequer faz parte da UE! Belarus não tem nada a ver com esse órgão! Trata-se de uma repugnante intromissão nos assuntos internos do país, de uma violação de sua soberania nacional. É como se o Zimbábue não reconhecesse o resultado das eleições na Costa Rica. O que o Zimbábue tem a ver com o que acontece na Costa Rica?
A desculpa da suposta fraude serviu, então, para que o imperialismo e seus fantoches de Lituânia, Letônia, Polônia e Ucrânia, vizinhos de Belarus e todos eles governados pela extrema-direita, iniciassem uma forte pressão pela renúncia de Lukashenko.
Os líderes da França, Emmanuel Macron, e da Alemanha, Angela Merkel, começaram a discutir a imposição de sanções contra Minsk. Na verdade, a UE já busca impor novas sanções a Belarus, particularmente pela repressão aos coxinhatos. Agora, uma dúvida que tenho e que gostaria que algum santo homem me respondesse: por que a UE nunca sequer discutiu a imposição de sanções ao governo Macron quando este mandou a polícia francesa descer o cassete nos coletes amarelos, matando, ferindo e prendendo milhares de pessoas que saíam às ruas contra o regime dos banqueiros?
As fontes da desestabilização
Como abordado no artigo anterior, Belarus vem adotando uma liberalização de sua economia, altamente concentrada nas mãos do Estado, nos últimos anos. Visando atrair o investimento estrangeiro, um programa gradual de privatização e incentivo ao “empreendedorismo” tem sido adotado e há uma relativa desregulamentação de alguns setores da economia a fim de dar garantias aos investidores e de ampliar a economia de mercado.
As condições de negócios para companhias estrangeiras têm melhorado a cada ano. O Estado liberalizou a jurisdição para incrementar esses investimentos. Agora, empresas estrangeiras e mistas estão isentas do imposto sobre o lucro da produção nos primeiros três anos e pagam apenas a metade nos três anos seguintes caso os produtos fabricados sejam considerados de primeira importância para o país.
De alguns anos para cá, o governo tem focado em direcionar os investimentos estrangeiros para o desenvolvimento de tecnologia de ponta. Atualmente, trabalham em Minsk mais de 30 mil especialistas em tecnologia.
Inclusive, devido a essa liberalização, a iniciativa privada tem pressionado o governo por uma flexibilização também na legislação trabalhista.
Tudo isso é muito significativo e tem relação direta com a atual desestabilização do país.
O capital imperialista ganhou força com a relativa abertura promovida por Lukashenko nos últimos anos. Não apenas força econômica, mas, como consequência, força política. Nasceram em Belarus uma pequena-burguesia e uma burguesia embrionária, que ocupam altos cargos nessas companhias estrangeiras que adentraram o país, ou que fazem negócios com essas empresas.
À medida que se desenvolvem, assim como o capital estrangeiro, necessitam de uma fatia maior da economia, pressionando por um aumento no ritmo das privatizações e desregulamentações trabalhistas. Naturalmente, a própria burocracia estatal acaba por ser um empecilho a esse desenvolvimento, apesar de tê-las ajudado a crescer.
Os protestos que vemos hoje são compostos, em sua esmagadora maioria, por essa pequena-burguesia, burguesia dependente do imperialismo, e mesmo uma aristocracia operária que ganhou posições em cargos relativamente importantes nessas empresas, e que agora servem como agentes dos monopólios imperialistas para atenderem às suas necessidades.
É justamente de tais forças capitalistas ligadas ao imperialismo que saíram os candidatos opositores derrotados por Lukashenko e que agora insistem em derrubá-lo por um golpe, apoiados nas classes sociais acima descritas.
Em contraposição, a maioria da classe operária, tanto as bases como as direções sindicais, ainda continuam majoritariamente favoráveis ao governo.
É preciso cortar o golpe pela raiz
Na semana passada, Lukashenko chegou a admitir a possibilidade de uma nova constituição para Belarus. Claramente isso se deve a uma pressão por parte do imperialismo. Nas atuais circunstâncias, uma nova constituição acabaria com uma série de conquistas da época soviética que se mantiveram após a queda da URSS, como o predomínio do Estado sobre a economia, os sistemas públicos de saúde e educação, a moradia universal, os direitos trabalhistas e a própria simbologia socialista, como os feriados e locais públicos em homenagem à Revolução de 1917.
Essas características permanecem, mesmo 30 anos após o fim do Estado Operário soviético, muito devido à organização peculiar da classe trabalhadora belarussa. Trata-se de um país industrializado, muito à frente das outras ex-repúblicas soviéticas, que, portanto, tem uma classe operária forte, com 23 mil organizações sindicais e 95% de sua força de trabalho sindicalizada, no qual, apesar de reformista, é o partido comunista a maior organização política do país.
Assim, as organizações operárias e o partido comunista devem mobilizar suas bases para, nas ruas, garantir a sustentação do governo e derrotar o golpe. É o que já está sendo feito, mas ainda de forma muito tímida. A Federação dos Sindicatos de Belarus precisa reunir todas as categorias de trabalhadores e convocá-los a ocupar as empresas estrangeiras e todas as que estão envolvidas na conspiração golpista. O partido comunista deve honrar o seu nome e organizar os trabalhadores contra a burguesia e o imperialismo.
O governo reconhece publicamente que existe uma nítida polarização política no país. Chegou o momento de radicalizar.
Diante da situação delicada que Belarus vive, em que a sobrevivência da própria burocracia estatal corre perigo, Lukashenko não pode oferecer nenhuma concessão ao imperialismo. Esse seria o seu maior erro. Se o que mais interessa à burocracia é estabilidade, então é preciso derrotar a desestabilização provocada pelo imperialismo. Mas, para isso, é vital desbaratar a quinta-coluna imperialista dentro do próprio país.
Nesse sentido, para evitar o golpe é necessário anular politicamente a oposição golpista. E isso só será feito efetivamente por meio de um duro golpe contra a estrutura econômica que deu à direita o poder político desestabilizador que ela tem hoje. Ou seja, é preciso confiscar o poder econômico da direita, expropriando as empresas capitalistas e expulsando o capital imperialista de Belarus, grande criador e impulsionador da ofensiva golpista.
Em 2018, Lukashenko disse que armaria 7 milhões de pessoas (o país tem 10 milhões de habitantes) em caso de guerra. O governo voltou a se preocupar com isso nas últimas semanas, falando em “agressão externa” e movendo tropas para a fronteira ocidental do país.
A burocracia belarussa sabe que o imperialismo está por trás da desestabilização golpista. “Os EUA estão planejando e administrando tudo isso, enquanto os europeus estão junto com eles”, disse Lukashenko na última sexta-feira (21), discursando a trabalhadores de uma fábrica em Minsk. Na mesma oportunidade, possivelmente percebendo que tem grande apoio popular após manifestações em seu favor por todo o país na semana que passou, ele afirmou que não vai convocar novas eleições. E completou: “eu vou manter um diálogo somente com os coletivos de trabalhadores.”
Então é hora de cumprir o que prometeu. Com 70% da população de kalashnikov no ombro a proteção do país está encaminhada, e a vitória contra o golpismo, garantida.
Lukashenko tem que aprender com os erros de Kadafi e Evo Morales, que acreditaram que uma aproximação com o imperialismo os beneficiaria e foram brutalmente esmagados, um executado e o outro exilado, e cujos países foram entregues de bandeja às aves de rapina. Não se pode conciliar com o imperialismo.