As grandes mobilizações que tomaram conta dos Estados Unidos contra o assassinato de George Floyd, homem negro asfixiado por um policial em Minneapolis, e que se estenderam para outros países trouxeram à tona um debate sobre a derrubada de estátuas. Isso porque na Inglaterra, em Bristol, a estátua de um escravagista foi derrubada e jogada no rio. Também na Inglaterra, a estátua de Winston Churchill foi pichada. Na Bélgica, a estátua do Rei Leopoldo II, o genocida e escravagista do Congo, foi retirada.
As ações, embora não tenham nenhum efeito prático na luta contra o regime político capitalista, verdadeiro responsável pelo racismo e a exploração dos povos, são manifestações que expressam legitimamente a revolta do povo.
Assistindo de longe tais eventos e acostumados a copiar acriticamente o que é feito principalmente nos países imperialistas, setores da esquerda pequeno-burguesa passaram a defender a derrubada de estátuas no Brasil. Estranhamente, voltaram sua munição contra monumentos e símbolos da cultura e da formação nacional.
Esses setores elegeram um fenômeno do século XVI como seu inimigo: os bandeirantes. Começam a sugerir a derrubada de monumentos em particular em São Paulo.
Mostram completo desconhecimento da história nacional ao comparar, por exemplo, o “Monumento às Bandeiras”, do modernista Vitor Brecheret, a uma ode ao racismo.
Diferente do que acredita a esquerda, os fenômenos históricos não são feitos de moralidade. Analisar as Bandeiras como um movimento cuja, se não única mas principal, característica fosse o assassinato e escravização dos índios é desconhecer a história, mais ainda é ignorar as contradições presentes em qualquer processo social.
Os Bandeirantes são essencialmente um movimento de expansão territorial. A nação brasileira, continental como é hoje, só é o que é hoje graças a esse movimento.
Mas voltemos ao problema da derrubada de estátuas e monumentos. Setores da esquerda pequeno-burguesa estão defendendo isso como uma ideologia. Segundo eles, seria preciso acabar com o que eles entendem que seriam “símbolos” do racismo, da colonização, do genocídio dos índios.
Essa ideia procura desviar a luta concreta dos oprimidos, ou seja, pela sua libertação, que passa por derrubar hoje a polícia, a burguesia, o golpe etc. Assim, o racismo seria resolvido, ou parcialmente resolvido, se uma estátua fosse derrubada. Será que os índios estariam numa situação melhor caso os monumentos aos bandeirantes fossem destruídos?
O que querem os que defendem essa ideia é que o mundo e a historia fossem formados com base em seus preceitos morais. Em última instância, como tudo na humanidade foi obra de uma luta de interesses e contradições que resultaram em muito sofrimento, então toda a produção cultural deveria ser apagada. E um novo mundo deveria ser erguido de acordo com os padrões morais de alguém puro e belo.
Quem seriam esses puros e belos, ninguém sabe. Provavelmente o pequeno-burguês que formulou essa teoria.
Mas é bom lembrar que o nazismo também tinha seus preceitos de moral e pureza que justificavam destruir obras de arte e monumentos. Os princípios morais da esquerda pequeno-burguesa são melhores que os dos nazistas? Alguém poderia objetar que sim, mas fato é que isso sempre vai depender da cabeça de quem está formulando tais preceitos.
Embora não seja a intenção, à primeira vista, dos que formulam essas teorias, fato é que estamos diante de uma ideologia reacionária.