Depois da constitucionalidade da portaria n°2282, de 27 de agosto de 2020 ter sido questionada por organizações de saúde e partidos da esquerda, o ministério da saúde de Bolsonaro realiza uma manobra burocrática para manter medidas que dificultam ainda mais o acesso da mulher ao aborto garantido por lei. No dia 23 de setembro, o governo publicou uma nova portaria (n°2561) para substituir a anterior, retirando a necessidade do médico de perguntar se a vítima gostaria de visualizar o ultrassom; no entanto, diversas outras medidas impeditivas se mantiveram mascaradas por uma mudança superficial do texto original.
O médico continua sendo obrigado a chamar a polícia, ação que se configura como extremamente agressiva, visto que a mulher não está cometendo nenhum crime ao buscar por seus direitos. Tal atitude ressalta a constante tentativa do Estado e da sociedade de culpabilizar a mulher pela violência brutal da qual foi vítima. Apesar da situação de vulnerabilidade na qual se encontra, ainda precisa detalhar todo o ocorrido a pelo menos dois médicos, além de esperar o consentimento de ao menos três profissionais de saúde para que possa realizar o procedimento previsto pela lei. Por fim, a portaria ainda obriga o hospital a separar todos os “fragmentos de embrião ou feto” para serem entregues à polícia, sem necessidade de qualquer tipo de consentimento da mulher.
São medidas não só burocráticas impeditivas, mas também ressaltam a opressão da mulher, que, mesmo com a possibilidade de realizar o aborto no papel, fica, na prática, à mercê da autorização de médicos, além da organização administrativa do hospital. Isso contribui para que muitas vítimas de estupro desistam de realizar o procedimento ou sofram ainda mais agressões dentro de espaços onde supostamente devem oferecer acolhimento a essas pessoas.
Medidas como a da secretaria criada pelo ministro da Saúde Eduardo Pazuello atingem principalmente as mulheres da classe trabalhadora, que necessitam do atendimento do SUS para realizar o procedimento de aborto. Por isso, é preciso combater as ações do governo Bolsonaro e seus ministérios que realizam uma campanha maciça de destituição dos direitos das mulheres e fortalecimento da opressão desse grupo oprimido.
Essa luta não poderá ser feita por meio de ações de inconstitucionalidades, as quais o Estado, por meio de seu aparato burocrático, consegue facilmente driblar; mas deverá ser realizada nas ruas em busca de uma emancipação real e concreta das mulheres.





